Título: Estrondo em prédio cancela provas do TRT
Autor: Laboissière, Mariana ; Oliveira, Sheila de
Fonte: Correio Braziliense, 12/11/2012, Cidades, p. 17

Quatro mil pessoas que faziam o concurso em uma universidade na 913 Sul viveram momentos de desespero quando parte do piso de duas salas se deslocou. O forte barulho apavorou os candidatos e um deles pulou de uma janela do primeiro andar do edifício

Um incidente na Universidade Paulista (Unip), na 913 Sul, resultou na suspensão do concurso público do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 10ª Região para 54.983 candidatos. O exame era aplicado no Distrito Federal e no estado de Tocantins, mas precisou ser adiado em função do deslocamento de parte do piso de duas salas, no Bloco A e no Bloco I, que, segundo testemunhas, ficou em forma de pirâmide. As provas serão reaplicadas, mas não há previsão de data. Desesperado, um dos candidatos se jogou do 1º andar do prédio e acabou se ferindo. Frederico Made Vellasco, 23 anos, apresentava um corte na cabeça e sentia fortes dores na região lombar, mas não corre risco de morte. Na tarde de ontem, ele teve alta do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF). Outras quatro pessoas passaram mal após o episódio, duas delas gestantes. A maioria teve crise nervosa.

Técnicos da Secretaria de Defesa Civil realizaram vistoria no edifício na tarde de ontem. Segundo o subsecretário de operações da pasta, Sérgio Bezerra, as salas 101 e 107 — distantes cerca de 100 metros uma da outra — ficaram comprometidas. “Ocorreu dilatação do material do piso, algo comum nessa época do ano em Brasília em função da transição do calor para frio e do frio para o calor. Mas se trata de um processo natural”, pontuou. Bezerra foi contundente ao descartar falhas estruturais na edificação ou risco de desabamento. Ele ponderou, contudo, que o revestimento usado na construção do prédio é inadequado. “Pode ter sido aplicada uma argamassa velha ou um material muito barato”, sugeriu.

Cerca de 4 mil pessoas realizavam os exames, por volta das 10h, quando foram surpreendidas por fortes estrondos. Alguns concurseiros saíram correndo e se espremeram para deixar o local. O tumulto foi tamanho que algumas pessoas acabaram pisoteadas. O barulho chegou a ser confundido com tiros, o que fez com que alguns candidatos se jogassem no chão. Algumas pessoas disseram ainda ter sentido o chão tremer. “Foi um som contínuo, parecia uma metralhadora. Uma pessoa gritou que tinha gente armada. Foi horrível, desesperador”, revelou um fiscal que preferiu manter o nome em sigilo.

Esse mesmo motivo teria levado Frederico Made Vellasco a se jogar da janela do 1º andar, como contou à reportagem o cunhado do jovem, o servidor público Henrique Fernandes, 29 anos. “Ele disse que foi tudo muito rápido. As pessoas saíram correndo de dentro das salas. Ele ficou muito assustado”, esclareceu. Henrique disse que Vellasco estava consciente, mas precisou passar por ressonância magnética para verificar um possível trauma na cabeça. Ainda de acordo com o servidor público, o cunhado deve se recuperar em Brasília e, em seguida, seguir para Goiânia, cidade onde reside. Ainda abalado, Frederico não quis falar com a imprensa.

Gritaria

O advogado Eduardo Silva, 43 anos, imaginou que o prédio estivesse caindo. “O som foi alto, mas eu não fiquei com medo. Só pensei em deixar aquela confusão”, disse. “Uma pessoa estava do meu lado e ficou travada, não conseguiu sair da sala, então tive que ajudá-la”, revelou. Eduardo fazia prova na Sala 330, dois andares acima de um dos locais onde ocorreu o abalo. A servidora pública Adriana Feitosa, 38, também realizava o exame. Ela estava na Sala 380 do Bloco I. Segundo ela, assim que entrou no local, percebeu que havia um desnível no chão. “Na hora, nem imaginei o que poderia acontecer, fomos pegos de surpresa com a gritaria”, justificou.

Embora a Unip tenha sido liberada para manter as atividades, especialistas recomendam atenção. Na análise do professor de engenharia civil da Universidade de Brasília (UnB) Dickran Berberian, barulhos como o registrado têm forte relação com risco de desabamento. “Se não desmoronou até agora, foi sorte. Esse estrondo sugere que a estrutura da obra está comprometida. É preciso avaliar cuidadosamente o local e verificar se ele não oferece perigo para outros blocos próximos”, justificou.

O Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (Cespe/UnB), banca responsável pela realização do certame, amparou a decisão de suspensão do concurso com base na recomendação da Defesa Civil. Segundo o órgão, o objetivo é preservar o estado emocional de quem fazia a prova. “As pessoas estão abaladas, por isso, uma pode, em função de um grito ou de um caderno que caiu, provocar um efeito dominó nas outras”, argumentou o subsecretário de operações, Sérgio Bezerra. A pasta solicitou à Unip laudo circunstanciado para apurar as causas do acidente. E, em nota, a Universidade Paulista informou que o documento será providenciado. Até lá, no entanto, novos eventos como o de ontem não estão descartados. Mesmo assim, as aulas desta segunda-feira estão mantidas. Em nota, a instituição lamentou o ocorrido.

Além do susto, alguns candidatos terão prejuízos financeiros. A estudante Diana Bitencourt, 27 anos, saiu de Vitória para fazer a prova em Brasília. Ela teve gastos com passagem e precisou pagar hospedagem na capital federal. Mesmo diante dos gastos, ela não soube calcular o valor, mas afirmou que foi alto. Assim como ela, Rafael Gomes Neiva, 27, saiu de Salvador com a intenção de garantir uma vaga no TRT. Ele estava em um dos locais onde ocorreu o deslocamento do piso e disse não ter ficado no local para ver os estragos. “Na bagunça, saí correndo. Não pensei duas vezes.”

Alguns candidatos reclamaram de suposta falta de preparo dos fiscais. Segundo o advogado Diego Macedo de Moura, 26 anos, o responsável pela sala onde ele fazia prova orientou que todos corressem. “Falara-me que um fiscal fechou a porta e não deixou ninguém sair e que outro, após verificar a fissura no chão, pediu que as cadeiras fossem afastadas. É um absurdo. Nesses casos, parece que os profissionais não sabem o que fazer”, sugeriu.

Perícia em loja do Guará Na última sexta-feira, o teto de uma loja de cosméticos desabou no Guará, deixando duas pessoas feridas. A perícia da Polícia Civil ainda não foi feita no local, mas, segundo informações da Defesa Civil, tem previsão para acontecer ainda hoje. A recomendação dada pela pasta foi de demolição da unidade devido a erros estruturais, mas o proprietário ainda pode tentar recuperar a edificação, desde que apresente laudo específico.

Treinamento Embora, no momento do acidente, houvesse brigadistas na Unip, nem todo o corpo de funcionários da instituição estava devidamente preparado para situações de pânico. Por isso, a Defesa Civil orientou a instituição a promover treinamento para os funcionários e orientar as demais pessoas que frequentarem o espaço, assim como ocorre hoje nos cinemas. O mesmo recado foi dado aos representantes do Cespe, banca responsável pela organização do concurso.