Correio braziliense, n. 20755 , 17/03/2020. Política, p. 5

 

Secretário do DF demitido

Ana Maria Campos

17/03/2020

 

 

Governador Ibaneis Rocha exonera Osnei Okumoto após o Ministério da Saúde divulgar erroneamente que o Distrito Federal estaria com contágio comunitário. Em entrevista ao CB.Poder, titular da pasta disse que o ponto crítico da doença ocorrerá em 30 dias

Em uma reunião que durou cerca de três horas, o ministro da Saúde, Luís Henrique Mandetta, pediu que o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso continuem funcionando para atuar no combate à evolução dos casos de infecção pelo novo coronavírus no país. Mandetta apresentou ao Judiciário e Legislativo a situação do país hoje e cenários caso a disseminação da doença se agrave. Após o encontro, ele comparou o comportamento do presidente Jair Bolsonaro, que foi às ruas de Brasília participar de um ato a favor do governo, no domingo (15), com o de cariocas que lotaram as praias do Rio de Janeiro.

 
O ministro foi questionado sobre o ato do presidente, que contraria recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) para que a população evite aglomerações. Ele evitou comentar o assunto, mas disse que é importante que cada um avalie seu próprio comportamento. “Eu acho que o presidente, vocês estão todos focados e apontando ali. Eu acho que o presidente teve a sua passagem ali (na manifestação) que vocês podem questionar. Agora, ontem a praia estava superlotada no Rio de Janeiro, os bares no Leblon, amigos meus mandaram fotos brindando”, disse Mandetta.
 
O ministro completou, pedindo que a população faça sua parte para evitar a propagação da doença. “Nós precisamos, coletivamente, ao invés de apontar o dedo, está na hora de todo mundo entender que vai ser do comportamento coletivo que a gente vai ter mais intensidade ou menos intensidade dos casos. Neste momento, precisamos que as pessoas façam a sua parte”, destacou. Para Mandetta, o cenário nacional não é epidêmico. “Nós não temos epidemia ainda, surto epidêmico. Nós temos sustentação de vírus. Poderemos ter epidemia? Poderemos ter. Mas nem começamos ainda”, disse.
 
Apoio da Anvisa
A presença do presidente Jair Bolsonaro nos atos de domingo atropelou o discurso do ministro de enfrentamento à doença e desautorizou uma de suas principais medidas, de evitar aglomerações. Nas redes sociais, onde o ministro encontra apoio até de opositores de Bolsonaro, Mandetta foi aconselhado a mostrar contrariedade, pedindo demissão. Na última semana, a presença de Mandetta em entrevista coletiva ao lado do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), adversário do governo, também incomodou o presidente. O grupo de Bolsonaro diz que o ministro deveria ter dado mais crédito ao presidente pelas medidas anunciadas.
 
Ao mesmo tempo que contraria Mandetta, Bolsonaro tenta tirar dos bastidores o contra-almirante da reserva Antonio Barra Torres, um médico bolsonarista que foi colocado no comando da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para, entre outras missões, impedir a liberação do plantio de maconha, no que foi bem-sucedido. É para o contra-almirante que Bolsonaro telefona e se consulta sobre assuntos de saúde. Neste ano, ele já esteve cinco vezes no gabinete de Bolsonaro para encontros individuais; Mandetta foi apenas duas, conforme a agenda pública. O diálogo do oficial com o presidente flui por afinidades como mundo militar, motos e armas.
 
No domingo, o presidente da Anvisa acompanhou Bolsonaro na manifestação de rua contra o Congresso e o Supremo Tribunal Federal e a favor do governo. A presença dele foi usada pelo Planalto como uma chancela à decisão do presidente de participar do ato, mesmo com recomendação contrária de Mandetta a aglomerações e de médicos. A atitude de Torres causou perplexidade entre autoridades da área de saúde. Servidores da Anvisa lamentaram, em nota, a ida do seu chefe ao ato.
 
Após a aparição pública do presidente, quando ele já era fortemente criticado, Mandetta declarou que as aglomerações eram um “equívoco” diante do avanço da doença no país. Desde os primeiros casos confirmados da doença, Bolsonaro e o ministro da Saúde apareceram juntos apenas uma vez. Foi na última quinta-feira, 12, durante uma live no Alvorada, quando usavam máscaras. No dia seguinte, Mandetta estava ao lado de Doria.