Correio braziliense, n.20550, 28/08/2019. Brasil, p.7

 

Moro busca protagonismo

Leonardo Cavalcanti

Augusto Fernandes

28/08/2019

 

 

Poder » Na berlinda desde que Bolsonaro acirrou os embates com a Polícia Federal, ministro da Justiça elogia o diretor-geral da corporação e é citado por Doria como um nome para a secretaria de São Paulo. Situação na Esplanada é desconfortável

Com seis dias de atraso, o ministro da Justiça, Sérgio Moro, decidiu elogiar publicamente o diretor-geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo. O gesto do ex-juiz pode ser visto como uma defesa do delegado, depois do episódio envolvendo Jair Bolsonaro, que sugeriu trocar o comando da corporação. A declaração do presidente, feita a partir de uma tuitada na quarta-feira passada, irritou a categoria por causa de interferência indevida do capitão reformado na PF.

Durante um seminário sobre desafios contra a corrupção, ontem, Moro decidiu elogiar o chefe da Polícia Federal. “Cumprimento especial ao diretor Maurício Valeixo, que tem feito um trabalho extraordinário à frente da Polícia Federal”, disse. No fim da semana passada, os delegados da Polícia Federal tentaram fazer uma barreira para proteger Valeixo das investidas do presidente, deixando evidente o enfraquecimento de Moro para tal missão.

Mesmo com atraso, a declaração do ministro em defesa de Valeixo foi bem avaliada entre os delegados da PF. “Moro mostrou ter estratégia, pois, talvez, se esse elogio tivesse sido feito na semana passada, o caldo poderia entornar de vez”, disse um delegado ouvido pelo Correio. O detalhe, entretanto, é que nada garante que Bolsonaro não volte à carga contra Valeixo, e por tabela, contra Moro, nos próximos dias. Explica-se: o método de ação de Bolsonaro é militarizado, mas sem uma sofisticação maior na estratégia. Isso significa que ele estabelece ataques direcionados. Com a questão ambiental em evidência — e a crise aberta com o presidente francês, Emmanuel Macron —, o brasileiro voltou as baterias para a região amazônica, esquecendo por um tempo a crise aberta com a PF. Isso não significa que não deva retomar o enfrentamento com Valeixo.

Moro reconheceu, ontem, tropeços do governo, sem especificar. “Claro que, às vezes, há alguns reveses, mas nós temos avançado no enfrentamento da corrupção.” Na sequência, o ministro aproveitou para elogiar o “compromisso” do governo “com prevenção e combate à corrupção”. “Esse foi um dos temas centrais que me levaram a aceitar esse convite (para ser ministro da Justiça e Segurança Pública), e eu creio que o governo tem avançado nessa área”, disse.

Horas depois, em uma rede social, ao publicar sobre duas operações da PF contra o tráfico de drogas em portos do país, o ministro voltou a apoiar a gestão do pesselista. “Polícia Federal nas ruas — de novo — Alba Vírus e The Wall, contra tráfico de toneladas de cocaína. Sequestro de imóveis de traficantes. US$ 4,5 milhões em espécie apreendidos. A política do governo do presidente Jair Bolsonaro é dura contra as drogas.”

São Paulo

Ontem, o governador de São Paulo, João Doria, fez um elogio público a Moro. Mesmo sem falar em convites para que o ex-juiz integre a equipe de secretários do estado, o tucano disse que possui “admiração e respeito” pelo ministro de Bolsonaro. “Quem não gostaria de ter?”, questionou Doria, ao ser perguntado sobre a possibilidade de Moro entrar na equipe. “Sérgio Moro foi um grande juiz e é um grande ministro”, disse o governador. “Não há convite, há admiração e respeito.”

Em meio ao desgaste do juiz com Bolsonaro, Doria tenta se mostrar um gestor mais capaz de administrar equipes, rasgando elogios ao principal nome da Lava-Jato. Mesmo em baixa em Brasília por causa dos vazamentos de mensagens dos integrantes da força-tarefa, Moro tem popularidade em alta, um trunfo para Doria. A tendência, neste momento, entretanto, é que ele permaneça no governo, até pelos riscos políticos de deixar o cargo.