Correio braziliense, n. 20552, 30/08/2019. Brasil, p. 5

 

Dúvidas sobre decreto que proíbe queimadas

Maria Eduarda Cardim

30/08/2019

 

 

Amazônia » Medida assinada pelo presidente Jair Bolsonaro suspende por 60 dias autorizações para limpeza de áreas rurais por meio do fogo. Especialistas questionam eficácia da iniciativa e apontam necessidade de fortalecer a fiscalização para coibir a ação de desmatadores ilegais

Uma semana após o início da crise ambiental da Amazônia motivada pelos incêndios na região, o presidente da República, Jair Bolsonaro, por meio do Decreto nº 9.992/2019, publicado ontem no Diário Oficial da União, proibiu por 60 dias a permissão para queimadas em áreas legais em todo o território nacional. O Ministério do Meio Ambiente informou que se trata de medida “excepcional e temporária”, que se soma às outras respostas aos incêndios.

De acordo com o texto publicado ontem, a suspensão da autorização “não se aplica a queimadas relacionadas a casos de controle fitossanitário, quando autorizadas pelo órgão ambiental competente, a práticas de prevenção e combate a incêndios e a práticas de agricultura de subsistência executadas pelas populações tradicionais e indígenas”.

As queimadas controladas estão previstas no Código Florestal desde 1998, quando um decreto assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso passou a regular o Código. De acordo com o decreto, a queimada controlada acontece quando há “o emprego do fogo como fator de produção e manejo em atividades agropastoris ou florestais, e para fins de pesquisa científica e tecnológica”. As áreas, que geralmente são queimadas propositalmente, têm limites físicos previamente definidos.

Desde a última semana, o governo anuncia medidas para combater o fogo na Floresta Amazônica. No entanto, especialistas na área questionam a eficácia imediata do decreto publicado ontem. Para pesquisadores, é necessário considerar o perfil das queimadas no período. “O que os dados estão mostrando é que as queimadas vêm de um processo ilegal de desmatamento, e o decreto em si afeta aqueles que fariam queimada de forma legal”, avaliou a professora do Departamento de Ecologia na Universidade de Brasília (UnB) Mercedes Bustamante.

Para Mercedes, é necessário que esse decreto venha acompanhado de uma mudança clara nos órgãos ambientais, que precisam ser fortalecidos, assim como a fiscalização. “Para que a gente tenha uma ação efetiva, e que o decreto não se torne inócuo, ele tem que vir acompanhado de outras sinalizações para mostrar que não haverá impunidade. Para quem não segue a lei, o que tem que ser melhorado é a fiscalização”, afirmou a professora.

O porta-voz do Instituto Socioambiental (ISA), Rodrigo Junqueira, concorda com a professora e afirma que será difícil ver um impacto imediato no terreno. “Quem queima sem licença não o respeitará”, disse. Além disso, Rodrigo acredita que a fiscalização não será mobilizada após o “desmonte do aparato ambiental” do governo. A afirmação faz referência às medidas que debilitaram as instituições encarregadas de monitorar o meio ambiente.

O decreto assinado ontem valerá até o fim de outubro, mês em que o período seco atinge o auge na região. Muitos pesquisadores dizem que a situação ainda pode piorar. “A seca na Região Amazônica vai avançar até setembro e outubro, e pode ser que ainda tenham mais queimadas. Se você não modifica a prática de desmatamento, isso pode piorar”, disse Mercedes.

Fabiana Alves, coordenadora do Projeto de Clima do Greenpeace Brasil, explicou que as principais emissões de gases do efeito estufa no Brasil são oriundas do desmatamento. “No mundo, 77% das emissões vêm de emissões de combustíveis fósseis. Os 23% restantes vêm de emissões de uso do solo. No Brasil, a situação é contrária. O Brasil precisa parar de desmatar e começar a usar terra de maneira sustentável”, afirmou.

Presos suspeitos de incendiar floresta

A Polícia Civil do Pará identificou três suspeitos de provocar queimadas em área de floresta nativa no sudeste do estado. Policiais cumpriram, ontem, mandados de busca e apreensão na casa dos suspeitos. Dois são irmãos e proprietários da fazenda Ouro Verde, em São Félix do Xingu, e o terceiro é gerente da propriedade. A fazenda fica dentro da Área de Proteção Ambiental Triunfo do Xingu. Os três vão responder por danos em área de proteção ambiental, poluição, queimadas e associação criminosa. Segundo o diretor de Polícia do Interior da Polícia Civil do Pará, delegado José Humberto Melo, as investigações mostram que o grupo já derrubou e tocou fogo em mais de 5 mil quilômetros de mata.

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Brigitte agradece a brasileiros

30/08/2019

 

 

A primeira-dama francesa, Brigitte Macron, agradeceu, ontem, aos brasileiros pela campanha #DesculpeBrigitte. Em português, ela disse “muito obrigada” e acrescentou “os tempos mudam. Alguns estão no trem da mudança, mas nem todos estão”.

A campanha, na internet, teve início devido a um comentário do presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais. Um seguidor do presidente fez uma postagem comparando as duas primeiras-damas, Michelle Bolsonaro, mulher de Bolsonaro, 27 anos mais jovem que ele, e Brigitte, 24 anos mais velha do que o presidente francês, Emmanuel Macron. “Entende agora por que Macron persegue Bolsonaro?”, dizia a legenda da postagem. Bolsonaro respondeu: “Não humilha cara. Kkkkkkk”.

Depois da repercussão do comentário, Emmanuel Macron afirmou que espera que os brasileiros “tenham um presidente que se comporte à altura” do cargo. Bolsonaro fez “comentários extraordinariamente desrespeitosos sobre minha esposa”, disse.

O comentário de Bolsonaro foi apagado na última terça-feira. De acordo com o porta-voz da Presidência, Octávio Rêgo Barros, isso foi feito para evitar “dupla interpretação”, já que, de acordo com Bolsonaro, não houve a intenção de ofensa à primeira-dama francesa.

A campanha #Desculpe Brigitte teve várias postagens no Twitter, inclusive da atriz Leandra Leal e do escritor Paulo Coelho. A imprensa francesa já havia noticiado no início da semana que Brigitte tinha ficado “emocionada” com a campanha.