Valor econômico, v.20, n.4825, 29/08/2019. Brasil, p. A2

 

Alta do dólar não altera projeções de inflação

Arícia Martins 

29/08/2019

 

 

A escalada do dólar está sendo monitorada, mas ainda não motivou revisões para cima nas projeções para a inflação brasileira. Ontem, o dólar comercial encerrou o dia com alta de 0,01%, aos R$ 4,1579. Segundo economistas, este patamar não deve se manter e, por isso, não será incorporado aos preços. Além disso, a elevada capacidade ociosa na economia inibe reajustes e enfraquece o repasse cambial.

Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, elevou nesta semana, de R$ 3,90 para R$ 4, a estimativa para a cotação média da moeda americana em 2019. Para 2020, a projeção saiu de R$ 3,77 para R$ 4,05. As previsões para a alta do IPCA nos dois anos, porém, foram mantidas, em 3,5% e 3,7%, respectivamente.

"Acredito que parte desta depreciação não é permanente", diz Oliveira, referindo-se aos níveis próximos de R$ 4,20. "Acho que a taxa de câmbio deve ficar entre R$ 4 e R$ 4,10, o que não me parece uma depreciação grande o suficiente para reestimar o IPCA."

A atividade fraca também reduz o espaço para repasses de preços, acrescenta Oliveira. Nos 12 meses encerrados em julho, os bens industrializados aumentaram apenas 1,4% dentro do indicador oficial de inflação, mas subiram 7,45% ao produtor, segundo o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA), da Fundação Getulio Vargas (FGV). "O repasse cambial seria mais fácil se a economia estivesse mais aquecida", avalia o economista do Fibra.

O ano passado é um claro exemplo de que o "pass through" perdeu força. Na média de 2018, o dólar subiu 16,9% ante o real, enquanto o IPCA encerrou o ano em 3,75%. Em outras ocasiões de desvalorização cambial expressiva, a inflação foi maior. Em 2001, por exemplo, com alta de 18,7% do dólar, o IPCA ficou em 7,67%. No ano seguinte, quando a moeda americana saltou mais de 50%, o IPCA aumentou 12,53%.

A LCA Consultores, por ora, também mantém suas projeções para o indicador oficial de inflação, tanto para este ano (3,6%) quanto para o próximo (3,7%), e segue avaliando que o Banco Central entregará "um substancial" corte da taxa básica de juros, mesmo após a depreciação mais forte do real.

Para a consultoria, a atuação recente do BC no mercado de câmbio não parece ter sido motivada por preocupações com o impacto inflacionário da alta do dólar. A desvalorização do real não ameaça a flexibilização da política monetária, segundo a LCA, devido à tranquilidade do cenário inflacionário. A inflação corrente segue muito baixa, ao passo que os núcleos, que reduzem ou excluem o impacto de itens voláteis sobre o IPCA, estão correndo abaixo da meta, observam os economistas.

Além disso, as leituras recentes dos índices de preços vieram abaixo das expectativas, o que levou a uma nova rodada de redução de estimativas para o IPCA. "Esses movimentos refletem o fato de que o ambiente de elevada ociosidade continua a limitar o repasse de aumentos de custos, como aqueles associados à depreciação cambial, para os preços finais", comenta a LCA.

A consultoria ainda destaca que pode ajustar as estimativas para o desempenho do PIB, a depender dos dados do segundo trimestre e também de revisões no cenário para Argentina e Europa, importantes parceiros comerciais do Brasil.