O globo, n.31454, 19/09/2019. Rio, p. 09

 

Cabo de guerra 

Paulo Cappelli

19/09/2019

 

 

O PSL de Jair Bolsonaro está dividido no Rio. A determinação do presidente estadual do partido, o senador Flávio Bolsonaro, para que deputados entreguem cargos em secretarias e órgãos e façam oposição ao governador Wilson Witzel tem sido contestada internamente. No cabo de guerra que se formou, de um lado estão os entusiastas da ordem de Flávio; do outro, os que tentam evitar a ruptura. O partido tem a maior bancada da Assembleia Legislativa, com 12 parlamentares.

Vice-líder do PSL na Câmara, o deputado federal Daniel Silveira criticou abertamente a determinação de Flávio para o partido desembarcar do governo Witzel:

— O presidente Jair Bolsonaro disse que não determinou nada. Flávio mantém. Eu sou 100% Jair. Oque ele disser, seguiremos. Achoque essa decisão específica do Flávio não foi acertada. Flávio está em um momento infeliz de pressão midiática. Acredito que agora é hora de resolver pautas — disse Silveira, que enviou mensagem ao grupo de deputados estaduais do PSL com uma recomendação: “Não rompam nada”.

Masa disposição do senador continua. Ontem, Flávio, que está em viagem oficial à China, divulgou uma nota informando que quem permanecer alinhado com o governo estadual deverá deixar o partido. Ele pretende recorrer à Justiça para tentar cassar o mandato dos desobedientes. “Nossa oposição não será ao Estado do Rio, mas ao projeto político escolhido pelo governador Wilson Witzel”, diz parte da nota.

Ocorre que mais da metade dos deputados do PSL atua nos bastidores para evitara ruptura com Witzel. Tanto que até agora nenhum dos dois secretários filiados ao partido deixou os cargos. Apesar da ordem de Flávio, deputados ainda não retiraram seus indicados para cargos na segurança pública e em órgãos como Detran e Instituto Estadual do Ambiente (Inea). Apenas o deputado Alexandre Knoploch deixou a vice-liderança do governo na Alerj.

‘NÃO ROMPAM NADA’

Ontem, um emissário de Bolsonaro procurou Witzel e reafirmou que a ordem de ruptura não partiu dele. Na segunda-feira, o presidente já havia usado uma rede social para contestar reportagem do GLOBO e dizer que não participou da decisão de rompimento. Aliados da família, porém, afirmam que Flávio baixou a determinação após uma ordem do pai, que se irritou com recentes declarações de Witzel, a quem vê como potencial adversário na eleição presidencial de 2022.

— Os deputados do PSL estão com medo de perder seus cargos. Eles se esquecem de que foram eleitos quando sequer tinham mandato, por causa do nome de Jair —criticou um aliado de Flávio.

Secretário de Ciência e Tecnologia, Leonardo Rodrigues disse anteontem que permaneceria no governo. Após a nota de Flávio ontem, ele foi mais cauteloso:

— Quero me encontrar com ele antes de tomar a decisão — disse o secretário, que é suplente de Flávio no Senado.

Líder do PSL na Alerj, Dr. Serginho minimiza a participação dos deputados do partido no governo Witzel. Ele disse desconhecer um levantamento do “RJ TV”, da Rede Globo, que mapeou 140 cargos que seriam ocupados pelo PSL:

— Será o desembarque mais rápido de todos. Não temos indicados.

Em agenda ontem, Witzel ignorou o PSL ao citar partidos aliados.

—Valorizo quem tem lado, quem tem palavra e cumpre com apalavra—disse.

No mesmo evento, ele também agradeceu ao senador Flávio Bolsonaro pelo apoio em liberação de verbas para o estado:

—Queria dizer ao Flávio que meu projeto político é o mesmo que o dele: governar bem o Rio, junto com o Congresso.

Procurado mais tarde, Witzel afirmou:

—As portas do Palácio Guanabara estão abertas para receber o Flávio Bolsonaro. Quando fora Brasília tratar de assuntos do Rio, vou procurar os senadores, inclusive ele.

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Uma jogada já de olho em 2020

Maiá Menezes 

19/09/2019

 

 

Aliado fundamental para a eleição do exjuiz Wilson Witzel para o Palácio Guanabara no ano passado, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) foi escolhido pelo pai para traçar o mapa político das eleições de 2020 país afora. O que 2018 uniu, o xadrez das eleições municipais já separou. Witzel, de posse da caneta e já com uma base aliada relativamente consolidada na Assembleia Legislativa do Rio, traça sua estratégia de olho em 2022 —ele é declaradamente aspirante ao Planalto. Tem conversado com o ex-adversário DEM, iniciando a costura de um antes improvável apoio a Eduardo Paes, que planeja voltar ao comando da prefeitura. Capitaneado pelo pastor Everaldo Dias, presidente nacional do seu partido, o PSC, já se tornou crítico severo do presidente Jair Bolsonaro.

Em resposta, Flávio também montou sua trincheira. O ultimato aos deputados do PSL da Alerj, na madrugada de quarta-feira, é parte da estratégia de construir um grupo político para fazer frente a Witzel no estado. Para a capital, o plano é uma candidatura puro-sangue, numa eleição municipal que, pela primeira vez, será regida pelas regras que impedem o financiamento privado das campanhas. Para a prefeitura, o presidente Bolsonaro já citou o deputado federal Hélio Lopes (PSL), conhecido como Hélio Negão, o mais votado nas últimas eleições. O nome mais forte por ora, no entanto, é o do deputado estadual Filippe Poubel.

Para garantir que terá força política, Flávio quer em sua trincheira os 12 deputados estaduais que seu partido elegeu, a maior bancada da Alerj. Tem como obstáculo o fato de que apenas três são apontados hoje como absolutamente fiéis ao partido, que pediu, e conseguiu, espaço no governo Witzel. Antes defensor da nova política, o governador tratou de dar cargos a aliados de campanha.

A jogada do filho do presidente indica que governo federal e estado entrarão com força na queda de braço pelo comando da política do Rio em 2020. Será a disputa por um comando que, por 20 anos, esteve nas mãos do MDB —agora quase todo preso após a tsunami causada pelas investigações da Operação Lava-Jato.