Correio braziliense, n.20546, 24/08/2019. Política, p.2/3

 

Forças Armadas vão combater incêndios

Rodolfo Costa

Ingrid Soares

24/08/2019

 

 

Poder / Decreto assinado por Bolsonaro prevê que militares atuarão contra queimadas na Amazônia mediante solicitação dos governadores dos estados. Em pronunciamento na TV, presidente usa tom mais ameno ao rebater críticas de líderes europeus

Demoraram cerca de três semanas para o governo tomar alguma atitude mais enérgica para o combate às queimadas na região Amazônica. Mas, ontem, o Palácio do Planalto reagiu às críticas, no Brasil e no exterior, ao tratamento dado à questão do meio ambiente com a assinatura de decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) pelo presidente Jair Bolsonaro. Com a medida, está autorizado o envio das Forças Armadas para auxiliar as forças auxiliares de segurança pública na contenção dos focos de incêndio em todo o território da Amazônia Legal.

À noite, em pronunciamento em rede nacional de TV, o presidente reagiu às declarações de líderes estrangeiros ao governo brasileiro. Disse que “diversos países desenvolvidos” ainda não conseguiram avançar em “seus compromissos” no âmbito do Acordo de Paris, que trata de medidas para combater as mudanças climáticas. Afirmou, ainda, que a situação na Amazônia não “pode servir de pretexto para possíveis sanções internacionais”.

Enfrentando sua primeira grande crise, Bolsonaro abandonou, entretanto, o tom agressivo que vinha usando em declarações sobre o assunto. Não deixou de criticar, porém, o “uso político” que induz à “desinformação” ao se referir às notícias compartilhadas sobre a Amazônia, no Brasil e no exterior. E afirmou que o Brasil é “exemplo de sustentabilidade”. O país “conserva mais de 60% de sua vegetação nativa, possui uma lei ambiental moderna e um código florestal que deveria servir de modelo para o mundo”, destacou. O presidente relativizou a ocorrência de queimadas, observando que elas ocorrem todos os anos. “Nos anos mais chuvosos, as queimadas são menos intensas. Em anos mais quentes, como esse, ocorrem com maior frequência. De todo modo, mesmo que as queimadas deste ano estejam na média nos últimos 15 anos, não estamos satisfeitos com o que estamos vendo”, afirmou.

O Planalto considera que a preocupação manifestada mundo afora com a Amazônia esconde, em grande parte, uma ingerência externa à soberania do país. Essa visão foi encampada pelo comandante do Exército, Edson Leal Pujol. “Guerreiros astutos patrulham os 16 mil quilômetros da nossa faixa de fronteira terrestre, nossos rios, campos, montanhas e florestas, garantindo a soberania do país. Aos incautos que insistem em tutelar os desígnios da brasileira Amazônia, não se enganem! Os soldados do Exército de Caxias estarão sempre atentos e vigilantes, prontos para defender e repelir qualquer tipo de ameaça”, afirmou o general, em solenidade comemorativa do Dia do Soldado.

Regulamentação

O decreto assinado por Bolsonaro deixa expresso que os quadros das três Forças atuarão quando houver requisição dos estados. Por ora, integrantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica atuarão apenas no combate a incêndios em Roraima e Rondônia, por solicitações dos governadores Antônio Denarium (PSL) e Coronel Marcos Rocha (PSL), respectivamente. O decreto apenas regulamenta a atuação dos oficiais, que atuarão entre hoje a 24 de setembro.

A Constituição prevê, no entanto, que a GLO dá, provisoriamente, ao longo da validade do decreto, poder de polícia até o restabelecimento da normalidade. O decreto estabelece que os oficiais atuarão em ações preventivas e repressivas contra delitos ambientais e em levantamento e combate a focos de incêndio “nas áreas de fronteira, nas terras indígenas, nas unidades federais de conservação ambiental e em outras áreas dos estados da Amazônia Legal”.

O ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, será o responsável por definir a “alocação dos meios disponíveis e dos comandos que serão responsáveis pela operação”. O uso das Forças Armadas ocorrerá em articulação com os órgãos de segurança pública estaduais, “sob a coordenação dos comandos” e “as entidades públicas de proteção ambiental”.

Na prática, a GLO possibilitará um reforço aos estados amazônicos. A região tem a presença do Comando Militar da Amazônia (CMA), chefiado pelo general de Exército César Augusto Nardi de Souza. O batalhão é formado por seis Brigadas de Infantaria de Selva, além da 12ª Região Militar, em Manaus, o grande comando logístico-administrativo. Em Roraima, a tendência é de que as operações estejam localizadas na 1ª Brigada de Infantaria de Selva.

O Ministério da Justiça deve se engajar no combate às queimadas. O Correio apurou que a Força Nacional — subordinada à pasta — aguarda recursos de R$ 7 milhões para treinar um contingente de 180 homens que auxiliarão no combate aos incêndios. Os recursos poderão vir de uma medida tomada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que peticionou, ontem, no Supremo Tribunal Federal (STF), um pedido para que um montante de R$ 2,5 bilhões depositados pela Petrobras em conta vinculada à Justiça Federal seja destinado à educação e à Amazônia, a fim de combater a emergência ambiental na região.

Panelaço de volta

Durante o pronunciamento de quatro minutos e 40 segundos em rede nacional de rádio e TV na noite de ontem, o presidente Jair Bolsonaro teve que lidar pela primeira vez com o bater de panelas de manifestantes. Os chamados panelaços se tornaram comuns, como forma de protesto, no fim do governo Dilma Rousseff e também em pronunciamentos do ex-presidente Michel Temer. Os protestos ocorreram em várias cidades. Em Brasília, houve panelaços em Águas Claras, na Asa Sul e na Asa Norte.

“Mesmo que as queimadas deste ano estejam na média nos últimos 15 anos, não estamos satisfeitos com o que estamos vendo (na Amazônia)”

Jair Boslonaro, presidente da República

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Ibama contratará brigadistas

Luiz Calcagno

​24/08/2019

 

 

O governo federal autorizou a contratação de brigadas federais temporárias para o combate a incêndios em várias partes do país. Portaria assinada pelo presidente interino do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Luis Carlos Hiromi Nagao, estabelece que o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) fará as contratações. Segundo a texto, o órgão, ligado ao Ibama, atenderá a municípios de 17 estados e o Distrito Federal.

O Prevfogo já foi usado pela oposição para criticar o governo Bolsonaro. Na última quinta-feira, os senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e Fabiano Contarato (Rede-ES) e a deputada Joênia Wapichana foram ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedir o impeachment do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, entre outros motivos, por ter cortado, em maio, 50% dos recursos do centro de prevenção, uma soma de R$ 5,3 milhões, segundo Randolfe.

Segundo o texto da portaria, o ministério considera em estado de emergência ambiental “os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rondônia, Roraima e Tocantins”. O texto fundamenta a necessidade de contratação de brigadistas em levantamento de áreas críticas feito pelo Prevfogo, com base nas detecções de calor registradas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), cujo presidente, o físico Ricardo Magno Osório Galvão, foi demitido em 2 de agosto, após divulgação de dados sobre o aumento do desmatamento na Amazônia.

A portaria prevê a contratação de brigadistas para municípios como Amarante do Maranhão, Fernando Falcão e Montes Altos, no Maranhão; Sena Madureira e Brasileia, no Acre; Oiapoque e Tartarugalzinho, no Amapá; Porto Velho, Machadinho D’Oeste e Nova Mamoré, em Rondônia, Humaitá, no Amazonas; Amajari, Cantá, Normandia, Boa Vista, e Uiramutã, em Roraima; Alto Paraíso, Cavalcante, Minaçu e Teresina de Goiás, em Goiás, entre outros.

Acre

Ainda ontem, o governo do Acre decretou situação de emergência em todo o estado, devido à escassez de chuvas e o crescente número de focos de calor. De acordo com o governo, o atual período de seca deve se estender por mais três meses, causando a diminuição da umidade relativa do ar e do nível dos rios, o que potencializa os riscos de incêndios florestais. A situação também ameaça o sistema de abastecimento de água para a população, relata a Agência Brasil.

Historicamente, o maior número de focos de incêndios florestais ocorre durante agosto e setembro, mas os dados registrados desde o início do ano superam os verificados em 2010, 2016 e 2018, considerados os piores já enfrentados pelo estado. O decreto tem vigência de 180 dias. Durante esse período, o governo acriano pode adquirir, sem necessidade de licitação, os bens e serviços necessários ao controle da situação.