Correio braziliense, n.20544, 22/08/2019. Economia, p.11

 

Uma saída: descentralizar a arrecadação de impostos

Simone Kafruni

22/08/2019

 

 

Ao encerrar o Correio Debate — Ética concorrencial e simplificação tributária, o advogado-geral da União, André Luiz Mendonça, disse que, para resolver a complexidade do sistema tributário brasileiro, é preciso rever o pacto federativo a fim de descentralizar a arrecadação de impostos. “Para encontrar equilíbrio e bom senso, precisamos ser capazes de nos colocarmos na posição do outro. Não adianta fazer uma reforma que tira do outro”, explicou.

Segundo ele, nenhuma reforma tributária vingou no país, porque é baseada nestas premissas: ou aumenta imposto, ou tira de alguém. “O poder mais forte é federal e centraliza de forma mais rápida e até voraz. O ministro Guedes (Paulo, da Economia) é enfático ao dizer que não quer aumentar a carga tributária”, disse.

Mendonça destacou que a carga está acima de 33% do Produto Interno Bruto (PIB), e o governo tem o desafio de entregá-la abaixo de 30% — se possível, avançando para desonerar o cidadão. “Esse é um grande desafio, porque a carga tributária é constituída da necessidade dos governos municipais, estaduais e federal de prestarem serviços”, explicou.

Ao comparar o sistema brasileiro com outros países, Mendonça citou a Suécia, país onde não há sigilo fiscal. “Se o vizinho chega de Mercedes Benz em casa, o cidadão pode entrar na internet e saber se ele está pagando os impostos corretamente. A questão tributária parte de uma vertente coletiva: nós e o Fisco. Porque se um sonega, outro paga por ele, e a carga aumenta”, disse.

No entanto, o ministro da AGU lembrou que, na Suécia, existe a transparência há 300 anos, enquanto no Brasil essa é uma cultura muito recente. “É preciso equilíbrio e consenso na construção de um sistema tributário no qual quem precisa ganhar não são os entes públicos: é a sociedade”, sustentou.

O grande problema do Brasil, conforme o advogado-geral da União, é que a despesa aumenta e é preciso pagá-la gerando inflação ou aumentando tributo. “Vencemos a inflação, mas não fomos capazes de eliminar os efeitos da cura daquele mal e fomos para aumento da carga tributária”, define. Além disso, tais despesas são ilícitas, assinalou Mendonça, porque mantêm a máquina, seja pela corrupção, seja pela ineficiência ou elevação do número ou salário de servidores. “Temos todo um cronograma que é feito para não dar certo”, afirmou.

Descentralização

De acordo com o ministro, o governo deve mexer no pacto federativo, equilibrando as forças, com a União abrindo mão de recursos. “Aí vem o lema de campanha do governo Bolsonaro: menos Brasília e mais Brasil. Isso passa pela eficiência dos processos, simplificação, redução no número de tributos, desoneração da folha para gerar emprego, maior equilíbrio federativo e maior capacidade de todos os atores de pensar o Brasil a médio e longo prazos”, enumerou. “Tenho firme convicção de que a reforma tributária constituirá grande marco ainda no primeiro ano do governo”, acrescentou.

Frase

"É preciso equilíbrio e consenso na construção de um sistema tributário no qual quem precisa ganhar não são os entes públicos: é a sociedade”

André Luiz Mendonça, advogado-geral da União

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Mais reformas são fundamentais

Cláudia Dianni

22/08/2019

 

 

O secretário da Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão do Distrito Federal, André Clemente, disse que o atual sistema tributário se tornou tão complexo que se transformou em um “manicômio ineficiente e sem racionalidade”, que dificulta aos governos fazerem entregas de serviços, a razão para arrecadar impostos. “Quando se fala de simplificação, falamos de qualidade de vida da sociedade. As reformas são necessárias para a simplificação”, disse. Clemente destacou a figura do devedor contumaz e de programas de refinanciamento de dívidas tributárias. “Isso mostra que há algo errado. Quando a gente tem que disciplinar o devedor contumaz, há uma falha estrutural e sistêmica, além de falha na legislação e da ética”, afirmou.

Para o secretário, as reformas estruturais se fazem necessárias, mas são grandes e vão dar trabalho. Além da tributária, será preciso concluir a previdenciária, a política, a do pacto federativo e fazer uma reforma na educação. “Vai envolver muito trabalho e velocidade, porque o manicômio já produziu efeitos, e a economia está sofrendo, o desemprego está alto, e as dificuldades para arrecadar são brutais.”

Os fatores norteadores da reforma devem ser simplicidade, transparência, arrecadação, neutralidade e equidade de tratamento, sugeriu o secretário. “As alterações não podem produzir efeitos no mercado e na economia”, ressaltou. De acordo com Clemente, o GDF mapeou ações que considera fundamentais para que haja investimentos e um governo de entregas: segurança jurídica, baixa burocracia, carga tributária justa e mão de obra capacitada. “É preciso alocação de recursos e infraestrutura ou a arrecadação vai ser pulverizada em custeio e pagamento de pessoal, e não vamos crescer”, ponderou.

Ele avaliou que as várias propostas de reformas tributárias, tanto as que tramitam no Congresso como as elaboradas por diferentes instituições, convergem para simplificar e manter a arrecadação e sugerem a manutenção momentânea da carga tributária. O secretário destacou, ainda, que os estados não concordam que o governo federal faça a gestão da arrecadação deles. “Temos que evitar os erros do passado, como disputa por espaço federativo, por competência, redução de carga tributária e ter garantia de arrecadação. Essa equação tem que ser dosada e bem construída para que União, estados e municípios tenham o que pretendem”, finalizou.

Frase

"Quando a gente tem que disciplinar o devedor contumaz, há uma falha estrutural e sistêmica, além de falha na legislação e da ética”

André Clemente, secretário da Fazenda do DF

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Economia escondida

Maria Eduarda Cardim

22/08/2019

 

 

A sonegação movimentou mais de R$ 1 trilhão no ano passado. Além da falta de concorrência gerada pelos devedores contumazes, a economia subterrânea, caracterizada pela produção de bens e serviços não reportada ao governo deliberadamente, é um dos desafios do sistema tributário do Brasil. Estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) em conjunto com Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), apontou que, em 2018, R$ 1,17 trilhão foi movimentado pela chamada economia subterrânea. A informação foi revelada pelo presidente do ETCO, Edson Vismona.

Segundo ele, o montante da economia subterrânea caiu até 2014, mas voltou a crescer. “Esse número de hoje é o PIB (Produto Interno Bruto) da África do Sul. E isso mostra que tem quem pague e quem não paga”, ressaltou. O índice da economia subterrânea é divulgado pelas instituições desde 2007, e o número de 2018 mostrou o crescimento da informalidade pelo quarto ano consecutivo.

Para Edson, a saída é a desburocratização do sistema tributário. “A reforma do processo tributário é fundamental, além do respeito ao contribuinte. O bom contribuinte não quer deixar de pagar, ele quer pagar o que é justo”, afirmou.

Frase

"A reforma do processo tributário é fundamental, além do respeito ao contribuinte. O bom contribuinte não quer deixar de pagar, ele quer pagar o que é justo”

Edson Vismona, presidente da ETCO

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Projeto para evitar os desequilíbrios

Vera Batista

22/08/2019

 

 

Relator do PLS 284/2017, o senador Rodrigo Pacheco (DEM/MG) anunciou no Correio Debate que vai apresentar seu relatório na semana que vem. A proposta muda o artigo 146-A da Constituição, com o objetivo de caracterizar os devedores contumazes, aqueles que devem, não pagam os tributos, usam o dinheiro para tirar vantagem financeira e, assim, praticam a redução artificial de preços e a concorrência desleal.

O PLS estabelece critérios especiais de tributação para prevenir desequilíbrios concorrenciais, combater a sonegação, a inadimplência e a adulteração de produtos. “A proposta é importante para evitar interpretações equivocadas e a impressão pela sociedade de que, eventualmente, empreendedores em crise financeira serão punidos. É necessário fazer a separação dos tipos de devedores”, reforçou. “Hoje, a lei não consegue punir o dolo”, afirmou.

As fragilidades na lei atual acabam por incentivar o mau empresário, segundo o Senador. “Ele se aproveita das vantagens econômicas do não pagamento dos tributos. A fiscalização ou a auditoria precisa encontrar indícios de outras irregularidades, como lavagem de dinheiro e organização criminosa para fazer com que quem cometeu crime tributário seja obrigado a ressarcir o Estado”, ressaltou. “Os tributos sonegados pelos contumazes poderiam e deveriam ser investidos em saúde, educação e segurança pública”, alertou Pacheco. São necessários outros avanços, com a aprovação de propostas em tramitação, como o pacto federativo, a lei de liberdade econômica e, principalmente, a reforma tributária. “O empresário brasileiro tem que ser criativo para superar as dificuldades. Só de ser empresário no Brasil, ele já é um herói”, concluiu.

Frase

"O empresário brasileiro tem que ser criativo para superar as dificuldades. Só de ser empresário no Brasil, ele já é um herói”

Rodrigo Pacheco (DEM/MG), senador

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Obstáculo complexo

Luiz Calcagno

22/08/2019

 

 

Convidado para o segundo painel do Correio Debate, o deputado federal Alexis Fonteyne (Novo-SP) ressaltou a necessidade de o país adotar poucas alíquotas para reduzir as distorções do sistema tributário brasileiro. Segundo o parlamentar, existe uma série de empresários que falham no pagamento de impostos pela complexidade tributária do Brasil.

“Precisamos de poucas alíquotas. Planas. Como na Europa. O sistema tributário brasileiro tem distorções. É como se tivéssemos um para cada produto. A reforma tributária vai fazer essa simplificação”, destacou.

O parlamentar lembrou, ainda, que não se trata de desculpar sonegadores de impostos que atuam sistematicamente, fechando empresas e abrindo novas para repetir as ações criminosas. O objetivo, destacou, é dar segurança ao empresário para agir, sem ficar preso a diferentes interpretações.

“Esses que abrem e fecham empresas deixando para trás uma série de passivos, para mim, têm de ser presos. Só que ainda não existe esse tipo de punição no país. Não podemos ter um sistema tributário gerador de conflitos, que alimenta a Justiça com processos. As coisas têm que ser transparentes e claras”, disse.

Frase

"Esses que abrem e fecham empresas deixando para trás uma série de passivos, para mim, têm de ser presos. Só que ainda não existe esse tipo de punição no país”

Alexis Fonteyne (Novo-SP), deputado federal