O Estado de São Paulo, n. 46130, 04/02/2020. Política, p. A5

 

Cabral afirma que Pezão ajudou a montar esquema

Caio Sartori

04/02/2020

 

 

Também ouvido ontem pela Justiça, ex-vice-governador negou ter recebido propina, criticou aliado e disse que prisão foi ‘aterrorizante’

Preso há mais de três anos, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) disse na tarde de ontem ao juiz Marcelo Bretas que o ex-governador e correligionário Luiz Fernando Pezão o ajudou a montar todo o esquema de propina que funcionou durante seu governo (2007-2014). Pezão foi vice-governador e secretário de Obras de Cabral, a quem sucedeu no Palácio Guanabara de 2014 a 2018. 

“Confirmo que o vice-governador e governador Luiz Fernando Pezão participou da estruturação dos benefícios indevidos desde o primeiro instante do nosso governo, desde a campanha eleitoral e durante os oito anos em que fui governador. E, posteriormente (já no governo Pezão), tenho algumas informações a respeito”, disse Cabral na 7.ª Vara Federal Criminal do Rio, onde correm os processos da Lava Jato fluminense. 

Ele reafirmou o que disse em delação o ex-operador e hoje colaborador das investigações Sérgio de Castro Oliveira, o “Serjão”, que relatou que Pezão recebia uma mesada de R$ 150 mil durante o governo Cabral. “Os fornecedores falavam em 10%, 15% (nos governos anteriores). Eram pagos pelas fornecedoras aos governos anteriores. Eu estabeleci junto com o Pezão um percentual de 5%: eram 3% para o meu núcleo, 1% para o dele, que era a Secretaria de Obras, e 1% para o Tribunal de Contas para a aprovação das licitações”, declarou Cabral, cujas penas somam 267 anos de prisão. 

Além dos R$ 150 mil por mês, Pezão também receberia, segundo o ex-aliado, bônus – normalmente entregues no fim do ano –, além da chamada “taxa de oxigênio”, porcentual de 1% cobrado em cima de projetos da Secretaria de Obras. 

Outro suposto benefício indevido seriam pagamentos da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio (Fetranspor), que pagaria um valor mensal de R$ 500 mil. Os empresários de transportes também teriam dado propina de R$ 30 milhões para a campanha dele em 2014.

 “O Pezão tinha um estilo de vida muito simples, então passava a impressão de que esses benefícios não ocorriam. Mas eu sabia que ocorriam, e até a forma como ele fazia uso desses benefícios”, afirmou Cabral. 

‘Perplexo’. Pezão também foi ouvido ontem – foi seu primeiro depoimento desde que foi preso, em novembro de 2018. Ele negou as acusações às quais responde e, antes de responder aos questionamentos de Bretas, pediu a palavra. “Estou há 14 meses esperando para falar. Fui preso sem ter direito a falar.” Segundo Pezão, sua prisão foi “aterrorizante”. 

O sucessor de Cabral negou as acusações do seu antigo aliado e do delator “Serjão”. “Acho que é uma delação combinada para ganhar benefício, e eu sou o único que restou aqui. Não sei qual é a mágoa, a frustração que eles têm.” Pouco antes de ser preso, Pezão disse ao Estado que tinha vontade de visitar Cabral “e lhe dar um abraço”. 

De acordo com o ex-vice, ele não tem dinheiro guardado – como afirmou Cabral – e nunca recebeu mesada de R$ 150 mil ou propina da Fetranspor. “Eu estou abismado e perplexo com a criatividade deles.”

 A Bretas, o ex-governador também criticou a forma como se deu sua prisão. “Eu fui tirado de dentro do Palácio Laranjeiras de uma maneira muito violenta. Não esperava sofrer o que eu sofri, sair daquela maneira: precisar entrar seis pessoas de fuzis, com armas apontadas para mim e minha esposa. Achei uma violência muito grande”, afirmou Pezão. 

Os depoimentos dos ex-governadores ocorreram na Operação Boca do Lobo, que levou à prisão de Pezão. Ele estava em prisão preventiva desde novembro de 2018, quando foi detido na sede do governo do Rio, a pouco mais de um mês de completar seu mandato. 

Em dezembro, por entender que o ex-governador não representava mais uma ameaça às apurações, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) mandou soltálo. Ele cumpre, agora, medidas cautelares: não pode deixar o Estado ou ocupar cargos públicos. Também é obrigado a usar tornozeleira eletrônica.

Depoimentos

- “Luiz Fernando Pezão participou da estruturação dos benefícios indevidos desde o primeiro instante do nosso governo.”

Sérgio Cabral EX-GOVERNADOR DO RIO

 “Acho que é uma delação combinada para ganhar benefício. Estou abismado com a criatividade deles.”

Luiz Fernando Pezão EX-GOVERNADOR DO RIO

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Em SP, Bolsonaro sela parceria com Skaf

Pedro Venceslau

04/02/2020

 

 

Presidente da Fiesp pode trocar o MDB pelo Aliança pelo Brasil e avalia disputar o Bandeirantes em 2022

Em viagem a São Paulo ontem, o presidente Jair Bolsonaro selou publicamente o alinhamento político com o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf. O empresário, que fez oposição sistemática ao governo Dilma Rousseff, pode deixar o MDB e migrar para o Aliança pelo Brasil, partido que o presidente pretende criar.

Pela manhã, Skaf esteve ao lado de Bolsonaro durante a cerimônia de lançamento da pedra fundamental do Colégio Militar de São Paulo, que será construído em um terreno ao lado do Campo de Marte, na zona norte da capital. O projeto arquitetônico do empreendimento foi doado pela Fiesp. Em seguida, eles visitaram a primeira turma de alunos do colégio, que está tendo aulas em uma unidade de treinamento do Exército, e, depois, almoçaram com empresários na sede da Fiesp, na Avenida Paulista.

“Essa casa está apoiando o governo Jair Bolsonaro. Vamos estar juntos para derrubar todos os obstáculos. Estamos apoiando seu governo não por razão política e partidária, mas por enxergarmos com clareza que o rumo está certo”, afirmou Skaf. Bolsonaro retribuiu. “Paulo Skaf conseguiu emprego no meu governo, o de porta-voz.”

Bolsonaro também fez elogios ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por seu apoio às reformas do governo. “O Maia, como presidente de um dos Poderes, tem se mostrado mais que simpático (às reformas). Ele quer ser protagonista nessa questão.” O presidente do Legislativo é Davi Alcolumbre (DEM-AP), e não Maia.

Com o MDB cada vez mais próximo do governador João Doria (PSDB), que não participou de nenhuma das agendas de ontem, Skaf passou a ventilar a possibilidade de disputar o Bandeirantes em 2022 pelo

Aliança pelo Brasil, partido que Bolsonaro pretende criar.

Os bolsonaristas abriram o caminho para que o presidente da Fiesp assuma o comando da legenda no Estado. O movimento é consenso entre os filhos do presidente e o núcleo ideológico da futura legenda. As conversas entre Skaf e Bolsonaro estão avançadas e a cúpula do MDB já foi informada. O presidente e o empresário estudam apoiar, juntos, a candidatura do apresentador José Luiz Datena para a Prefeitura da capital.

Acompanharam Bolsonaro em São Paulo os ministros da Educação, Abraham Weintraub, e do Meio Ambiente, Ricardo Salles, além do senador Flávio Bolsonaro (sem partidoRJ), do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e da secretária da Cultura, Regina Duarte.

Desde que Bolsonaro tomou posse, a Fiesp se tornou uma “base” da Esplanada em São Paulo. Em 2019, dez ministros e 14 secretários estiveram 40 vezes na entidade.