O globo, n.31454, 19/09/2019. Economia, p. 15

 

Independência 

Bruno Rosa 

Ramona Ordoñez 

19/09/2019

 

 

Dois dias após afirmar que estava acompanhando a variação do preço do petróleo no mercado internacional e que não faria ajuste de forma imediata nos preços dos combustíveis, a Petrobras informou ontem aseus clientes que vai aumentar o valor da gasolina em 3,5%, em média, e do diesel em 4,2% a partir de hoje. Com isso, a gasolina terá uma alta média de R$ 0,0596 em seu preço nas refinarias, e o diesel terá acréscimo de R$ 0,0916. A estatal não informou o valor final.

Para analistas, a decisão é um aforma de a estatal demonstrara independência de sua política de preços, corrigir valores que já estavam defasados e preservar o ambiente favorável aseu programa de venda de ativos, como refinarias.

O repasse para o consumidor depende da distribuição e dos postos de revenda. O aumento da Petrobras ocorre após o ataque a instalações de petróleo na Arábia Saudita, no último fim de semana, que afetou a produção da principal petroleira do país e provocou uma disparada da cotação do barril no mercado global no início da semana. A Arábia Saudita é o maior exportador da commodity, responsável por 10% da produção global.

2ª ALTA DO DIESEL EM 6 DIAS

A cotação do barril tipo Brent subiu 14% só nase gunda-feira, chegando aquase US $70. Depois, a cotação inverteu o movimento e fechou em queda de 6,5% na terça-feira. Ontem, encerrou o dia com recuo de 1,47%, cotado a US$ 63,60. Também houve impacto no mercado financeiro.

Em meio à crise, o presidente Jair Bolsonaro chegou a dizer na noite de segunda-feira, em entrevista à TV Record, que a Petrobras não iria ajustar preços. Ele contou ter conversado pouco antes com o presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, e informou que, “como é algo atípico, ele não deve mexer no preço do combustível”. A declaração de Bolsonaro, segundo fontes, causou desconforto na direção da Petrobras.

Em seguida, a estatal enviou comunicado ao mercado informando que “decidiu por acompanhar a variação do mercado nos próximos dias e não fazer um ajuste de forma imediata”. O texto ressaltou ainda que não há periodicidade predefinida de reajustes desde junho. Na terça-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que “petróleo quem resolve é a Petrobras”. Procurado ontem, o Palácio do Planalto disse que não comentaria o reajuste.

A última atualização do preço da gasolina ocorreu no dia 5 de setembro. Em agosto, foram três reajustes. No caso do diesel, sensível para os caminhoneiros, foram três aumentos desde o início de agosto, sendo o último na sexta-feira. A nova alta do diesel é a segunda em seis dias.

Para analistas, a decisão da Petrobras foi correta. Na opinião de Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a empresa mostra que sua direção tem liberdade em sua política de preços:

—A sensação é de que o aumento já estava decidido, mesmo o presidente Bolsonaro falando ou não sobre o assunto. A Petrobras agiu de forma serena, esperando passar alguns dias para ver qual seria o novo patamar de preços. Antes do ataque, o preço do petróleo estava inferior a US$ 60. Mesmo que esse aumento da estatal não cubra a defasagem, vai ajudar a recuperar parte das perdas.

DEFASAGEM DO INÍCIO DO ANO

Magda Chambriard, ex-diretora da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e consultora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que o alinhamento de preços coma cotação internacional do petróleo é fundamental para a companhia num momento em que está vendendo ativos não só de refino, mas também gasodutos:

—É importante mostrara independência. O controle de preços por parte do governo é mortal para investimentos nesse setor. Quem vai se interessar em comprar um gasoduto se sabe que o gás que passa por ele tem preço controlado pelo governo? É bom ser independente.

Segundo ela, os preços do petróleo têm se mantido relativamente altos desde o início do ano, entre US$ 60 e US$ 70. Edmar Almeida, do Instituto de Economia da UFRJ, também observa que a cotação global já estava em alta antes da crise saudita e a Petrobras acumulava certa defasagem:

— Por conta da tendência de alta do petróleo, ficou claro que os preços não vão cair.

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Cartão Caminhoneiro atrai mil motoristas em 3 meses 

Bruno Rosa 

19/09/2019

 

 

O Cartão Caminhoneiro — lançado em fase de testes no fim de maio e citado pelo presidente Jair Bolsonaro na última segunda-feira como uma forma de garantir o preço do diesel num momento de oscilação no mercado — tem até agora mil caminhoneiros cadastrados. O número corresponde a 0,17% dos 600 mil profissionais que fazem parte da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam). Como a categoria é pulverizada, o número de motoristas pode ser ainda maior. Segundo a BR Distribuidora, o cartão está funcionando em sistema de soft ope ni ng. De acordo coma companhia ,300 postos já aderiram e são responsáveis por 50% do volume de diesel rodoviário comercializado pela empresa, dona de 7.797 postos.

Internamente, a BR comemora a adesão, pois outros mil caminhoneiros já fizeram o pré-cadastro no site criado pela companhia, segundo uma fonte. Segundo um executivo do setor, outras distribuidoras de combustíveis já estão estudando a criação de um produto similar para funcionar em seus postos e, com isso, atrair a atenção dos caminhoneiros.

Na última segunda-feira, quando o petróleo disparou 14,61% ainda como reflexo ao ataque com drones a instalações da petrolífera Saudi Aramco, na Arábia Saudita, Bolsonaro classificou o evento como “atípico” e disse que o caminhoneiro, com o cartão, poderia “chegar no posto e comprar X litros de óleo diesel, e por 30 dias esse preço estará garantido para ele”.

‘CONDIÇÕES FINANCEIRAS’

Com o cartão, o caminhoneiro poderá transferir valores e fazer a conversão da quantia para litros de óleo diesel. Ele vai pagar a cotação do combustível do dia em que fez essa operação. Dessa forma, quando for abastecer, mesmo se houver reajuste, não será afetado. O crédito pode ser usado durante 30 dias.

De modo geral, o preço tende a ser mais vantajoso no cartão, pois o valor do litro é definido com base na média de preço de todos os postos do estado em que é feita a aquisição. Nesta semana, a BR iniciou campanha publicitária do produto, da agência Heads, estrelada pelo ator Jackson Antunes, com peças em TV, rádio e internet.

— Um grande desafio para que esse sistema funcione é dar condições financeiras para que os caminhoneiros consigam abastecer enquanto o valor do diesel está baixo, e utilizar o crédito quando achar necessário pelo valor anterior ao aumento—disse José da Fonseca Lopes, presidente da Abcam, que elogiou a ideia e disse que ela pode servir de incentivo para que outras distribuidoras lancem produtos similares.

Em maio do ano passado, os caminhoneiros fizeram uma greve contra a alta do diesel que causou uma crise de abastecimento no país. Neste ano, o governo decidiu suspendera tabela de fretes, mecanismo criado após a paralisação do ano passado, diante da insatisfação da categoria com os valores.