O Estado de São Paulo, n. 46128, 02/02/2020. Política, p. A4

 

Maia mira 2022 em último ano no comando da Câmara

Daniel Weterman

Camila Turtelli

02/02/2020

 

 

Legislativo. Presidente da Casa desde 2016, deputado volta do recesso com intenção de manter protagonismo na relação com governo Bolsonaro e ter visibilidade até as eleições

Protagonista das últimas reformas econômicas, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), volta do recesso parlamentar amanhã com o desafio de continuar dando as cartas na relação entre o Congresso e o Planalto e a perspectiva de perder o poder no fim do ano.

O deputado evita antecipar a própria sucessão. Não tem declarado apoio a ninguém, o que faz aumentar o número de aliados de olho na disputa pela sua cadeira, marcada para fevereiro do ano que vem. Um movimento calculado. Seu desafio será arrastar a visibilidade até as eleições gerais de 2022. “Só não posso apoiar quem antecipar o processo eleitoral (na Câmara) ”, disse o deputado ao Estado.

No comando da Câmara desde 2016 e segundo na linha de sucessão presidencial, Maia não é um campeão de votos e sabe que a liderança na Casa é uma garantia que tem por pouco tempo. Recentemente, reformulou sua imagem nas mídias sociais, mas tem sido triturado virtualmente por uma rede capitaneada pessoalmente pelos integrantes da família Bolsonaro.

O último ano de Maia no comando da Câmara será mais curto, o que não significa que ficará livre de turbulências. No segundo semestre, as eleições municipais de outubro vão monopolizar as atenções. Ainda assim, há expectativa de crise em torno dos desdobramentos da briga interna no PSL, maior partido da Casa ao lado do PT, com 53 deputados. A disputa põe de um lado o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro, e, de outro, o grupo liderado pelo desafeto da família presidencial, deputado Luciano Bivar (PE), presidente do PSL, partido que Bolsonaro deixou no ano passado. Em jogo está quem vai mandar na bancada, inclusive, orientando os 53 votos.

Outro foco de tensão que colocará o Parlamento em alerta este ano será o controle do Orçamento. A queda de braço é com o governo. Enquanto o Congresso quer ter o direito de indicar o destino R$ 46 bilhões para atender suas bases, o Planalto resiste. O valor foi apresentado pelo relator do Orçamento, Domingos Neto (PSD-CE), aliado de Maia, no fim do ano passado.

Deputados e senadores consideram que garantir o pagamento de todas as emendas parlamentares é a principal tarefa das próximas semanas. Muitos deputados vão disputar vagas de prefeito ou trabalhar para alavancar candidaturas de seus aliados. “No momento em que começa uma eleição, isso cria um ambiente de tensão que é natural”, afirmou Neto.

O próprio Maia também vai protagonizar embates na retomada de trabalhos no Congresso. Na semana passada, ele fez ataques diretos ao ministro da Educação, Abraham Weintraub, ao acusá-lo de “brincar” com o futuro das crianças (mais informações abaixo). Maia ficou contrariado com a demissão do advogado Rodrigo Sergio Dias, indicado por ele para o comando do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) em dezembro, em pleno recesso parlamentar.

“Fiz apenas uma crítica (a Weintraub), pois fui perguntado. Minha opinião pessoal não interfere na minha relação com o governo”, minimizou Maia. Apesar disso, ele prefere restringir sua interlocução no Executivo ao presidente Bolsonaro. “Minha relação é com o presidente da República. A relação está muito boa”, garantiu.

Para manter vivo seu protagonismo, Maia conta com aliados que dependem dele para ter uma ponte com o Planalto, uma vez que rejeitam dialogar com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política. “A partir do momento que o governo não tem articulador, Maia continua a ser protagonista”, resumiu o líder do Podemos, José Nelto (GO). O presidente do Solidariedade, Paulinho da Força (SP), diz o mesmo: “Maia virou uma liderança e esperamos que ele mantenha esse protagonismo.”

Senado. Pelo comando da Câmara brigam de forma velada os aliados Arthur Lira (PP-AL), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Elmar Nascimento (DEM-BA), Marcos Pereira (RepublicanosSP) e Marcelo Ramos (PL-AM). Maia declarou que não fará movimentos para possibilitar sua reeleição, atualmente vedada pela Constituição. Essa alteração é o desejo do Presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

A exemplo de Maia, Alcolumbre sai da presidência em fevereiro de 2021 e também quer deixar uma grande reforma concluída: a tributária. Esta, no entanto, não encontra consenso. Ao Estado, o Presidente do Senado classificou a agenda econômica como um esforço conjunto. “A aprovação da reforma da Previdência foi exemplo disso”, disse. “O protagonismo do Congresso foi indiscutivelmente decisivo. Esse mesmo empenho será necessário em 2020.”

PAUTA DE 2020

- Reformas tributária e administrativa

As duas reformas são consideradas sensíveis em ano eleitoral e devem ter suas votações adiadas no Congresso. Ainda não existe acordo para que os temas sejam analisados pelos congressistas.

 - Marco Legal do Saneamento

Uma discussão célere do marco legal do setor é defendida pelos parlamentares, já que o assunto tem apelo popular e pode ter uma “boa repercussão” nas disputas municipais deste ano.

 - Prisão em 2ª instância

Deputados preveem votar uma PEC em comissão especial até abril. Já a bancada pró-Lava Jato defende um projeto escrito com o ministro Sérgio Moro.

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Parlamentares preparam ofensiva contra Weintraub

Vinícius Valfré

02/02/2020

 

 

Tabata Amaral solicitou convocação do ministro da Educação para dar explicações sobre erros nas notas do Enem

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, deverá ser alvo de artilharia de parlamentares de vários partidos na retomada dos trabalhos amanhã. A crise provocada pelos erros nas notas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) levou deputados da oposição a prepararem uma ofensiva contra o ministro. O objetivo é aumentar a pressão sobre o chefe da pasta.

Integrante da Comissão de Educação, a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) já solicitou nova convocação do ministro para que ele apresente explicações "de forma técnica, transparente e detalhada" tanto sobre o erro quanto sobre as providências adotadas pelo ministério.

O cronograma joga a favor de Weintraub. Os trabalhos legislativos serão reiniciados amanhã, mas as comissões temáticas, como a de educação, só voltam a se reunir no fim do mês. Para manter o tema em evidência, parlamentares da oposição não descartam tentar convocá-lo a depor no plenário ou pedir para que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), acelere a recomposição dos colegiados.

Na quinta-feira, Maia atacou Weintraub publicamente ao dizer que o ministro atrapalha o Brasil e brinca com o futuro de crianças. Relator da comissão externa que produziu um diagnóstico das ações do MEC no ano passado, o deputado Felipe Rigoni (PSB-ES) avalia como necessária uma nova convocação de Weintraub. O Estado revelou, em novembro, que o trabalho apontou paralisia e ineficiência na pasta.

"Nosso papel agora é mostrar para a sociedade que é uma escolha do governo manter uma pessoa dessa qualidade na frente do seu ministério mais importante", afirmou o deputado.

O governista Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) avalia que a estratégia da oposição acabará por fortalecer o ministro. "Quanto mais o tom da classe política engrossar, mais o fortalece. O estilo do presidente é ao contrário da lógica", disse.