Correio braziliense, n.20705, 30/01/2020. Economia, p.8

 

Sobem os juros do cartão

Vera Batista

30/01/2020

 

 

Conjuntura » Mesmo com a taxa básica, a Selic, no menor patamar da história, e de outras linhas mostrarem queda de custos, a média dos encargos financeiros cobrados na modalidade sobe para 318,9% ao ano. BC não vê explicação

Apesar da queda constante da taxa básica de juros (Selic), que está em 4,5% ao ano, menor patamar da série histórica, os encargos cobrados pelos bancos no cartão de crédito continuam nas alturas. De acordo com o Banco Central (BC), a taxa média do rotativo do cartão, que era de 285,4% ao ano no fim de 2018, bateu os 318,9% em dezembro de 2019. Já no cheque especial, foi registrado recuo de 312,6% para 301,5%, no mesmo período.

De acordo com o chefe adjunto do Departamento de Estatísticas do BC, Renato Baldini, “não há uma explicação monetária para o aumento” das taxas do cartão, já que a Selic caiu e a inadimplência tem se mantido estável e em nível baixo. Os atrasos acima de 90 dias no crédito livre, aquele no qual o banco tem autonomia para emprestar e cobrar juros, ficou estável em 5% no caso das pessoas físicas, de novembro para dezembro. Entre pessoas jurídicas, o percentual de calotes caiu para 2,1%.

Pelos dados do BC, outras linhas apresentaram redução nos juros. A taxa do crédito consignado (descontado na folha de pagamento) teve queda de 0,1 ponto percentual em dezembro, na comparação com o mês anterior, para 20,5%  ao ano, chegando ao menor patamar da série histórica, iniciada em janeiro de 2004. Os juros do crédito pessoal não consignado caíram para 94,6% ao ano em dezembro, com queda de 8,4 pontos percentuais em relação a novembro.

No caso do cheque especial, desde 2018, os próprios bancos criaram medidas de autorregulamentação, por meio da oferta de um parcelamento especial, com taxa de juros menores, para correntistas que usassem a modalidade por mais de 15 dias. A medida, porém, não conseguiu frear o avanço dos juros. Para tentar equilibrar as taxas, o BC determinou que as instituições financeiras não podem cobrar mais de 8% ao mês, ou 151,8% ao ano. A mdida entrou em vigor no último dia 6. Portanto, as estatísticas divulgadas ontem ainda não captam a mudança.

Pelos dados do BC, o saldo das operações de crédito do sistema financeiro somou R$ 3,5 trilhões em dezembro de 2019, com expansão de 1,6% no mês, refletindo elevações de 1,8% em pessoas jurídicas (saldo de R$ 1,5 trilhão) e de 1,5% em pessoas físicas (R$ 2 trilhões). No ano, a carteira total cresceu 6,5%, com expansões de 11,7% no crédito às famílias e de 0,2%, no crédito às empresas. A relação crédito/PIB atingiu 47,8%, com elevação anual de 0,5 ponto percentual.

Para o economista Cesar Bergo, sócio-consultor da Corretora OpenInvest, a tendência é que as taxas de juros para pessoas físicas fiquem menos salgadas a partir deste ano. “Somente em agosto do ano passado, começou de verdade a pressão do BC pela redução dos juros. Os resultados que estamos vendo agora e que deverão se refletir nos balanços dos bancos que serão apresentados nesse primeiro trimestre ainda têm como base o contexto antigo”, explicou. Ele lembra que, no caso do cartão de crédito, os juros são estabelecidos pelas administradoras. “Não se consegue fazer um ajuste do dia para a noite. É preciso aguardar como virão os próximos resultados”, assinalou.

Frase

"Somente em agosto do ano passado, começou de verdade a pressão do BC pela redução dos juros. Não se consegue fazer um ajuste do dia para a noite. É preciso aguardar os próximos resultados"

César Bergo, sócio consultor da corretora Open Invest