Título: Obama entre a guerra e a paz
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 11/11/2012, Mundo, p. 24

Reeleito, o presidente norte-americano enfrentará desafios como mediar os conflitos envolvendo palestinos e israelenses, e consolidar a polêmica política de uso de aviões não tripulados em espaços aéreos estrangeiros

A conquista do segundo mandato pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, reacendeu as esperanças de vê-lo em um papel de liderança mundial que lhe valeram um Nobel da Paz em seu primeiro ano na Casa Branca. Nos últimos quatro anos, o presidente encerrou a controversa Guerra do Iraque, deu início à retirada do Afeganistão e matou o maior terrorista dos últimos tempos, Osama bin Laden. Mas a mudança de tática de seu governo, reduzindo tropas e expandindo o uso de aviões não tripulados, e as dificuldades em mediar um prometido acordo entre israelenses e palestinos encabeçam uma longa lista de desafios para os próximos quatro anos. Analistas consultados pelo Correio sugerem que, sem nenhuma reeleição pelo caminho, Obama estaria “mais livre” para agir. Mas tomados por desconfianças, eles ponderam que, avaliando a postura de Obama na primeira gestão, há poucos sinais de mudança drástica na condução da agenda internacional por Washington nos próximos anos.

Um dos primeiros testes do presidente será já no próximo dia 29, quando as Nações Unidas deverão votar o pedido da Autoridade Palestina para se tornar Estado observador. Dando continuidade a uma ação unilateral, o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmud Abbas, apresentou a requisição em setembro, na abertura da Assembleia Geral da ONU. Mas a votação ocorrerá somente agora porque Obama teria requisitado que ela fosse adiada para depois das eleições. Na quarta-feira, o negociador chefe da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), Saeb Erekat, felicitou o presidente e pediu seu apoio à proposição. Os palestinos já têm votos necessários para a medida, que não precisa ser levada ao Conselho de Segurança, mas esperam ter ao seu lado as principais potências do mundo, incluindo os EUA (Leia Para saber mais).

Essa seria uma questão que poderia ser mais bem trabalhada por Washington fora do contexto da reeleição, segundo o especialista em assuntos militares e estratégicos da Royal Military College e da Queens University, ambos no Canadá, Houchang Hassan-Yari. “Com as mãos livres, ele até poderia relançar o processo de paz”, disse, ponderando, logo em seguida, não acreditar nessa possibilidade, assim como o analista internacional da Fundação Getulio Vargas (FGV) Salem Nasser. “Há indicações de que não veremos mudanças radicais, especialmente nesses temas”, afirmou Nasser.

Tensão nuclear Mais urgentes, talvez, sejam as tensões entre Irã e Israel, que também envolvem os EUA. O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, tem pressionado a administração Obama a fim de fixar um prazo para uma solução pacífica na disputa nuclear com Teerã, defendendo uma ação militar contra o país persa. Nasser disse acreditar, porém, que, apesar da coação, o curso da política externa americana se manterá constante. “O plano é gradualmente enfraquecer e isolar o Irã com sanções e outras políticas até que o regime caia ou uma campanha militar possa ser empreendida”, afirmou o analista. As medidas punitivas impostas por Washington já causaram grande enfraquecimento à economia iraniana.

As tensões entre Irã e EUA, aliás, voltaram a se intensificar na última semana, depois que o Pentágono declarou que dois caças iranianos haviam atacado um avião não tripulado americano, conhecido como drone, no Golfo Pérsico. A informação foi confirmada pelo ministro da Defesa iraniano, Ahmad Vahidi, na sexta-feira, mas os EUA negam a invasão ao espaço iraniano.

Volta e meia o uso dos drones tem colocado os EUA em polêmicas, mas, para os analistas, ele não será abandonado. Washington argumenta que se trata de uma tática efetiva, por exemplo, na caçada a terroristas ligados à Al-Qaeda na fronteira do Afeganistão com o Paquistão. Isso porque são incisivas, reduzindo a morte de oficiais. Os EUA têm atribuído a captura e a morte de importantes terroristas ao uso dos drones, mas cresce a revolta na sociedade e até mesmo de governos locais por conta da grande quantidade de mortes de civis.

O custo do efeito colateral pelo uso desse tipo de avião, na avaliação de Hassan-Yari, é visto como baixo pelos EUA. “Se for destruído por um inimigo, tudo bem, porque não haverá a morte de militares”, disse. Mas a tática já causou grande descontentamento em Islamabad e abalou os laços com esse estratégico aliado dos EUA na região. Em retaliação às mortes de paquistaneses, o governo fechou, por exemplo, as rotas para passagem de suprimentos às tropas americanas no Afeganistão.

Apesar de não usar mais a expressão de seu predecessor, a “guerra ao terror” promovida por Obama, segundo Nasser, tem se mostrado bem-sucedida, uma vez que continua sem os vultosos custos militares de George W. Bush. “Penso que isso faça parte do talento de Obama para vender a imagem de um progressista”, avalia. Apesar das críticas de governos estrangeiros, a “política de assassinatos” com drones não está causando danos à imagem do democrata, por isso, deverá ser mantida, avalia Nasser.