O Estado de São Paulo, n. 46111, 16/01/2020. Economia, p. B5

 

Itamaraty confirma apoio dos EUA ao Brasil na OCDE

Julia Lindner

Beatriz Bulla

16/01/2020

 

 

Segundo o governo, uma carta dos americanos pedindo que o País fosse priorizado foi entregue ao conselho da organização em Paris

Depois de o Brasil fazer uma série de concessões aos Estados Unidos ao longo de 2019, o governo Donald Trump anunciou que vai dar prioridade ao pleito brasileiro de ingresso na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE).

De acordo com o Itamaraty, uma carta com o pedido para dar prioridade ao Brasil foi apresentada pelos americanos em reunião do conselho da OCDE com representantes dos paísesmembros, na manhã de ontem, em Paris. Sob a alegação de que o processo é confidencial, os EUA não confirmaram oficialmente a informação.

O Brasil é um dos seis candidatos, além de Romênia, Croácia, Bulgária, Argentina, Peru e Ucrânia, a iniciar o processo de entrada nesse organismo. Os EUA vinham defendendo que Argentina e Romênia entrassem primeiro. Agora, parecem ter mudado de ideia e substituído o pleito argentino pelo brasileiro.

O pedido formal para ingressar na OCDE foi feito pelo Brasil em meados de 2017. A OCDE atua como uma organização para cooperação e discussão de políticas públicas e econômicas. Para entrar na OCDE, é necessário a implementação de uma série de medidas econômicas liberais, como o controle inflacionário e fiscal. Em troca, o país ganha um “selo” de investimento que pode atrair investidores.

Em nota, o Ministério de Relações Exteriores informou que a proposta dos EUA, “de início imediato do processo de acessão do Brasil” à OCDE, “trata-se de passo fundamental para destravar o processo de expansão da organização”.

Até hoje, o governo Trump vinha se comprometendo com o apoio ao pleito brasileiro de entrar na OCDE, sem indicar que posição o Brasil ocuparia na “fila” de candidatos, o que deixava o País no limbo.

A mudança acontece depois de um ano em que o governo Bolsonaro mostrou alinhamento com os americanos, apesar de viver percalços na relação com a Casa Branca, e depois de o Itamaraty ter apoiar a ação americana no Iraque.

Segundo um auxiliar de Bolsonaro, a notícia veio em “ótima hora”, considerando que ocorre algumas semanas após os EUA recuarem da decisão de sobretaxar o aço brasileiro – algo que tinha colocado em xeque a relação entre Trump e Bolsonaro. O próximo passo, de acordo com o interlocutor do presidente, será oficializar a negociação de um acordo comercial entre Mercosul e EUA.

Cronograma. O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais, Marcos Troyjo, disse ao Estadão/Broadcast que o Brasil quer montar um cronograma para firmar um acordo comercial com os EUA. Segundo ele, Bolsonaro e Trump já deram sinalização positiva para as negociações. O avanço, porém, dependerá ainda de uma flexibilização no Mercosul que permita ao Brasil e aos demais membros negociar tarifas e cotas independente do bloco – o que o secretário chama de “Mercosul flex”.

Ontem, o presidente Bolsonaro afirmou que o Brasil está “bastante adiantado” nos critérios para entrar na OCDE, “inclusive na frente da Argentina”. “São mais de cem requisitos para você ser aceito. Estamos bastante adiantados. E as vantagens para o Brasil são muitas. Equivale ao País entrar na primeira divisão.”

De acordo com o Ministério da Economia, foi feita uma avaliação da compatibilidade da legislação brasileira com acervo e padrões da OCDE. Segundo a área econômica, 82,6% dos instrumentos não representam conflito para o País. Entre os desafios está uma simplificação do sistema tributário brasileiro, tema que ainda está em discussão no Congresso.

PRÓXIMOS PASSOS

Consenso

É preciso obter consenso dos membros da OCDE sobre candidaturas existentes

‘Roadmap’

Uma vez definido o início do processo, os membros acordam um ‘roadmap’ (roteiro), que define quais comitês examinarão a candidatura do Brasil

‘Acquis’

País apresenta memorando com posição do País sobre as recomendações e decisões (o chamado “acquis” da OCDE) vinculadas a cada um desses comitês.

Política e legislação

Membros da OCDE discutem nos comitês a política e a legislação do Brasil em cada área.

Convite

Com todos os comitês identificados no roadmap satisfeitos em relação às políticas e leis brasileiras, o conselho pode convidar o Brasil a aderir à OCDE

Ratificação

Resultado é reunido em protocolo de acessão, que é então assinado e enviado ao Congresso para votação. Aprovado, o Brasil ratifica e entra como membro na OCDE