O globo, n.31447, 12/09/2019. País, p. 04

 

Pressão que abre o caixa 

Manoel Ventura

12/09/2019

 

 

Em um aceno ao Congresso, o governo avalia aumentar o fundo eleitoral para o próximo ano. O dinheiro, destinado a campanhas de candidatos a vereador e prefeito nas eleições municipais de 2020, deve subir de R$ 1,87 bilhão e poderá atingir até R$ 3,7 bilhões. Esse é o valor pleiteado por líderes partidários, que se articulam para aumentar o tamanho do fundo previsto para o Orçamento do ano que vem. O montante final ainda não foi fechado.

A mudança no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2020, que já foi elaborado pelo Ministério da Economia, seria feita por meio de uma mensagem modificativa, encaminhada pelo próprio Executivo ao Congresso, segundo fontes. O governo, que havia proposto inicialmente R$ 2,5 bilhões, já admitiu erro nas contas do fundo, o que reduziria o valor para R$ 1,87 bilhão. A pressão política, porém, fez o Executivo mudar de posição e a ideia agora é ampliar os recursos para as campanhas municipais.

Para conseguir aumentar o fundo, o Ministério da Economia terá que indicar corte de outras despesas, uma vez que o Orçamento do próximo ano está pressionado pelo teto de gastos. Essa regra limita o crescimento de despesas da União e estrangulou o caixa do governo federal em 2020. Com o crescimento das despesas obrigatórias, como aposentadorias e salários de servidores, a equipe econômica tem menos espaço para outros gastos.

A discussão sobre o valor destinado para o financiamento da campanha eleitoral deve ganhar mais força no fim do ano, quando a proposta orçamentária será votada pela Comissão Mista de Orçamento (CMO) e pelo plenário do Congresso Nacional. O relator do projeto, deputado Domingos Neto (PSD-CE), disse que a definição sobre o tamanho do fundo eleitoral será uma questão de todas as legendas:

— A questão do fundo eleitoral é uma decisão pluripartidária e de governo. Essa vai ser uma matéria que vai precisar ter convergência. A intenção é que seja por consenso.

Domingos Neto espera que o governo encaminhe um pacote de corte de gastos obrigatórios. Com a redução dessas despesas, será possível liberar mais espaço para outros gastos, como investimentos e manutenção da máquina pública, além do fundo eleitoral. A previsão é que esses valores atinjam a mínima histórica de R$ 89,1 bilhões no próximo ano.

O projeto do Orçamento enviado pelo governo para 2020 prevê R$ 2,5 bilhões para o financiamento da campanha de vereadores e prefeitos. Em 2018, foi pago R$ 1,7 bilhão para esse mesmo fim. Após ser criticado nas redes sociais pelo aumento de 48%, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que apenas cumpriu a determinação da lei, enviando ao Congresso o valor mínimo, estipulado em um ofício pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Em seguida, o governo admitiu que houve um erro de cálculo, e que o valor do fundo seria reduzido para R$ 1,87 bilhão. Agora, no entanto, deve ceder à pressão da maioria do Congresso. A maior parte da base bolsonarista, porém, é contra aumentar esses recursos, e deputados do PSL já declararam que pretendem tentar derrubar medidas nessa direção.

A articulação para aumentar o fundo eleitoral é conduzida principalmente pelo centrão. Esses deputados tentaram aumentar o fundo já na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), mas desistiram. A LDO estabelece as bases para o Orçamento e ainda não foi votada pelo plenário do Congresso.

APAGÃO

O plenário da Câmara ficou sem luz por uma hora na tarde de ontem. A energia caiu enquanto era promovida uma audiência pública sobre agricultura familiar. A Casa mantém com geradores, mas a audiência pública foi encerrada. Segundo a Câmara, a causa do problema foi o suprimento de energia da Companhia Energética de Brasília (CEB).

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Câmara articula ampliação do foro privilegiado

Natália Portinari

12/09/2019

 

 

Líderes da Câmara articulam uma proposta para proibir que juízes de primeira instância determinem a prisão, busca e apreensão de bens e quebra de sigilo de autoridades. Por este modelo, os processos continuariam na primeira instância, mas os juízes não poderiam determinar essas medidas cautelares.

O texto deve ser inserido em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) já aprovada no Senado, que restringe o foro privilegiado a apenas cinco autoridades: presidente e vice-presidente da República, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidentes da Câmara e do Senado.

Para submeter essa PEC à votação, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), fez um acordo para inserir a emenda que blinda não só políticos, mas também desembargadores e ministros dessas medidas na primeira instância.

O presidente da Câmara nega se tratar de uma mudança no foro privilegiado:

— Não está mudando foro nenhum. A investigação continua na primeira instância. Quem julga é a primeira instância. O que está se tentando negociar é que as cautelares fiquem na instância anterior do agente público —disse Maia.

O STF restringiu o foro privilegiado de parlamentares no ano passado, determinando que o benefício se aplica apenas a crimes cometidos no exercício do cargo e em “razão das funções a ele relacionadas”. Antes disso, casos que envolviam parlamentares eram automaticamente julgados na Corte.

—Não pode ter influência emocional na decisão de um juiz. O caso do Garotinho (ex-governador do Rio, preso na semana passada) é um caso claro de influência política. Não havia motivo para mais aquela prisão. Esse tipo de emoção na decisão é que gera um debate sobre se as cautelares devem ficar na primeira instância —disse o presidente da Câmara.

A aprovação da PEC pelo Senado foi uma reação para evitar que o foro privilegiado acabasse só para políticos, após a decisão do STF. Da forma como foi aprovada, porém, a proposta acabou engavetada na Câmara.

O deputado Luiz Flávio Gomes (PSB-SP) ficou encarregado de elaborar um texto para a emenda, que deve ser encaminhada à votação apenas no mês que vem. O líder do Podemos, José Nelto (GO), esteve na reunião em que se chegou ao acordo sobre a proposta e disse que foi uma concessão para conseguir aprovar a PEC na Câmara:

—Achamos um meio-termo, através de cautelar, para não permitir que um juiz de primeiro grau possa pedir a prisão de qualquer autoridade. Foi o caminho jurídico que achamos para aprovar essa matéria, já significa um avanço. Se dependesse da minha vontade, seria aprovado como veio do Senado.