Correio braziliense, n. 20696 , 21/01/2020. Economia, p. 7

 

Capital privado sustenta crescimento

Simone Kafruni

21/01/2020

 

 

CONJUNTURA » Aumento dos investimentos de empresas nacionais e estrangeiras, em contraposição à redução dos aportes de recursos públicos, pode garantir expansão mais consistente da economia e levar a alta de 3% do PIB neste ano, segundo o governo

Os investimentos privados, inclusive o aporte direto de capital estrangeiro em projetos nacionais, estão garantindo a retomada da economia brasileira e permitem estimativas mais otimistas para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2020, tanto do governo federal quanto do Fundo Monetário Internacional (FMI). Ontem, o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, afirmou que a atividade econômica do país pode alcançar expansão entre 2,5% e 3% ainda este ano — acima da projeção oficial, de alta de 2,4% —, graças a uma mudança de estratégia. “Antes o governo era o gerador, e isso nos levou a uma crise fiscal. Mudamos o mix e, agora, a base do crescimento é sustentável a longo prazo”, explicou.

A justificativa encontra respaldo na nota técnica Retomada Via Setor Privado divulgada ontem pela secretaria, com base em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que apontam para a evolução positiva dos investimentos do setor privado, com crescimento de 2,72% no terceiro trimestre do ano passado sobre mesmo período do ano anterior. Essa alta compensou o recuo de 2,25% no aporte de recursos públicos. Na variação acumulada em quatro trimestres, houve contração de 5,18% de investimento público ante alta de 4,48% do privado, que registrou o maior ritmo desde 2014.

De acordo com Vladimir Kuhl Teles, subsecretário de Política Macroeconômica do Ministério da Economia, os dados ilustram que, com perspectiva de equilíbrio fiscal a médio e longo prazos, o modelo de crescimento passa a ser direcionado para o empreendedorismo privado. “Que é mais sólido e mais consistente, portanto, deve estimular a economia por uma década ou mais”, explicou. Teles lembrou que, quando o crescimento era movido pelo governo, os gastos públicos pressionaram a inflação. “Para combatê-la, os juros foram elevados. Esse ambiente desestimulou o investimento privado”, disse.

O subsecretário explicou que o ambiente mais estável, com juros baixos e inflação controlada, incentiva o capital privado a investir. “Quando o governo gasta muito, direciona os recursos de uma forma que nem sempre é a mais eficiente. Com controle, estimula o aumento da produtividade, que é do que o país precisa”, ressaltou. Segundo ele, houve queda anual de 1% ao ano da produtividade nos últimos 40 anos. “O modelo era ‘gasto crescendo e produtividade caindo’; agora a ideia é o inverso”, completou.

Essa mudança, reiterou Sachsida, tende a dar resultados graduais à medida que o setor privado vai ganhando peso na economia. “Temos que insistir no que está dando certo, na consolidação fiscal”, defendeu. “Para isso, não podemos parar com as reformas”, acrescentou. Os dados mostraram que a evolução positiva do setor privado tem sido observada desde o 2º trimestre de 2019, ao passo que a trajetória descendente do setor público foi iniciada no 3º trimestre de 2018. Para o governo, isso reflete, em grande parte, a melhora da confiança dos agentes econômicos.

Liquidez

No entender do professor e coordenador do curso de economia da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP) Joelson Sampaio, o aumento do investimento privado é positivo porque vai direto para o lado real da economia. “São aportes em máquinas e equipamentos, em novos projetos e em concessões, ou seja, com capacidade de gerar crescimento”, avaliou. Segundo o especialista, o setor privado está contribuindo para melhorar a conjuntura macroeconômica. “O Brasil está conseguindo aproveitar a liquidez internacional. Esse investidor está pensando em um retorno maior, uma vez que os juros estão baixos em termos globais”, disse.

Para Paulo Dantas, especialista em infraestrutura do escritório Castro Barros, há expectativa de mais investimentos este ano. “Temos a presença maciça de chineses em vários setores de infraestrutura. Os europeus já têm tradição. A tendência é que os players continuem participando, porque vem muita coisa por aí”, assinalou. Dantas se refere ao pacote de concessões de rodovias, aeroportos, portos e ferrovias. “Além disso, os leilões de petróleo devem se tornar mais atrativos com o fim da preferência da Petrobras, que está em estudo”, afirmou. Proposta do Legislativo institui a disputa em igualdade de condições nos certames, uma vez que o privilégio da Petrobras acabou afastando investidores estrangeiros nos últimos realizados em 2019.