Correio braziliense, n.20543, 21/08/2019. Economia, p. 7

 

Caixa lança linha mais barata para casa própria

Rodolfo Costa

​Ingrid Soares

21/08/2019

 

 

Conjuntura » Nova modalidade será indexada ao IPCA, atualmente abaixo de 4%, mais taxa entre 2,95% e 4,95% ao ano. Empréstimos em vigor cobram de 8,5% a 9,75% mais TR. Expectativa é oferecer crédito imobiliário com redução de até 51%

A Caixa Econômica Federal colocou em prática a proposta de ampliação da oferta de crédito imobiliário no país. A estatal lançou uma nova linha de financiamento para compra de imóveis atrelada ao indicador oficial de inflação, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Serão oferecidos empréstimos a taxa mínima de 2,95% e máxima de 4,95% ao ano, mais o IPCA, acumulados em 3,22% nos últimos 12 meses.

A medida oferece aos consumidores uma linha mais barata do que as atuais, que têm taxas que variam entre 8,5% e 9,75% ao ano, mais a Taxa Referencial (TR), atualmente zerada. A Caixa calcula que a nova modalidade poderá proporcionar uma redução de 35% a 51% nas prestações. A linha prazo máximo de 360 meses (30 anos), com quota máxima de financiamento de 80%.

A instituição financeira estima que 150 mil contratos novos sejam fechados nessa modalidade de crédito, com lucro de R$ 10 bilhões. O tempo para que isso ocorra, no entanto, não foi estimado. Com a medida, o objetivo é contribuir para a redução do deficit habitacional, atualmente em 6 milhões de unidades. A nova linha, por hora, só está sendo adotada pela Caixa, que detém 70% do crédito imobiliário do país, mas a expectativa é de que outras instituições financeiras acompanhem a medida.

Para o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, a taxa mais baixa na modalidade do IPCA possibilitará uma maior inclusão. “Faz com que muitas pessoas possam entrar (no mercado de crédito), passando a ser um sistema inclusivo”, sustentou. A expectativa, agora, é de um volume grande de novos financiamentos. “Temos total tranquilidade que é uma taxa boa para a Caixa e a sociedade como um todo. Estamos felizes porque conseguimos rentabilidade e é bom para a população brasileira”, afirmou.

Projeções

A Caixa trabalha com projeções do IPCA ao redor de 3,5% ao ano e, por isso, prevê uma demanda maior pela nova linha de crédito. “Vamos fazer análises mensais, trimestrais, pois é um produto novo. Temos demanda superior de R$ 30 bilhões por crédito imobiliário pelo IPCA”, ponderou.

O anúncio, feito em solenidade no Palácio do Planalto, foi comemorado pelo presidente Jair Bolsonaro. “Pelo que entendi, o crédito imobiliário terá uma redução de 30% a 50%. Quem, hoje, paga mensalidade de R$ 1 mil, a partir de amanhã, seria entre R$ 500 e R$ 600. Isso é muito bem vindo. A sociedade toda ganha”, celebrou. Os exemplos citados pelo chefe do Executivo federal, no entanto, só se aplicam à contratação de uma nova linha. Não será possível migrar um atual contrato, vigente em um crédito atrelado à TR, para um indexado ao IPCA.

Securitização

A novidade possibilitará que a o banco público amplie a venda de recebíveis imobiliários da Caixa no mercado de capitais via securitização. “Todos os bancos poderão aumentar a carteira de crédito imobiliário, pois poderá mitigar o risco vendendo para terceiros. Esses empréstimos têm possibilidade de rendimentos muito superiores. O segredo é gerar recebíveis de créditos interessantes para a população e fundos de investimentos”, destacou Guimarães.

A securitização é uma prática financeira que consiste em agrupar ativos financeiros e convertê-los em títulos padronizados e negociáveis no mercado de capitais. No caso da Caixa, possibilitará a venda do direito sobre o crédito tomado pelos consumidores no mercado de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Securitizando créditos atrelados ao IPCA, a estatal terá custos menores e poderá ofertar mais papéis no mercado de capitais. Dessa forma, a medida possibilitará o crescimento da oferta do crédito imobiliário no país, e pagar uma taxa mais alta ao investidor.

O setor da construção civil aprovou a medida. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic) analisa que a transferência do indexador poderá atrair mais recursos para o financiamento, aumentar a concorrência entre os agentes financeiros e criar um mercado de recebíveis secundário, atuante, capaz de suprir o setor com o volume de recursos necessários para o crescimento.

Mais barato

Governo anuncia nova modalidade de financiamento habitacional indexada ao IPCA, que conviverá com as já existentes

Novas condições de empréstimo

» Taxa mínima: IPCA + 2,95% ao ano

» Taxa máxima: IPCA 4,95% ao ano

» Prazo máximo: 30 anos

» Condição de entrada: 20% do imóvel

» Valor máxima a ser financiado: 80% do imóvel

» Adesão é opcional e a partir de 26 de agosto

Linhas já existentes

» Sistema Financeiro de Habitação (SFH) financia imóveis avaliados em até R$ 1,5 milhão

» Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) financia imóveis avaliados acima de R$ 1,5 milhão

Obs: Ambas as linhas continuarão em vigor e poderão ser contratadas pelo consumidor, a taxas mínima de 8,5% e máxima de 9,75% ao ano

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Medida é um alento ao setor

Gabriel Pinheiro

Thaís Moura

21/08/2019

 

 

A linha de crédito indexada à inflação será facultativa e estará disponível, na Caixa, a partir de segunda-feira. No mercado imobiliário, a expectativa é grande. Para a proprietária da Imobiliária Real, Ivone Rodrigues, a queda das taxas pode impulsionar as vendas, que neste ano passaram por um momento de melhora. “Chegamos a vender cinco imóveis por mês”, disse.

Segundo ela, em um mercado volátil, o comprador se rende ao valor das taxas de financiamento, “A procura por imóveis para compra, agora, está bem baixa. Talvez, se diminuir a taxa, tudo acabe mudando. O que mais influencia hoje no financiamento é a taxa de juros, baixando fica atrativo para a compra”, acredita

Na opinião de Ivone, a baixa rentabilidade do imóvel como investimento afugentou os interessados. “Hoje os investidores preferem investir em bancos, moedas estrangeiras e em outras coisas. Não é mais tão rentável e lucrativo justamente por causa das taxas de juros.” Ela adverte, entretanto, que o fato de o índice acompanhar a inflação é um risco. Uma alta do IPCA significaria aumento das prestações.

Para a coordenadora de projetos da construção da Fundação Getulio Vargas (FGV), Ana Maria Castelo, a associação do crédito imobiliário com a inflação pode prejudicar o consumidor a longo prazo. “A menor taxa de juros e a mudança do indexador parece vantajoso neste primeiro momento, mas financiamentos imobiliários têm um horizonte de tempo de 25 a 30 anos, e a questão que surge é: nós vamos ter um cenário favorável para a inflação neste tempo?”, questionou a especialista.

“A ação é positiva principalmente por dar a opção ao consumidor de escolher entre a TR ou o IPCA. Se realmente tivermos um cenário de estabilidade de preços, sem dúvida, o uso da taxa atrelada ao IPCA deve crescer. Mas só nesse cenário”, disse Ana Maria Castelo.

Ela ainda destacou os benefícios da medida para o mercado imobiliário. “Antes, uma queixa do mercado imobiliário era de que os investidores não se interessavam por investimentos que não fossem atrelados à inflação. Em tese, agora você terá mais interesse por esses títulos, o que trará facilidade para o banco captar recursos, e conseguirá expandir a fonte de financiamento do mercado imobiliário”, analisou.