O Estado de São Paulo, n. 46109, 14/01/2020. Economia, p. B3

 

Bolsonaro está com as reformas, afirma Guedes

José Fucs

14/01/2020

 

 

Propostas para áreas tributária e administrativa devem ser enviadas ao Congresso simultaneamente, afirma ministro

Depois de dez dias de férias nos EUA, o ministro da Economia, Paulo Guedes, desembarcou ontem em Brasília dizendo que vai retomar a agenda de reformas. Segundo ele, a proposta para a área administrativa, cujo envio ao Congresso foi sustado pelo presidente Jair Bolsonaro no final de 2019, deverá ser encaminhada à Câmara entre o final deste mês e o início de fevereiro. Em relação à reforma tributária, a ideia é apresentar o projeto de forma quase simultânea ao da administrativa, pois já haveria acerto para ser analisado por comissão mista do Congresso.

“O presidente continua comprometido com as reformas. Uma coisa é o timing político, outra é o conteúdo das reformas”, disse Guedes, em entrevista ao Estado por telefone no domingo à noite. “O presidente deu algumas sugestões que foram adotadas. Os presidentes da Câmara (Rodrigo Maia) e do Senado (Davi Alcolumbre) também deram as suas sugestões, e isso está sendo conduzido em conjunto. Agora, em vez de mandar uma versão das reformas com muita potência e depois o negócio ser esfacelado, a calibragem está sendo feita antes.”

Após sofrer ajustes defendidos por Bolsonaro e lideranças partidárias – como a manutenção da estabilidade para os atuais servidores, no caso da reforma administrativa, e a exclusão de imposto nos moldes da antiga CPMF, no caso da tributária –, as duas propostas estão praticamente fechadas. Segundo Guedes, elas receberam sinal verde do Palácio do Planalto para ser enviadas ao Congresso.

Nos bastidores, comenta-se ainda que a alegada preocupação de Bolsonaro com a possibilidade de a reforma administrativa turbinar protestos parecidos aos vistos no Chile teria se dissipado.

O ministro afirmou que, nas últimas semanas, houve também negociações da equipe econômica com os demais ministérios para superar resistências à reforma administrativa. “Nós mesmos, dentro do governo, tivemos de conversar para os demais ministérios verem que a reforma está baseada em princípios gerais”, disse. “Muitas categorias do funcionalismo também quiseram examinar a proposta e saíram felizes com o que viram.”

Propostas. Na essência, os dois projetos deverão seguir as linhas das últimas versões divulgadas pela equipe econômica. Além da restrição à estabilidade aos novos servidores, a reforma administrativa deverá reduzir o número de funções, das atuais 180 para em torno de 30; criar um sistema de avaliação do funcionalismo, baseado no mérito de cada um; e ampliar a diferença entre o salário no início e no final da carreira – que hoje, em muitos casos, é de apenas 30%.

Quanto à reforma tributária, o governo decidiu não encaminhá-la na forma de Proposta de Emenda Constitucional (PEC), mas por meio de medidas a serem incorporadas aos dois projetos que já estão em análise no Congresso (do deputado Baleia Rossi, que considera como referência estudo do economista Bernard Appy, e do ex-deputado Luiz Carlos Hauly) “Vamos colaborar para tentar fazer as propostas convergirem.”

Em paralelo, o ministro conta com andamento das medidas do pacote econômico enviado ao Senado em novembro. Entre outras mudanças, elas estabelecem uma desvinculação e desindexação de recursos; a extinção de até 180 fundos governamentais e a possibilidade de decretação do Estado de Emergência

Fiscal. Em situação de grave crise financeira, os governos podem impedir a concessão de aumentos ao funcionalismo por até um ano e meio. “Tudo isso vai andar. O Congresso abraçou as reformas”, afirmou o ministro.

Apesar desse otimismo, no Congresso a previsão é de que as eleições municipais de outubro possam influir na pauta de votações e adiar a aprovação de temas considerados prioritários pelo governo federal. O próprio líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDBCE), diz que as reformas administrativa e tributária só devem sair depois de novembro. Em oposição, deverá ganhar prioridade projeto de abertura da área de saneamento à iniciativa privada, porque deve ampliar os investimentos na área, com apelo popular e eleitoral.

'Vai andar'

“Tudo isso vai andar. O Congresso abraçou as reformas.”

Paulo Guedes

MINISTRO DA ECONOMIA

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Ministro garante reposição da inflação para o mínimo

Adriana Fernandes

14/01/2020

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, deve dar sinal verde para elevar o valor do salário de 2020 e garantir a recomposição da inflação do ano passado. O assunto foi tema de reunião do ministro com a equipe na volta ao trabalho após um período de férias de fim ano. O custo adicional deve ficar entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões.

A avaliação é que, se o governo não fizer o ajuste no mínimo para recompor a inflação passada, o próprio Congresso fará na volta dos trabalhos do Legislativo, com desgaste para o presidente Jair Bolsonaro. O governo também quer evitar que os mais pobres tenham um reajuste menor já que para aposentadorias e pensões acima de um salário mínimo, o reajuste ficou em 4,48%. Esse valor é maior que a correção dos segurados do INSS que ganham um salário mínimo (4,1%).

O salário mínimo foi fixado em R$ 1.039, com alta de 4,1%. O ajuste ficou abaixo do Índice Nacional de Preços ao Mercado (INPC) de 2019, de 4,48%, que serve como base para correção do mínimo. Se for dado o mesmo índice sobre o salário mínimo vigente em 2019, o valor subirá para R$ 1.042,71.

‘Abacaxis’. Guedes encontrou uma série de “abacaxis” para resolver, além do reajuste do mínimo: fila do INSS, fundo para compensar a alta do preço dos combustíveis, subsídios para templos religiosos e painéis solares e pressão para aumento dos recursos destinados ao programa Bolsa Família.

Apesar dos temas delicados, o ministro voltou animado, repassou prioridades e metas ao seus secretários. Guedes disse que o trabalho foi “zerado, como se o governo começasse agora”.

Um integrante da equipe econômica informou ao Estado que todos os temas mais polêmicos precisam passar ainda pelas análises técnicas. Segunda a fonte, o governo “pode fazer muita coisa desde que escolha o que é prioritário”. O papel da equipe econômica, reforçou, é apenas alertar para as regras orçamentárias. As restrições são legais. Não há como criar novas despesas sem que se tenha claro a fonte orçamentária e se há espaço no teto de gastos (mecanismo que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação). Auxiliares do ministro afirmam que o risco maior é uma parte do governo achar que o ajuste fiscal já foi feito.

O Ministério da Economia já se posicionou contra a concessão de subsídios para a conta de luz de templos religiosos. O ministro, no entanto, ainda não discutiu o assunto com o presidente da República, mas a tendência é que o governo recue por causa da repercussão negativa da proposta nas redes sociais – que tem sido chamada de “dízimo elétrico” e “dízimo de ateu”.

A tentativa do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, de diminuir a polêmica, tampouco deu certo – ele considerou insignificante um custo de R$ 37 milhões por ano. O subsídio seria concedido aos templos de grande porte, conectados à alta tensão, que pagam valores até 300% mais altos no horário de ponta, entre o fim da tarde e o início da noite. Pelo plano em estudo, eles pagariam uma tarifa mais barata nesses horários, e a diferença seria repassada às tarifas dos demais consumidores.

Descompasso

4,1% foi o reajuste dado ao salário mínimo de 2020

4,48% foi o IPCA de 2019