O Estado de São Paulo, n. 46132, 06/02/2020. Metrópole, p. A15

 

Bolsonaro anuncia projeto de garimpo em terra indígena

Mateus Vargas

Anne Warth

Jussara Soares

Isabela Palhares

06/02/2020

 

 

Texto regulamenta também a produção de óleo e energia nas áreas e será analisado pelo Congresso; presidente critica ambientalistas

O presidente Jair Bolsonaro assinou ontem o projeto de lei para regulamentar a mineração, produção de petróleo, gás e geração de energia elétrica em terras indígenas. Ao reconhecer que o texto sofrerá “pressões” contrárias, ele disse que confinaria na Amazônia, se pudesse, defensores do meio ambiente para que eles “deixem de atrapalhar”.

“Vamos sofrer pressões dos ambientalistas (pelo projeto)?

Esse pessoal do meio ambiente, né? Se um dia puder, confino na Amazônia, já que eles gostam tanto do meio ambiente. E deixem de atrapalhar o amazônida daqui de dentro de áreas urbanas”, disse ele, em evento no Palácio do Planalto sobre os 400 dias de seu governo.

Pelo projeto, o presidente encaminha ao Congresso pedidos de exploração de terra indígena. As comunidades indígenas serão consultadas, mas não têm poder de vetar a exploração de recursos naturais ou hídricos de seus territórios.

A manifestação dos indígenas e do presidente, que podem ser distintas, serão avaliadas pelo Legislativo. As comunidades só terão poder de vetar a garimpagem em suas terras por não indígenas. O texto regulamenta o pagamento aos indígenas com a participação no resultado da lavra e da geração de energia elétrica, além de indenização pela restrição ao uso da terra. O projeto também cria regras para que eles explorem economicamente suas terras.

Ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni disse que essa é a “Lei Áurea” dos indígenas, referindo-se ao texto de 1888 que deu fim à escravidão. Segundo ele, terras indígenas já são exploradas, mas ilegalmente, e o texto só regulamenta a exploração prevista na Constituição. O novo projeto deverá ser analisado pelo Congresso.

Pela lei, essas terras são da União e se destinam à posse permanente dos índios que as ocupam. Bolsonaro defendeu de modo mais enfático a regulamentação após ser alvo de críticas no Brasil e no exterior pela alta de incêndios na Amazônia. Ele chegou a receber no Planalto grupos de indígenas favoráveis ao garimpo em suas terras.

A governadores, em agosto, Bolsonaro disse que os Estados estavam “inviabilizados” por áreas indígenas. Em várias ocasiões, sem provas, afirmou que há interesse estrangeiro em impedir a exploração nos locais.

Críticas. Presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) já criticou, em novembro, a ideia de liberar a mineração nesses territórios. “Não é porque tem garimpo ilegal que vamos tratar de legalizar o garimpo. Temos de, primeiro, combater o que é ilegal e fazer amplo debate sobre o tema.” Ele ainda não comentou o texto de ontem.

Em 2019, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) disse que explorar áreas indígenas estava há décadas fora da pauta da entidade, que representa empresas do setor. Ontem, nota do Observatório do Clima, que reúne organizações da sociedade civil, apontou que a mudança levaria à alta do desmate, de invasões das áreas indígenas e violência contra esses povos. Para especialistas, pode violar ainda tratados internacionais, que definem ser preciso consultar indígenas sobre medida legislativa que os afete. 

PARA LEMBRAR

 Há pedidos para 1/3 das áreas

Em agosto do ano passado, o Estado mostrou que a exploração mineral em terras indígenas pode afetar quase um terço das reservas no País. Segundo o Instituto Socioambiental, havia, à época, 4.332 requerimentos para exploração do subsolo em 214 das 735 áreas indígenas registrados na Agência Nacional de Mineração. Os requerimentos envolviam a exploração de 66 substâncias, principalmente ouro. Parte deles é das décadas de 1980 e 1990, protocolados antes da demarcação das terras, e tem como objetivo garantir prioridade caso a exploração seja autorizada.

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Damares testará plano de prevenção sexual

Julia Lindner

06/02/2020

 

 

Três cidades terão piloto; Bolsonaro afirma que combater agressão de mulher não depende de verba, mas de 'postura'

 Sem apoio do Ministério da Saúde para lançar uma campanha mais enfática sobre abstinência sexual, a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, quer lançar o Plano Nacional de Prevenção ao Risco Sexual Precoce por conta própria. Para isso, Damares planeja testar a iniciativa em três cidades do Norte e Nordeste.

Lançada esta semana, a campanha da Semana de Prevenção da Gravidez Precoce foi tímida ao falar sobre o tema, já que o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, é contra usar o termo “abstinência sexual” como método contraceptivo.

Para elaborar o “plano de prevenção ao risco sexual”, o ministério de Damares informou que vai contratar consultorias no Brasil e exterior. Em nota, a pasta disse que tem a intenção de implementar “projetos-piloto” em três cidades que apresentem altas taxas de gravidez na adolescência e que “provavelmente” isso ocorrerá nas regiões Norte e Nordeste do País.

Segundo a pasta, os projetos servirão para coleta de dados. Só depois seria elaborada política nacional para tentar retardar o início das relações sexuais.

Ontem, o presidente Jair Bolsonaro manifestou apoio à proposta da Damares. “Tenho uma filha de 9 anos, você acha que eu quero minha filha grávida o ano que vem?”

Bolsonaro ainda sinalizou que não pretende reforçar o orçamento para o combate à violência contra a mulher. Para ele, a área não depende de dinheiro, mas de “postura”, “mudança de comportamento” e “conscientização”. Levantamento do Estadão/Broadcast revelou que houve redução drástica nos recursos da área entre 2015 e 2019.

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'Pessoa com HIV é despesa', diz presidente

Julia Lindner

Fabiana Cambricoli

06/02/2020

 

 

O presidente Jair Bolsonaro afirmou ontem que uma pessoa com HIV representa “uma despesa para todos no Brasil”, além de “um problema sério para ela mesma”. Bolsonaro fez o comentário ao defender a ideia da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, de que a abstinência sexual deve ser apresentada como método contraceptivo.

“O próprio Alexandre Garcia, ele fala que a esposa dele, que é obstetra, atendeu uma mulher que começou com o primeiro filho com 12 anos de idade. Outro

com 15, e no terceiro, que a esposa dele atendeu, ela já estava com HIV. Uma pessoa com HIV, além do problema sério para ela, é uma despesa para todos no Brasil”, disse o presidente.

A declaração de Bolsonaro causou reações. A Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA) repudiou a fala do presidente e afirmou que ela reforça “o estigma, o preconceito e a discriminação contra as pessoas que vivem com HIV/aids”. A ABIA afirmou esperar que o Supremo Tribunal Federal (STF) e demais instituições jurídicas “se mantenham alinhados à Constituição e garantam o acesso ao SUS e a proteção de todos os direitos fundamentais já garantidos, inclusive das pessoas que vivem com HIV/aids”.