O globo, n.31457, 22/09/2019. País, p. 05

 

Em campanha para a PGR, Aras visitou 74 senadores 

Paulo Celso Pereira 

Thiago Prado

22/09/2019

 

 

Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para comandar a Procuradoria-Geral da República (PGR), Augusto Aras fechou a semana passada consolidando seu apoio entre os senadores às vésperas da sabatina que enfrentará na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa na quarta-feira. Foram 74 parlamentares visitados em conversas individuais de cerca de 40 minutos — houve dia em que os encontros chegaram a um total de 17.

Apenas o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) se recusou a receber Aras. Cid Gomes (PDT-CE), Jader Barbalho (MDB-PA), Chico Rodrigues (DEM-RR), Styvenson Valentim (PodemosRN), Marcio Bittar (MDBAC) e Mara Gabrili (PSDBSP) devem fechar a lista de reuniões a partir de amanhã. Nas conversas com senadores, um Aras com opinião formada sobre vários temas tem se posicionado: enquanto avalia que a Lava-Jato cometeu excessos em alguns momentos, considera que a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, sobreo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ) deveria ter evitado a paralisação de investigações de lavagem de dinheiro em todo o país. Além disso, se por um lado diz aos senadores que é a favor da prisão após a condenação em segunda instância, por outro deverá sinalizar na sabatina que considerou inadequada a ação de busca e apreensão contra o líder do governo na Casa, Fernando Bezerra (MDB-PE). Reclamações sobre a atuação do Ministério Público (MP), aliás, são constantes. Em almoço com as bancadas de DEM, PSC e PL, Aras foi cobrado pela situação de prefeitos pelo Brasil. Segundo os senadores, eles dizem que o “MP não os deixa trabalhar” e que “toda hora aparece uma representação questionando medidas de prefeituras”. O procurador defendeu o “equilíbrio” na ação do MP.

SEM RECONDUÇÃO

Aras gostou do rótulo que lhe apresentaram recentemente dividindo o Ministério Público em dois grupos. O “nutella”, formado pelos jovens que se destacaram por meio da operação Lava-Jato; e o “raiz”, dos mais experientes, que ficaram de fora das últimas operações. Esses, “os de cabelo branco”, como costuma descrever, terão mais espaço na sua gestão. Ao menos duas pessoas já foram oficialmente chamadas por Aras nos últimos dias para compor o seu time na PGR. Um deles é o procurador Ailton Benedito, chefe da Procuradoria da República em Goiás, que é alinhado politicamente ao governo Bolsonaro. Outro nome, o subprocurador aposentado Eitel Santiago Pereira, confirmou em redes sociais que será o secretário-geral da gestão.

Na CCJ, Aras também quer acenar com a intenção de ficar apenas dois anos no comando da PGR. Sem reeleição, seu nome já vem entrando na lista de cotados no meio político para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Até o fim do mandato, Bolsonaro poderá indicar dois nomes para as vagas dos ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello. São cotados ainda o ministro da Justiça, Sergio Moro, o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, e o advogado-geral da União, André Mendonça.

PREVISÃO DE MARATONA

Aras prevê que a reunião da CCJ terá, no mínimo, seis horas de duração. Em assuntos mais delicados, o subprocurador pretende usar a estratégia de não emitir uma opinião específica, alegando que poderá ser obrigado a se manifestar em algum momento sobre o tema no STF. É o caso das mensagens divulgadas pelo site The Intercept Brasil que sugerem conluio entre Moro e o coordenador da Lava-Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol. Embora tenha apoiado uma escolha com base na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Dallagnol sinalizou nos últimos dias que agora endossa a indicação de Augusto Aras.

Nos encontros com senadores nos últimos dias, Aras também evitou entrar na pauta de costumes para não criar arestas com os senadores conservadores. Aborto, temas relevantes para as comunidades LGBT ou o uso medicinal da maconha são assuntos que o subprocurador não abordou e, quando provocado, só falou tangencialmente. A quem o questionou sobre essa aproximação com pautas evangélicas, ele tem dito que o Brasil é laico e que isso deve ser respeitado. Aras tem se declarado “cristão” sempre que questionado — o procurador é católico. Ele foi o único dos candidatos ao cargo de PGR a se comprometer com uma série de “valores cristãos” previstos em carta divulgada pela Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure). O documento expõe argumentos contra questões como aborto e reconhecimento de família, na esfera pública, composta por união de casal homossexual.