O globo, n.31458, 23/09/2019. País, p. 13

 

A perda de poder dos Picciani após a Lava-Jato 

Juliana Castro 

23/09/2019

 

 

Por mais de uma década, as digitais da influência do ex-deputado estadual Jorge Picciani estavam por toda a parte na política do Rio. Até que, em 14 de novembro de 2017, ele foi preso pela Operação Lava-Jato enquanto ainda presidia a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Desde então, o império político construído por Picciani só fez ruir, e o único bunker que lhe restou foi o MDB fluminense, comandado, mesmo a contragosto de muitos pares, por um de seus filhos, o exdeputado federal Leonardo Picciani.

Após ser condenado, em março deste ano, a 21 anos de reclusão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa, Jorge Picciani pediu desfiliação do MDB. Queria passar a mensagem de que estava se retirando da política. Apesar disso, depois que saiu da prisão, ele recebeu políticos em casa, num condomínio de luxo da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, ainda que a família negue. Ele obteve o direito de cumprir prisão domiciliar, em 28 de março do ano passado, para cuidar da saúde, após um câncer na bexiga. Por exigência da Justiça, ele passa por perícias médicas quadrimestrais.

Picciani pode receber visitas em casa, desde que não sejam réus nos processos da Furna da Onça e da Cadeia Velha, duas operações que prenderam deputados estaduais. A maioria desses parlamentares segue presa. Apesar de Picciani ter recebido a visita de políticos, o cenário nem se compara à aglomeração que ficava às portas da sala da presidência da Alerj ou de seu escritório em outros tempos.

O ex-presidente da Alerj ficou 134 dias na Cadeia de Benfica, na Zona Norte do Rio, a mesma que já recebeu o ex-governador Sérgio Cabral. Esteve na cela ao lado do filho Felipe Picciani, preso na mesma operação, e de outros quatro detentos que nada tinham a ver com a Lava-Jato.

Com a prisão de Picciani, o deputado estadual André Ceciliano (PT) assumiu interinamente a presidência da Alerj e foi um dos que foi visitá-lo. Depois que venceu a eleição para o comando da Assembleia, o petista começou a mexer na estrutura da Casa. Deputados afirmam, entretanto, que não é fácil o movimento e que há indicados dos tempos de Picciani nas diretorias, mantidos ainda por conta de sua influência.

O deputado estadual Max Lemos (MDB) foi outro que visitou o ex-presidente da Alerj. O ex-prefeito de Queimados, na Baixada Fluminense, era tido como o principal interlocutor de Picciani com o mundo externo. Mas a relação entre eles azedou depois da eleição do ano passado, devido à baixa votação de Leonardo Picciani, que não conseguiu se reeleger, no reduto eleitoral de Lemos. Outro motivo de insatisfação é a negociação do deputado para migrar para o PDT e concorrer à prefeitura de Nova Iguaçu.

Outro a visitar o ex-presidente da Alerj foi o deputado federal Paulo Ramos (PDTRJ). Ambos conviveram como deputados estaduais no Legislativo fluminense.

COMANDO CONTESTADO

Em casa, Picciani passa os dias com a mulher e o filho de 2 anos. O segundo mais novo, de 4, também visita o pai, assim como Leonardo, Rafael e Felipe — este último, zootecnista, é o único dos três filhos do primeiro casamento do ex-presidente da Alerj que não fez carreira política.

Ex-deputado estadual, Rafael Picciani optou por não concorrer à reeleição para cuidar dos negócios da família. Sem conseguir um novo mandato, Leonardo acabou assumindo o comando da Agrobilara, de venda de gado, e de outras empresas da família, no lugar de Rafael, que continua ajudando. Picciani foi acusado de receber propinas da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio (Fetranspor) e de lavar o dinheiro por meio da Agrobilara.

Leonardo virou presidente estadual do MDB quando era ministro do Esporte no governo de Michel Temer. Emedebistas dizem que haverá uma nova debandada quando abrir a janela partidária, antes da eleição do ano que vem, por conta do desgaste do partido.

Houve um movimento para que o prefeito de Duque de Caxias, Washington Reis, assumisse a presidência do MDBRJ. Segundo integrantes do partido, ao vera articulação crescendo, Leonardo chamou Reis para conversar. Em troca, o prefeito de Caxias tem colocado aliados em diretórios municipais. Assim, se fortalece para ser o candidato do partido ao governo, como deseja.

— Se me der os nomes (de quem reclama da minha liderança), eu respondo. Caso contrário, fica difícil. Até agora, ninguém chegou a mim para falar nada —afirmou Leonardo.