Correio braziliense, n. 20758, 23/03/2020. Política, p. 3

 

Maia é contra adiar eleições

Jorge Vasconcellos

23/03/2020

 

 

Em teleconferência com prefeitos de capitais, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, defendeu ontem que o Congresso adie as eleições municipais de outubro, para conter o avanço do novo coronavírus no país. Para ele, a agenda eleitoral pode comprometer o foco dos gestores e causar uma “tragédia”. A proposta dividiu opiniões e acabou rejeitada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Segundo ele, o momento não é o ideal para a discussão.

Mandetta, durante a teleconferência, sugeriu o adiamento do pleito ao responder a um prefeito que reclamava de dificuldades políticas para adotar algumas medidas de contenção. Na opinião do ministro, os atuais ocupantes de cargos eletivos nos municípios poderiam ter os mandatos prolongados até que as eleições possam ser realizadas com segurança. “Faço aqui até uma sugestão. Está na hora de o Congresso falar: ‘Adia’, faz um mandato desses vereadores e prefeitos. Eleição no meio do ano... uma tragédia, por que vai todo mundo querer fazer ação política”, disse.

“Não é hora de falar sobre isso”, interrompeu o prefeito de Campinas (SP), Jonas Donizette (PSB), presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP). Em seguida, foi dada a palavra a um outro gestor, e não se tocou mais no assunto.

Da mesma forma, o deputado Rodrigo Maia disse que a prioridade do momento é o combate ao coronavírus. “Não temos que tratar disso agora. Temos que tratar do enfrentamento do vírus no campo da saúde, da economia e, principalmente, em relação à área social, cuidar dos mais vulneráveis”, afirmou o presidente da Câmara.

“O problema da eleição tem que ser tratado em agosto, não agora. Se a curva do ministro (em relação à epidemia) estiver certa, quando a gente chegar em agosto nós vamos ter condições de organizar esse assunto”, conclui o parlamentar.

Posição do TSE

Horas depois, durante coletiva de imprensa on-line, Mandetta insistiu na proposta. “Precisamos pensar mais nas próximas gerações do que nas próximas eleições. Se esse assunto (eleição municipal) vai ser mais um complicador, que seja adiado pelo menos um pouco. Mas não é da minha competência promover alterações nesse sentido”, frisou o ministro.

Em meio à discussão, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), que assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em maio, divulgou nota afirmando que cabe ao Congresso decidir sobre o possível adiamento das eleições, cuja data está prevista na Constituição Federal.

“A saúde pública é o bem supremo a ser preservado no país. Tudo o que possa impactá-la deve ser adequadamente avaliado. A Constituição prevê a realização de eleições no 1º domingo de outubro. A alteração dessa data depende de emenda constitucional. Portanto, não cabe a mim, como futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral, cogitar nada diferente nesse momento”, disse Barroso, no comunicado.

“É papel do Congresso Nacional deliberar acerca da necessidade de adiamento, inclusive decidindo sobre o momento adequado de fazer essa definição. Se o Poder Legislativo vier a alterar a data das eleições, trabalharemos com essa nova realidade”, acrescentou o magistrado.

“Se o adiamento vier a ocorrer, penso que ele deva ser apenas pelo prazo necessário e inevitável para que as eleições sejam realizadas com segurança para a população. A realização de eleições periódicas é um rito vital para a democracia”, concluiu o ministro.

Desde que se intensificaram as consequências da pandemia, líderes do Congresso começaram a discutir a possibilidade de adiar as eleições que vão escolher prefeitos e vereadores. O líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), enviou ao TSE, na sexta-feira, ofício pedindo o adiamento do pleito para 2022. Ele também deve apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para determinar a coincidência das eleições. Para o parlamentar, essa alteração permitiria o remanejamento dos recursos destinados às eleições para a intensificação do combate ao coronavírus. Segundo ele, o reforço do caixa da saúde seria de pelo menos R$ 1,5 bilhão.

De acordo com o senador, a intenção é prorrogar os mandatos dos atuais prefeitos e vereadores até 2022, mantendo a impossibilidade de reeleição para os chefes do executivo municipal. Com isso, as eleições para todos os cargos ficariam coincidentes, a cada quatro anos.