Título: Tibete ofusca congresso
Autor: Walker, Gabriela
Fonte: Correio Braziliense, 10/11/2012, Mundo, p. 23

Protestos na região autônoma coincidem com o encontro do Partido Comunista Chinês, que escolherá dirigentes»

GABRIELA WALKER Mais de 5 mil tibetanos foram ontem às ruas em mais um protesto contra a repressão do governo chinês, aproveitando a repercussão internacional do 18º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC), em Pequim. O número de manifestações populares e de casos de autoimolações — pessoas de colocam fogo no próprio corpo — aumentou na região autônoma do país, com a proximidade da transição do governo, que deve ser anunciado pelo PCC na próxima quarta-feira.

A China mantém uma política severa para preservar a união de seu território. Desde 1951, quando assumiu o controle do governo do Tibete, Pequim adota uma postura pouco flexível em relação às demandas da população. A comunidade internacional tem feito uma pressão constante para que o país garanta o cumprimento dos direitos humanos na região. No entanto, a China se recusa a permitir a entrada de observadores internacionais em seu território. “Esperamos que (pessoas) de todos os lugares do país e de fora visitem o Tibete com frequência para passear, estudar e viajar, mas para outros aspectos, não somos tão acolhedores”, disse Qiangba Puncog, presidente do Comitê Permanente do Congresso Popular da Região Autônoma do Tibete, no segundo dia do maior evento do PCC.

Nos últimos dois dias, seis tibetanos colocaram fogo no próprio corpo. Desde 2011, 68 se imolaram — desse total, 56 morreram, de acordo com estimativa do governo do Tibete no exílio. Para especialistas, a renovação dos líderes do PCC dificilmente trará mudanças em relação à posição chinesa. “Permitir que haja um crescimento da autonomia tibetana poderá estimular outras regiões a buscarem o mesmo e ficará difícil para o governo conter a demanda”, explicou ao Correio Alexandre Ratsuo Uehara, especialista em Ásia e diretor acadêmico das Faculdades Integradas Rio Branco (São Paulo).

A política chinesa para controlar as regiões instáveis deve apostar em avanços econômicos e na melhoria da renda per capita que, pela primeira vez na história entrou na pauta do Congresso Comunista. “Com o objetivo de tornar o desenvolvimento chinês mais equilibrado, coordenado e sustentável, devemos duplicar (até 2020) o PIB (Produto Interno Bruto) e a renda per capita dos moradores das áreas urbanas e rurais”, destacou o presidente Hu Jintao, em discurso proferido durante a abertura do evento.

Ontem, o primeiro-ministro do país Wen Jiabao reforçou a postura Hu. “A China enfrenta uma vasta gama de problemas, especialmente árduas tarefas de reforma e desenvolvimento”, disse, ressaltando a importância de melhorar o sistema de Previdência Social e reduzir as disparidades de renda entre o campo e a área urbana.

Progresso

A aposta chinesa é atenuar os problemas do Tibete com o avanço econômico, apesar de o fim do conflito não ser ainda previsível. Conforme o desenvolvimento alcançar as regiões internas do país, que vivem hoje em condições muito menos favoráveis que o litoral, o descontentamento da população separatista deve diminuir, o que reduziria também os embates políticos e territoriais.

“O Tibete ainda não foi incorporado às relações da China com o mundo. Acho que o governo de Pequim vai disseminar os benefícios de que parte do país já usufrui. Isso inclui mais acesso a bens de consumo, ao turismo e a uma vida melhor”, esclarece Uehara. “Acredito também que o governo vai tentar ocupar esses lugares instáveis com uma população que se identifique mais com os princípios chineses”, completa o especialista, ao lembrar que, tradicionalmente, o partido estimula o patriotismo e os ideais de harmonia e de estabilidade em todo o território.