Título: Muitas críticas, baixa execução orçamentária
Autor: Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 15/11/2012, Política, p. 3

Executivo gasta apenas 28% dos recursos disponíveis, apesar do caos no sistema prisional. Ministro ressalta violação constante dos direitos humanos

O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, voltou a falar ontem sobre os problemas “inaceitáveis” dos presídios brasileiros e reafirmou que cumprir sentença em alguns deles é pior do que a pena de morte. “Falei que a pena de morte não era a solução (na terça-feira). Falei que em alguns presídios as penas podem ser mais duras do que a pena de morte. Eu próprio, num presídio desse, com minha dignidade violentada, sem tratamento digno, acharia a pena de morte mais branda”, afirmou, na tarde de ontem, durante videoconferência, via tablet — Cardozo cumpria agenda no Peru.

Para diminuir o deficit prisional atual do país, que está em pouco mais de 200 mil vagas, o governo pretende criar 60 mil até 2014. Hoje, a população carcerária ultrapassa os 500 mil. O objetivo é resolver o problema nos centros de detenção femininos e reduzir o número de presos em delegacias, transferindo-os para cadeias públicas. A previsão de investimentos é de R$ 1,1 bilhão. O problema é que a burocracia das administrações federal e estaduais, admitida pelo próprio ministro, não acompanha as intenções governamentais. Apenas nos últimos três anos, o Ministério da Justiça deixou de desembolsar R$ 673 milhões do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). O dinheiro é usado na construção, na modernização e na manutenção de presídios.

Nos últimos três anos, o governo tinha quase R$ 1 bilhão para aplicar nessas ações. Porém, investiu apenas R$ 284 milhões (28% do total), de acordo com dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi). O ministro reconhece que as estruturas administrativas da pasta e dos governos estaduais, que devem apresentar os projetos de construção dos estabelecimentos penais, não atendem as necessidades.

“Há casos em que as empresas vencedoras das licitações têm custos questionados pelos tribunais de contas e, às vezes, os próprios estados esbarram em dificuldades para encontrar terrenos. Isso tudo resulta em demora, mas estamos muito mais rápidos do que no passado. Um presídio levava sete anos para ficar pronto algumas vezes”, afirmou, sem, no entanto, precisar a média de tempo das obras atualmente. Ele não atribui a lentidão nos investimentos em presídios ao contingenciamento imposto pela área econômica do governo, que atinge o ministério.

Reincidência O ministro disse que há estabelecimentos penais onde os presos são violentados diariamente, convivem com fezes e sem espaço para dormir. “A violação aos direitos humanos é absolutamente inaceitável e não há reinserção social. Não é verdade que prender alguém resolve o problema, pois, nessas condições, ele voltará a cometer crimes. Algumas organizações criminosas que atuam em estados brasileiros têm comando e origem na penitenciária.”

Cardozo também negou que a declaração sobre a situação dos presídios brasileiros tenha relação com as condenações impostas pelos ministros do Supremo Tribunal Federal no julgamento do mensalão a petistas. Ele afirmou que fala sobre os problemas nas penitenciárias desde a época em que era deputado federal. “Não é possível continuar mais nessa situação.”

Em defesa do colega A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, defendeu ontem o titular da Justiça, José Eduardo Cardozo. Ela afirmou que a declaração de Cardozo é contundente, sincera e que ele se expressou com base no seu conhecimento do sistema prisional do país. “Não queremos tapar o sol com a peneira”, disse — a mesma frase foi usada pelo ministro em entrevista coletiva na tarde de ontem. “Queremos enfrentar a dura realidade das cadeias trabalhando de forma firme para mudar essa realidade”, completou Maria do Rosário.