Correio braziliense, n.20535 ,13/08/2019. Mundo, p. 13

 

Desafio é a migração ilegal

13/08/2019

 

 

Guatemala » Com abstenção acima de 50%, o país elege um direitista para suceder o presidente que assinou com Washington um acordo pelo qual se compromete a absorver cidadãos de terceiros países que buscam asilo nos EUA

Os impasses da migração ilegal em massa para os Estados Unidos estão em primeiro plano na agenda que aguarda o presidente eleito da Guatemala, Alejandro Giammattei, um direitista que se identifica com as políticas do atual mandatário, Jimmy Morales. Em um segundo turno com abstenção de 57% dos eleitores habilitados, ele conquistou 58% dos votos, no domingo, e venceu com folga a ex-primeira-dama Sandra Torres, social-democrata. O tema central dos debates, na reta final, foi um acordo assinado por Morales com o governo americano, no mês passado, pelo qual a Guatemala ganha o status de “terceiro país seguro” — o que implica a disposição de acolher candidatos de outras origens e processar pedidos de asilo nos EUA.

“Com um nó na garganta, 12 anos depois, venho lhes dizer que vai ser uma imensa honra presidir o nosso país”, discursou o médico de 63 anos, que se ampara em muletas por causa de uma esclerose. Ele chega ao poder na quarta tentativa, com a promessa de enfrentar a violência, a corrupção e a pobreza em crescimento — fatores que alimentam a emigração rumo aos EUA.  Pelo Twitter, a rival pronunciou-se ontem para agradecer “de coração” os votos recebidos e fazer um chamado à reconciliação. “Hoje, o momento é de unidade”, escreveu Sandra Torres.

Na espera pela posse do novo mandatário, em janeiro, os guatemaltecos retratavam as incertezas sobre o futuro do país. Com a pobreza castigando 59% dos 17,7 milhões de habitantes e 4.500 vítimas anuais de morte violenta, a jornaleira Leila Gabriel, 37 anos, fazia votos de que o próximo governo “seja melhor que o atual”. Desiludido, o médico Gabriel Ruiz, 64, via poucos motivos de esperança. “A única coisa que vai acontecer é que mudarão as pessoas que dividem o bolo entre si”, desabafou.

O acordo fechado por Jimmy Morales com os EUA, no fim de julho, implica que a Guatemala receba e abrigue ao menos parte dos milhares de centro-americanos que, desde o fim de 2018, se deslocam em direção ao México na esperança de atravessar a fronteira e buscar asilo em território norte-americano. “O novo presidente tem pela frente um cenário externo bastante desafiador se quiser recuperar espaços para abordar a questão migratória com os vizinhos”, avalia o ex-vice-presidente Eduardo Stein, ouvido pela agência de notícias France-Presse.

Ele se referia, particularmente, a Honduras, El Salvador e México. “O atual governo (da Guatemala), por razões que não entendemos bem, negligenciou o relacionamento com a vizinhança”, criticou Stein. Sintomaticamente, o governo mexicano aproveitou a mensagem de congratulações ao eleito para insistir na necessidade de avançar com as negociaçõe sobre um plano regional de desenvolvimento que ajude a conter a migração.

No plano interno, o ex-vice-presidente recomendou a Giammattei que busque a oposição política e outros setores da sociedade civil para negociar “entendimentos frutíferos e construtivos”. Na opinião de Stein, “a Guatemala não pode suportar mais quatro anos de fraturas constantes e antagonismos extremos, como vem ocorrendo no período recente”.