O globo, n.31447, 12/09/2019. País, p. 06

 

MP investiga se Carlos usou assessores fantasmas

Juliana Dal Piva

Juliana Castro

Chico Otavio

12/09/2019

 

 

O Ministério Público do Rio abriu dois procedimentos para investigar denúncias de uso de funcionários fantasmas e a eventual prática de “rachadinha”, como é conhecida a devolução de salários, no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). As investigações foram abertas com base em reportagem publicada pela revista Época em junho. A matéria mostrou que Carlos empregou sete parentes de Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro e sua madrasta. Dois admitiram à reportagem que nunca trabalharam para o vereador, embora estivessem nomeados. O MP ainda apura suspeitas de que outros três profissionais nunca deram expediente na Câmara.

A partir de um pedido com base na Lei de Acesso à Informação, o MP confirmou os dois procedimentos, mas informou que ambos tramitam sob segredo de Justiça. A investigação criminal está a cargo do procurador-geral de Justiça, Eduardo Gussem, com apoio do Grupo de Atribuição Originária Criminal (Gaocrim). Já na esfera cível, na qual se apura eventual improbidade administrativa, a investigação ocorre na 8ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Defesa da Cidadania da Capital.

SEM CRACHÁ

Um dos principais alvos da investigação é ocaso de Marta Valle, professora de educação infantil e cunhada de Ana Cristina Valle. Moradora de Juiz de Fora (MG), ela passou sete anos e quatro meses lotada no gabinete, entre novembro de 2001 e março de 2009. Procurada pela revista Época, Marta disse que nunca trabalhou para Carlos. “Não fui eu, não. A família de meu marido, que é Valle, que trabalhou”. O salário bruto de Marta Valle, com os auxílios, chegava a R$ 17 mil. Segundo a Câmara de Vereadores, ela não teve crachá como assessora.

Outro caso descoberto pela reportagem foi Gilmar Marques, ex-cunhado de Ana Cristina Valle e morador de Rio Pomba (MG). Seu salário bruto somava R$ 14 mil, com auxílios. Questionado se atuou no gabinete de Carlos, Gilmar não se recordava da nomeação. Ele também nunca teve identificação funcional da Câmara do Rio.

A situação se repetiu em relação ao advogado Guilherme Henrique de Siqueira Hudson, que constou como assessor-chefe do vereador durante dez anos, até janeiro de 2018. Guilherme é primo de Ana Cristina Valle e jamais teve crachá. Desde 2012, tem residência fixa em Resende, onde casou e abriu um escritório de advocacia e uma loja de decoração.

No período em que Hudson foi relacionado como assessor-chefe, sua mulher, Ananda Hudson, foi nomeada no gabinete para ocupar o cargo e salário deixados por Marta Valle, quando ela foi exonerada, em março de 2009. como assessora até agosto de 2010. No mesmo período, porém, cursava Letras em Resende.

Depois que Ananda Hudson saiu, o cargo dela foi repassado a Monique Hudson, cunhada de Guilherme, até dezembro de 2014. Nesse período, Monique também cursou Letras na mesma faculdade de Ananda e nunca teve crachá da Câmara. Ela mantém residência fixa em Resende há pelo menos duas décadas.

A investigação inclui ainda Andrea Siqueira Valle, irmã de Ana Cristina. Ela constou como servidora de Carlos entre 2006 e 2008. Fisiculturista, ela também foi nomeada nos gabinetes de Jair e de Flávio. Fora as listas de frequência entregues pelos próprios parlamentares, não há registro do trabalho dela. Andrea também não teve crachá.

Procurado, Carlos Bolsonaro não se manifestou. A reportagem não teve retorno de Marta, Gilmar, Guilherme, Ananda e Monique.