Título: Santa Catarina teme onda de criminalidade
Autor: Chaib, Julia
Fonte: Correio Braziliense, 15/11/2012, Brasil, p. 10

Sequencia de pelo menos 26 ataques desde segunda-feira assusta a população do estado. Ordens teriam partido de criminosos em penitenciária

A onda de violência que assusta a população de São Paulo parece ter se alastrado para outro local do país: Santa Catarina. Entre a tarde de segunda-feira e a noite de ontem, o estado foi alvo de pelo menos 26 ataques criminosos. Sete ônibus e cinco carros particulares foram incendiados e uma base da Polícia Militar e presídios, alvos de tiros em Florianópolis, Criciúma, Itajaí Palhoça, Blumenau, Camboriú e Navegantes. Não há vítimas. Em resposta a criminalidade, a Secretaria de Segurança Pública do estado apreendeu 23 suspeitos de terem participado das ações, sendo 12 adolescentes. Os ataques também levaram a Polícia Militar a escoltar ônibus e reforçar a segurança em diversas linhas da Grande Florianópolis e Blumenau.

A Polícia Civil de Santa Catarina trabalha com diversas hipóteses para explicar o surto de violência. Uma delas indica a existência de um grupo de presidiários que mantém contato com o exterior e coordenou os ataques. “Não podemos dar mais detalhes para não atrapalhar as investigações”, informou o delegado-geral, Aldo Pinheiro. Ainda ontem, o governador do estado, Raimundo Colombo, anunciou o afastamento de Carlos Alves, diretor da Penitenciária São Pedro de Alcântara, de onde teriam partido as ordens para os ataques nas seis cidades catarinenses.

Segundo Colombo, Alves pediu licença de 30 dias por razões pessoais. A mulher do diretor, a agente prisional Deise Fernanda Melo Pereira, foi assassinada em 27 de outubro ao chegar em casa. Entretanto, o responsável pelo penitenciária responde a uma sindicância da Secretaria de Justiça e Cidadania sobre possíveis abusos cometidos durante uma rebelião no dia 7. A suposta violência pode ter desencadeado represálias por parte dos presos.

Para o professor de sociologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos em Políticas Públicas, Erni José Seibel, os ataques podem ter relação com a migração de gangues de outros estados. “Membros de grupos organizados de São Paulo e Rio de Janeiro vêm para o Sul para se esconder e fazer conexão com criminosos locais. Dentro dos presídios, há membros de facções. O formato da violência que ocorre atualmente em Santa Catarina é semelhante ao observado em São Paulo. Mesmo que não haja relação direta, sempre passa pelo imaginário das pessoas que pode haver ligação entre os casos e que a violência pode aumentar.”

Risco O comandante da Polícia Militar de Santa Catarina, Coronel Nazareno Marcineiro, disse que a situação dos policiais no estado é de “muito risco”. “É da natureza do trabalho da polícia a existência do risco permanente, mas neste momento isso está um pouco ampliado por causa do histórico recente desses ataques.” Marcineiro enviou nota aos policiais pedindo que eles tenham maior cuidado com a própria segurança e dos familiares. O Secretário de Segurança Pública do estado, César Augusto Grubba, garantiu que todas as informações sobre possíveis ameaças estão sendo apuradas.

Para o professor da UFSC Erni Seibel, é hora de o Estado reconhecer a atuação do crime organizado não apenas em escala estadual, mas nacional. “As facções devem ser combatidas não só com ação policial. Ela sozinha não está tendo resposta. Deve haver ações de inteligência e aperto financeiro. O Banco Central deve fazer o rastreamento financeiro dessas gangues, no sentido de diminuir ou paralisar as movimentações.”

Choque em usuários de crack O Ministério da Justiça distribuirá a policiais armas de choque e spray de pimenta nas ações de combate ao crack. De acordo com o ministro da pasta, José Eduardo Cardozo, é preferível que os agentes tenham armas não letais em casos de confrontos eventuais. A medida, porém, é polêmica. Para o presidente da Associação Brasileira de Estudos do Álcool e outras Drogas (Abead), Joaquim Ferreira de Melo Neto, apesar de não serem letais, em usuários de drogas — que geralmente estão fracos, debilitados e se alimentam mal — o choque pode causar uma morte sem justificativa. “Em uma situação totalmente específica e não necessariamente com usuários de crack. O uso dessas armas pode até ser recomendado para policiais bem treinados e com moderação, mas, de forma geral, existem maneiras mais pacíficas e seguras.”