Título: Hoje desafeto, ministro recebeu apoio do PT
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 22/11/2012, Política, p. 4

Nove anos após a sigla interceder a favor da nomeação para o STF, Barbosa se tornou persona non grata no partido

Brasília, 2003. Um jantar com o chefe da Casa Civil, José Dirceu; uma boa avaliação curricular feita pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos; uma defesa convincente por parte do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Sepúlveda Pertence; e uma conversa particular no gabinete presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto. Essa sucessão de eventos ao longo de 2003 selou a indicação de Joaquim Barbosa, em junho daquele ano, ao cargo de ministro do Supremo. Quase uma década depois, Barbosa condenou Dirceu a 10 anos e 10 meses de prisão — além de um cliente defendido por Márcio Thomaz Bastos no julgamento do mensalão — e despertou a antipatia do ex-presidente da República.

Quando Lula venceu a eleição presidencial, em outubro de 2002, começou a pensar nos perfis que indicaria para o STF. Chamou os especialistas mais próximos para que procurassem alternativas. Um dos desejos do presidente era indicar um negro para a principal Corte do país, dentro do espírito que permeou o governo do petista, de tornar o país socialmente mais igualitário.

O nome de Barbosa começou a ganhar força. Ele jogava futebol com integrantes do PT e de outros partidos de esquerda. Costumava ser bom de bola, mas as dores nas costas o afastaram definitivamente dos gramados. Nunca foi um militante explícito do socialismo, mas era visto como uma boa opção por seu perfil progressista — um simpatizante das causas que o PT pretendia implantar no futuro governo.

Barbosa disputava a vaga com outros candidatos — entre eles, um secretário de assuntos jurídicos do governo de Celso Pitta em São Paulo —, mas o destacado currículo de Barbosa pesou na indicação. Com passagens pela Alemanha e pelos Estados Unidos, o futuro ministro tinha feito uma tese bastante consistente sobre o STF, o que indicava que ele tinha interesse pela Suprema Corte. "Como o sistema de nomeação é feito por indicação do presidente, os interessados precisam vender seu peixe pelos gabinetes de Brasília", confirmou um jurista acostumado a acompanhar esse tipo de processo.

Peregrinação Ciente da simpatia que seu nome exercia na cúpula do poder em Brasília, Barbosa começou a esforçar-se para ser conhecido pessoalmente. Procurou primeiro parlamentares petistas que tinham proximidade com Lula. Nessas conversas, segundo apurou o Correio, realçava o desejo de se tornar ministro, e destacava os principais pontos de seu currículo. Originário do Ministério Público, mas com serviços prestados em autarquias e órgãos ligados ao Ministério da Saúde, Barbosa demonstrou disposição para tornar-se ministro do STF.

Mesmo sendo Thomaz Bastos o responsável pela triagem dos currículos, Barbosa sabia que, para conseguir a vaga, precisava do aval do então todo-poderoso José Dirceu. Pediu a um interlocutor em comum que marcasse um encontro, que ocorreu em um restaurante em Brasília. Uma conversa formal, protocolar. Barbosa apenas destacou que gostaria de ser indicado e que tinha currículo para isso. Na ocasião, não prometeu nada em troca ao então ministro da Casa Civil. Nem mesmo fidelidade àqueles que encampariam a indicação do primeiro negro para o principal tribunal brasileiro.

Pluralidade Ao ser eleito presidente em 2002, Lula sabia que seria um dos presidentes com mais liberdade para indicar ministros para o Supremo. Além do desejo de buscar nomes afinados com as teses que defenderia ao longo dos oito anos de gestão, ele traçou, de início, quatro perfis a serem preenchidos nas vagas: um negro, uma mulher, um integrante da magistratura paulista e outro da Região Nordeste. Com isso, chegaram à principal Corte brasileira Joaquim Barbosa; Cármem Lúcia; Ricardo Lewandvoski (que, apesar de carioca, fez carreira no Judiciário de São Paulo); e Carlos Ayres Britto.