O globo, n.31454, 19/09/2019. País, p. 08

 

Pacote anticrime de Moro sofre mais derrotas 

Marco Grillo

19/09/2019

 

 

O grupo de trabalho que analisa, na Câmara dos Deputados, mudanças na legislação penal retirou do pacote anticrime apresentado pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, a previsão de que investigadores possam colocar câmeras em locais públicos sem autorização prévia da Justiça.

O colegiado impôs outra restrição ao tema: o ministro defende no projeto que, mesmo sem conhecimento do Ministério Público (MP) ou da polícia, uma conversa gravada por um interlocutor possa ser usada como prova em processos criminais, desde que a autenticidade da gravação seja comprovada. Os deputados acrescentaram que o instrumento só será válido como argumento de defesa, não de acusação.

Além disso, ao contrário do que Moro pretendia, o texto do grupo de trabalho faz uma ressalva de que as operações policiais disfarçadas para a implantação de escutas não poderão acontecer à noite, se o local da instalação for a casa do alvo.

INTEGRANTES DE FACÇÕES

Os deputados também retiraram do pacote a proibição de que condenados por integrarem organizações criminosas, como facções do crime organizado, tenham progressão de pena caso o vínculo com o bando permaneça na cadeia.

Como argumento, o deputado Marcelo Freixo (PSOLRJ), autor da emenda que mudou o texto, citou o exemplo do Rio, em que as próprias autoridades do sistema penitenciário alocam os presos nas unidades separando-os por facções.

— A chance de não estar vinculado a uma facção criminosa durante o cumprimento da pena é zero — disse Freixo.

O grupo de trabalho também alterou a previsão de que as visitas de advogados a presos detidos em penitenciárias de segurança máxima só aconteceriam mediante agendamento prévio com a direção da unidade. Também foi excluída a possibilidade de que as conversas entre os presos e seus defensores sejam gravadas, se autorizadas pela Justiça.

Moro defende a medida como uma forma de evitar que integrantes de facções criminosas transmitam ordens, via advogados, para os comparsas fora do presídio.

Relator do pacote anticrime, o deputado Capitão Augusto (PL-SP) reclamou da retirada.

— Querermos blindar (advogados que transmitem ordens de criminosos) por pressão corporativista, é demais —protestou ele.

Foram aprovadas novas regras para os presídios de segurança máxima, como recolhimento em celas individuais, visitas no máximo duas vezes por semana por meio virtual ou parlatório, banho de sol de até duas horas diárias, monitoramento de todos os meios de comunicação, inclusive cartas.

Também foi aprovada a proposta de que condenados por crimes dolosos sejam submetidos obrigatoriamente à identificação do perfil genético para compor o Banco Nacional de Perfis Genéticos. Foram restringidos, no entanto, o rol de crimes passíveis de colheita do material genético.

A proposta foi aprovada com uma emenda do deputado Orlando Silva (PCdoBSP), que retirou a possibilidade de colheita do DNA mesmo antes do trânsito em julgado do processo, quando ainda cabem recursos.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) prorrogou o grupo de trabalho até 12 outubro. Além do projeto de Moro, o colegiado avalia as propostas enviadas à Câmara pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), quando era ministro da Justiça do governo do ex presidente Michel Temer.

“JUIZ DE GARANTIA”

O grupo de trabalho deve se reunir novamente hoje para discutir a possibilidade de incluir a criação o “juiz de garantia”, responsável pelo controle da legalidade da investigação criminal.

Depois da divulgação de supostos diálogos de Moro com o coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, que, segundo críticos, apontariam parcialidade do então juiz, voltou a andar na Câmara uma proposta de distinguir o magistrado que instrui um processo criminal daquele que o sentencia.

O primeiro cuidaria exclusivamente do controle da legalidade de uma investigação, das prisões preventivas e das decisões sobre produção de provas. Um segundo juiz entraria em cena a partir da aceitação da denúncia do Ministério Público.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) tem uma posição contrária à separação das funções entre dois juízes por dois principais fatores. No Brasil, sempre um mesmo juiz conduziu a investigação e a sentença. E há uma questão estrutural: 40% das comarcas têm apenas um juiz. A Ajuf e, porém, se diz aberta a discutira questão .( Com G1)

Outros trechos já excluídos

> Prisão em segunda instância Formalização em lei da possibilidade de o réu ser preso depois de condenação em segunda instância, hoje permitida pelo Judiciário.

> Plea bargain

O grupo também barrou a criação da figura do “plea bargain” no direito brasileiro. O instituto permitiria que réus confessassem seus crimes em troca de uma pena menor.

> Ampliação de videoconferências

As situações em que o juiz seria autorizado a usar videoconferências para interrogar presos seriam ampliadas.