O globo, n.31405, 01/08/2019. Economia, p. 18

 

Juros baixos para uma economia fraca 

Míriam Leitão

01/08/2019

 

 

O Banco Central cortou os juros em meio ponto, para 6%, e tinha todos os motivos para fazer esse movimento mais forte. A inflação está baixa, a economia não reage, e outros bancos centrais mundo afora também estão reduzindo as taxas. Ontem mesmo foi a vez do Fed, o BC americano, reduzir os juros pela primeira vez em mais de 10 anos. A votação da reforma da Previdência em primeiro turno na Câmara indicou que há motivação do Congresso para enfrentar a crise fiscal e por ora o país não corre riscos de passar por uma crise de confiança que afete o nosso balanço de pagamentos. O déficit em conta-corrente está baixo. O corte da Selic vai reduzir a despesa do governo com a dívida pública, e isso vai ajudar a diminuir o déficit nominal. Mais difícil será baixar os juros na ponta, para o tomador de crédito. No primeiro semestre, houve aumento do spread e encarecimento de várias linhas pelos principais bancos. A queda da Selic para 6% é necessária, mas por si só o impulso monetário não garante a recuperação mais forte.

Novos cortes virão

Se nos EUA o Banco Central não foi claro sobre a continuidade dos cortes de juros — isso ajudou a derrubar a bolsa brasileira — no Brasil, o comunicado do Copom foi considerado otimista pelos economistas e já há quem aposte em mais uma redução de meio ponto na próxima reunião, em setembro. As projeções de inflação estão em “níveis confortáveis”, em 3,6% para este ano e 3,9% no próximo, mesmo que a Selic caia para 5,5%. O comunicado do BC ressalta que as reformas são essenciais para que a trajetória de queda dos juros se confirme.

Microcosmos da bolsa

Veja como a alta da bolsa não é o melhor termômetro para se medir a recuperação da economia. No Ibovespa, as empresas ligadas à atividade econômica no Brasil têm um peso de apenas 30% no índice, explica o economista Luis Gustavo Pereira, da Guide Investimentos. As companhias que vendem algum tipo de commodity, como Petrobras e Vale, também representam 30% e oscilam ao sabor dos preços internacionais. Outros 30% estão com o setor financeiro. “A bolsa tem uma lógica própria, é um universo diferente do resto da economia. Não necessariamente o aumento do Ibovespa significa mais crescimento econômico”, explica Pereira.

Temporada adiada

Mesmo com o índice Ibovespa batendo recorde, o mercado financeiro ainda não espera uma temporada de IPOs na bolsa este ano, ou seja, de abertura de capital de empresas. “Ainda falta previsibilidade. O IPO é uma operação mais complexa, porque a empresa está se apresentando para o investidor pela primeira vez. Há um risco maior. Se não for uma marca forte, a operação se torna mais difícil. Isso vai ficar mais para frente, depois que o cenário na economia estiver menos incerto”, aposta Luis Gustavo Pereira. As emissões subsequentes de ações, por outro lado, já somam R$ 47 bilhões este ano. Nesse tipo de operação, a empresa já listada vende seus papéis e levanta mais dinheiro com investidores.

Olho no Congresso

O Congresso volta do recesso hoje, e a agenda econômica deve ser intensa neste mês de agosto. A expectativa é que o segundo turno da votação da reforma da Previdência aconteça já na semana que vem, para abrir espaço para as discussões da reforma tributária na Comissão Especial. A Comissão Mista de Orçamento precisa votar a LDO — uma prévia do orçamento de 2020 — que já deveria ter sido aprovada no início de julho. A definição do salário mínimo e do fundo eleitoral serão dois itens polêmicos. A MP da Liberdade Econômica também precisa entrar na pauta antes de caducar em setembro.

Procura-se

O ministro da Economia, Paulo Guedes, está à procura de um interlocutor político para conduzir as negociações entre o Executivo e o Congresso na reforma tributária. Em outras palavras, procura um nome que reúna as mesmas qualidades do ex-deputado Rogério Marinho, que foi elogiado na condução da Previdência.