Correio braziliense, n.20535 ,13/08/2019. Política, p. 2/3

 

PGR não pode ser "xiita ambiental"

13/08/2019

 

 

O presidente Jair Bolsonaro disse que o próximo procurador-geral da República, a ser indicado por ele até sexta-feira, “não pode atrapalhar a agenda de desenvolvimento do país” e deve saber “tratar as minorias como minorias”. Ao ser questionado sobre o nome de Deltan Dallagnol, coordenador da Lava-Jato no Paraná, para o cargo, respondeu que ainda não foi procurado. “Mande-o me procurar, por que não me procurou até hoje? É muito simples. Todos querem ser procurados. Eu não procurei ninguém. A caneta BIC é minha”, frisou.

Em cerimônia que marcou a duplicação de 47 quilômetros da BR-116, em Pelotas (RS), o presidente afirmou que “as leis têm de ser feitas para maiorias” e destacou que precisa de um PGR que trabalhe pela “família”. Ele também citou o papel do Ministério Público na concessão de licenças ambientais. “Quero um PGR que não apenas combata a corrupção, que entenda a situação do homem do campo, não fique com essa ojeriza ambiental, que não atrapalhe as obras que estão dificultando licenças ambientais, que preserve a família brasileira, que entenda que as leis têm de ser feitas para a maioria e não para as minorias. É isso o que queremos”, frisou. “Que não seja um xiita ambiental”, continuou o presidente, e que “entenda as pessoas de minoria com a importância que têm e não supervalorizadas”.

O subprocurador Augusto Aras — preferido para ocupar o cargo, embora não tenha sido votado pela categoria — se alinhou ao discurso de Bolsonaro. Em entrevista à Folha de S. Paulo, ele declarou que pode ser descrito como alguém com “viés de direita”. “Eu começaria (se for indicado), no plano administrativo, convidando o colega Eitel Santiago de Brito Pereira, que, uma vez aposentado, se candidatou a deputado federal pela Paraíba e, como tal, apoiou o candidato Bolsonaro”, destacou. “É um homem maduro, católico, que, quando havia ainda alguma distinção entre direita e esquerda, poderia ser enquadrado num viés de direita.”

Também na entrevista, Aras criticou a ideologia de gênero, outro alvo de reclamações do presidente. “Eu não posso, como cidadão que conhece a vida, como sexagenário, estudioso, professor, aceitar ideologia de gênero (...). Não cabe para nós admitir artificialidades. Contra a ideologia de gênero é um dos nossos mais importantes valores, da família e da dignidade da pessoa humana.”

As novas afirmações ocorrem após viralizar na internet uma declaração dada por Aras, à TV Câmara, em 2016. Na ocasião, ele disse: “Essa política do medo tem consequências desastrosas, que é o crescimento de toda (...) uma doutrina de direita, uma direita radical”. Eleitores de Bolsonaro usaram a frase como base para pedir que ele não seja indicado a PGR. A atual ocupante do cargo, Raquel Dodge, deixa o posto em 18 de setembro. (RS)

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Outra ação contra Eduardo

13/08/2019

 

 

O Ministério Público Federal (MPF) no DF entrou na Justiça Federal com uma ação civil pública para barrar a indicação do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) para a embaixada do Brasil em Washington. A ação contesta os critérios técnicos utilizados pelo presidente Jair Bolsonaro para indicar o filho, mas não trata de uma eventual prática de nepotismo.

“Não pode ser qualquer mérito ou qualquer serviço a justificar a indicação do cargo, mas, sim, méritos e serviços relacionados à função que se vai exercer”, argumentou o MPF no documento, que compara os currículos dos embaixadores anteriores do Brasil nos Estados Unidos com o de Eduardo Bolsonaro, frisando que ele tem apenas quatro meses de experiência na temática de relações exteriores.

O MPF, ao observar que o posto em Washington é o mais importante da diplomacia brasileira, afirmou que há “perigo do dano caso se efetive a indicação de pessoa sem a preparação adequada para estabelecer intensas negociações com agentes estrangeiros” e solicitou, com urgência, a observação de critérios técnicos na escolha de chefes diplomáticos.

A suspensão da indicação de Eduardo Bolsonaro também é solicitada pelo partido Cidadania, que entrou com um pedido de liminar no Supremo Tribunal Federal (STF). A legenda argumentou que o ato seria flagrante nepotismo, já que o parlamentar não estaria qualificado para o cargo. O relator do pedido é o ministro Ricardo Lewandowski.

“Afora o nepotismo, que tem uma ressalva moral, o problema da indicação é a falta de qualificação para o cargo”, disse ao Correio Günther Richter Mros, professor de relações internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). “Um embaixador tem sob sua responsabilidade a representação do Estado brasileiro junto a um Estado estrangeiro. Isso não pode ser simplificado como uma mera relação de amizade entre indivíduos”, explicou, em referência à amizade entre Eduardo Bolsonaro e o presidente Donald Trump.

“De fato, o Eduardo Bolsonaro não apresenta quaisquer credenciais de experiência ou de carreira para ocupar o cargo de embaixador nos Estados Unidos. Trata-se da embaixada mais importante do Brasil, não só na importância em termos de comércio, pois são nosso segundo parceiro comercial, mas, principalmente, porque continuam sendo a maior potência do sistema internacional. Dito isso, é claro que é muito importante termos lá um embaixador devidamente capacitado”, disse Juliano da Silva Cortinhas, professor de relações internacionais da UnB. (JV)