Correio braziliense, n. 20557, 04/09/2019. Cidades, p. 19

 

UnB ameaçada e sem dinheiro

Bruna Lima

04/09/2019

 

 

Ensino superior » Universidade corre sério risco de não ter como pagar as contas de água e de luz, por exemplo, devido ao contingenciamento de recursos adotado pelo MEC. “Chegamos ao limite”, afirma decana de Orçamento, Denise Imbroisi

A Universidade de Brasília (UnB) depende do desbloqueio, ainda em setembro, dos mais de R$ 48,5 milhões da verba federal para continuar funcionando. Mesmo após a liberação de 7% do recurso, na última segunda-feira, na prática, parte desse montante continua retido por falta de crédito. Enquanto a expectativa da colaboração do Ministério da Educação (MEC) para o fim do contingenciamento não se concretiza, a comunidade acadêmica vive um momento de incerteza e apreensão.

Como a maior parte do corte de 30% no repasse à UnB — previsto pela Lei Orçamentária de 2019 — afeta a área de manutenção, para poder garantir serviços como limpeza e vigilância e impedir que água e luz fossem cortados, a instituição precisou remanejar verbas de outras áreas. Com isso, houve drástica redução nos repasses as 27 unidades acadêmicas, além de suspensão na aquisição de livros, materiais institucionais e de laboratórios.

Nos laboratórios frequentados pela estudante de graduação de química Letícia Silveira, 39 anos, falta utensílios básicos para o desenvolvimento de pesquisas e projetos de iniciação científica. “Muitos laboratórios estão sem reagente, os anfiteatros sucateados. Isso, para nós, é catastrófico. Há cinco anos, quando entrei, tínhamos uma universidade que sobrevivia a muito custo e agora está ficando cada vez mais impossível”, reclama Letícia.

A graduanda pretendia avançar na carreira acadêmica, mas com a atual situação, vê o sonho cada vez mais distante. “Nem me iludo, as bolsas estão sendo cortadas. Quem tem condição, está indo para fora do país, pois não querem ficar em um local em que desprezam o desenvolvimento do conhecimento”, diz Letícia.

Além do bloqueio do MEC, outros cortes, por parte do Ministério da Ciência e Tecnologia e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), resultaram na suspensão de bolsas de pós-graduação e de pesquisas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Remanejamento

Para que a conta feche, a decana de Planejamento, Orçamento e Avaliação Institucional, Denise Imbroisi, não vê outra saída senão a liberação dos R$ 48,5 milhões até o fim do mês. “Estamos fazendo uma verdadeira ginástica orçamentária, trabalhando com datas de vencimento e postergando pagamento de recursos, avaliando, inclusive, a necessidade de se pagar multas. Chegamos ao limite e contamos a compreensão do governo. Não há mais condições de nos mantermos sem o dinheiro cujo uso já é planejado desde o ano anterior”, afirma.

O esforço da equipe está em não deixar com que a universidade decline, diz Denise Imbroisi. “Nosso objetivo é manter o ensino e pesquisa de excelência e nossa obrigação como servidores é colocar todo o empenho para que isso aconteça. Há todo um esforço de sensibilização para mostrar a importância que se tem a academia bem qualificada para a construção do futuro”.

As articulações para manter serviços básicos da UnB em funcionamento são notadas pela caloura do curso de ciências contábeis Ana Carolina Lima, 19 anos. “A impressão que nós tínhamos antes de as aulas começarem é de que a UnB não funcionaria neste semestre. Vejo a força de vontade dos professores em se virarem e não deixarem cair a qualidade de ensino. Sabemos que o prejuízo maior são nas iniciações científicas e isso nos deixa com um sentimento de incerteza. Espero que os governantes acordem para isso”, opina a estudante.

A Universidade de Brasília está no 15º lugar entre as instituições de ensino superior da América Latina, de acordo o Times Higher Education (THE). Em 2018, ingressou pela primeira vez nos rankings das melhores universidades criadas entre os anos de 1945 e 1966 e também dos países emergentes.