Título: As reclamações de José Dirceu
Autor: Abreu, Diego ; Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 09/11/2012, Política, p. 3

O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, condenado por formação de quadrilha e corrupção ativa, criticou ontem a decisão do Supremo Tribunal Federal de apreender os passaportes dos réus do mensalão considerados culpados pela Corte. Em texto publicado em seu blog, Dirceu afirmou que a medida "é puro populismo jurídico e uma séria violação aos direitos dos réus". Ele justificou sua posição explicando que o julgamento ainda não acabou. "A sentença não transitou em julgado e cabem recursos, mesmo após a publicação do acórdão", acrescentou o ex-ministro.

Para Dirceu, os argumentos usados pelo relator, Joaquim Barbosa, para determinar a apreensão dos passaportes "cerceiam a liberdade de expressão e são uma tentativa de constranger e censurar". O ex-ministro garantiu ainda que, apesar de considerado culpado, vai lutar para contestar o resultado do julgamento. "Mesmo condenado e apenado, não abro mão de meus direitos e garantias individuais. Do direito de me expressar e contraditar o julgamento e minha condenação", justificou o réu, considerado o líder da quadrilha do mensalão pelos ministros do Supremo.

De forma velada, José Dirceu fez críticas ao relator do mensalão, Joaquim Barbosa, e disse que "nenhum ministro encarna o Poder Judiciário". "Não estamos numa ditadura. Mesmo acatando a decisão, tenho o direito de me expressar diante de uma tentativa de intimidar os réus, cercear o direito de defesa e expor os demais ministros ao clamor popular", concluiu José Dirceu.

Em nota, o advogado José Luís Oliveira Lima, que representa o ex-ministro, garantiu que vai entregar imediatamente o passaporte de José Dirceu. "Decisões judiciais devem ser respeitadas e cumpridas, mas isso não quer dizer que não podem ser contestadas, quer pelo acusado, quer pela defesa técnica", explicou o representante do ex-ministro.

Dosimetria O julgamento do mensalão chegou ontem à 44ª sessão. Os ministros concluíram o cálculo das penas dos publicitários Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, ex-sócios do empresário Marcos Valério. A soma da dosimetria feita em relação ao primeiro chega a 29 anos, sete meses e 20 dias de prisão, enquanto a punição total do segundo está fixada em 25 anos, 11 meses e 20 dias. Os ministros observam, porém, que ao fim do julgamento é possível que as penas sejam revisadas, com possibilidade de redução.

O STF também iniciou a dosimetria de Rogério Tolentino, ex-advogado de Valério, e da ex-diretora financeira da agência SMP&B Simone Vasconcelos. As penas de Tolentino, por enquanto, somam cinco anos e três meses de prisão, mas os ministros ainda vão calcular a punição dele pelo crime de lavagem de dinheiro.

Quanto a Simone, a pena parcial é de quatro anos e dois meses pelo crime de corrupção ativa relativo à compra de apoio parlamentar. Condenada à pena mínima de dois anos por formação de quadrilha, ela escapou de ser punida por esse delito, pois qualquer sanção de até dois anos está prescrita. Os ministros terminarão os cálculos referentes a Simone na próxima sessão, marcada para segunda-feira, quando vão definir a punição pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Por enquanto, a soma das penas dos réus do núcleo publicitário chega a mais de 105 anos e as multas alcançam a cifra de R$ 8,4 milhões.

Ontem, o ministro Celso de Mello, decano da Corte, voltou a defender que os réus condenados por peculato devolvam aos cofres públicos os valores desviados. Ele citou o caso da ação contra o deputado federal Natan Donadon (PMDB-RO), cujo acórdão da condenação estabeleceu a necessidade de restituir R$ 1,6 milhão desviado da Assembleia Legislativa de Rondônia. "Há precedentes nesta Corte e também em outros tribunais, como o STJ", justificou Celso. O relator, Joaquim Barbosa, que em sessões anteriores havia rejeitado a proposta, ontem disse que concorda com Celso de Mello. Marco Aurélio Mello, entretanto, se mostrou contrário à ideia e, diante das divergências, o presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, decidiu adiar a decisão a esse respeito.

Ayres Britto em duas sessões O relator do mensalão, Joaquim Barbosa, anunciou ontem que vai estabelecer as penas dos réus do núcleo financeiro após a conclusão da dosimetria dos condenados do núcleo publicitário. Na sessão marcada para a próxima segunda-feira, os ministros vão concluir a definição das penas de Simone Vasconcelos e Rogério Tolentino e, na sequência, vão decidir o destino dos ex-dirigentes do Banco Rural. Essa será a penúltima sessão presidida pelo ministro Carlos Ayres Britto, que se aposentará até 18 de novembro.