O globo, n.31634, 17/03/2020. Economia, p. 21

 

Pacote de socorro

Manoel Ventura 

Marcello Côrrea

Gabriel Shinohara

Henrique Gomes Batista

17/03/2020

 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, anunciou o primeiro pacote para combater os efeitos do coronavírus, que irá injeta rR $147,3 bilhões na economia em três meses. As 14 medidasenvolvemproteçãoaosvulneráveis,manutenção do emprego e combate ao vírus. Ao menos cinco delas têm que passar pelo Congresso, e outras já haviam sido anunciadas na semana passada. Há pouco dinheiro novo: a maior parte da quantia virá da antecipação de transferência de recursos ou de atraso no pagamento de impostos.

Dias depois de as principais potências econômicas começarem a definir ações para reduzir os impactos do coronavírus, o governo brasileiro anunciou um pacote de socorro de R$ 147,3 bilhões três meses. O próprio ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que se trata de um primeiro conjunto de iniciativa seque outras poderão ser adotadas caso necessárias. Com o argumento de que falta espaço fiscal para liberar recursos, o pacote traz pouco dinheiro novo e inclui ações que já tinham sido anunciadas na última sexta-feira. De modo geral, a maior parte é antecipação de dinheiro ou atraso no pagamento de impostos.

Entre as medidas do pacote de Guedes estão a liberação de saques do FGTS, a antecipação de todo o 13º do INSS, e a suspensão por três meses do pagamento de alguns impostos. Também haverá a destinação de mais recursos para o combate à pandemia, além dos R$ 5 bilhões que já foram disponibilizados para a saúde.

Das 14 medidas anunciadas, ao menos cinco dependem do Congresso para serem viabilizadas. O plano do governo é encaminhar as propostas ainda nesta semana, já que o Parlamento pode reduzir o ritmo de trabalho por causa da disseminação do coronavírus.

Ao apresentar o pacote, o ministro afirmou que o Brasil precisará encontrar um meio-termo entre a prevenção à disseminação do coronavírus e o impacto sobre a atividade econômica. Segundo Guedes, se toda a população parar, o Produto Interno Bruto (PIB) “colapsa”.

— Se ficar todo mundo em casa, o produto colapsa. Se ficar todo mundo na rua, a velocidade de con tá gioé muito rápida e você atinge o sistema de saúde. Então, deve ter um meio termo —disse.

Segundo Guedes, a economia brasileira será capaz de se recuperar após a pandemia:

—O vírus é temporário, já está descendo na China.

As medidas foram divididas em três grandes grupos. Serão até R$ 83,4 bilhões para a população mais vulnerável, como idosos; mais R$ 59,4 bilhões para proteger empregos; além da destinação demais R$ 4,5 bilhões para o combate à pandemia da Covid-19.

NOVO SAQUE DO FGTS

Par aos idosos, a principal medidaéaantecip açã odas egundap arcela do13º de aposentados e pensionistas do INSS, com impacto de R$ 23 bilhões. O valor normalmente é pago em dezembro e, agora, será depositado em maio.

Além disso, valores não sacados do PIS/Pasep serão transferidos para o FGTS de maneira a permitir novos saques de conta sativas e inativas do Fundo de Garantia. O impacto será de R $21,5 bilhões. A equipe econômica destacou que a maior parte dos recursos disponíveis é referente a contas de trabalhadores que atuaram com carteira assinada entre 1971 e 1988. Como muitos já morreram, o benefício foi estendido a herdeiros, mas mesmo assim teve baixa procura.

O Ministério da Economia vai reforçar o orçamento do Bolsa Família em R$ 3,1 bilhões. O valor é suficiente para zerar a fila do programa, disse o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. Mais de 500 mil famílias aguardam para ter acesso ao benefício.

O ministério anunciou ainda que as empresas poderão adiar o pagamento do FGTS por três meses. As micro e pequenas terão direito a adiar pelo mesmo período o recolhimento ao Simples, e as contribuições ao Sistema S serão reduzidas temporariamente em 50%.

Ontem, o presidente Jair Bolsonaro participou de reunião no Ministério da Economia. Afirmou que “dificilmente” ocrescimento do PIB brasileiro será de 2% em 2020. E destacou a falta de recursos:

— Nossa preocupação existe. Agora, nossa economia não é a americana, que o Trump anuncia aí bilhões e bilhões de dólares para socorrer a esse ou aquele setor. A gente não tem recurso para isso — disse, em entrevista à Rádio Bandeirantes.

Em razão do baixo crescimento da economia e da queda nos preços do petróleo, o governo prepara um forte bloqueio de gastos no Orçamento, na próxima sexta-feira, mesmo em meio à crise. Guedes defendeu a necessidade de aprovação das reformas para ampliar o espaço fiscal:

— Imagina no meio de uma crise dessas fazer contingenciamento?

Mansueto afirmou que o bloqueio será curto, até o Congresso aprovar um aumento da meta de déficit nas contas públicas, hoje em R$ 124 bilhões.

IMPACTO LIMITADO

O governo avalia outras medidas. Está em estudo encurtar o cronograma de restituição do Imposto de Renda para pessoas físicas. Segundo um técnico do governo, a medida será avaliada assim que for encerradoo prazo da entregadas declarações, em 30 de abril. Neste ano, estão programados cinco lotes de restituição do IR, de maio a setembro.

Em 2019, eram sete, de junho a dezembro.

Para especialistas, o pacote anunciado pelo governo vai na direção correta, mas terá efeito limitado na contenção da crise. Com 40% da mão de obra na informalidade, não alcança todos os trabalhadores. Para Juliana Inhasz, professora do Insper, os excluídos no mercado formal estão em uma espécie de limbo.

—E o motorista do Uber, o vendedor de bala? Continuam anão ter como ter renda. E, para sobreviver, vão continuar se movimentando, contrariando a restrição que busca evitara propagação da doença.

Para André Perfeito, economista-chefeda corretora Necton,criap roble mas adiante:

— Do total, R$ 111 bilhões são antecipações ou diferimentos, ou seja, vamos antecipar o consumo ou postergar impostos. No limite, isso tem soma zero e aponta para desaceleração da economia ainda mais acentuada adiante.

“Se ficar todo mundo em casa, o produto colapsa. Se ficar todo mundo na rua, a velocidade de contágio é muito rápida e você atinge o sistema de saúde. Então, deve ter um meio termo”

“Imagina no meio de uma crise dessa fazer contingenciamento”

Paulo Guedes, ministro da Economia