Correio braziliense, n. 20762 , 27/03/2020. Cidades, p.19

 

DF tem nove casos de transmissão comunitária

Alan Rios

Mariana Machado

Wader Galvão

27/03/2020

 

 

O Distrito Federal tem nove pessoas infectadas pelo novo coronavírus que não sabem dizer onde contraíram a doença. Levantamento da Secretaria de Saúde mostra que a forma de contágio evoluiu de importada e local para comunitária (leia Transmissões). Até então, a maioria dos diagnósticos era de pacientes que voltaram de viagens internacionais ou que entraram em contato com esses viajantes. Após 21 dias do primeiro caso, a capital contabiliza, oficialmente, 203 notificações confirmadas da Covid-19, no entanto, informações do gabinete de crise do Governo do Distrito Federal (GDF) indicam que são 206 casos da doença.
 
Do total de contaminados, 47, a maioria, mora no Plano Piloto, segundo balanço da Secretaria de Saúde que avaliou o quadro da doença na quarta-feira. Em segundo lugar, vem o Lago Sul, com 34 registros da doença. Uma moradora dessa região administrativa, uma mulher de 52 anos, foi a primeira pessoa no DF a testar positivo para a Covid-19, em 5 de março. Desde então, ela segue internada na unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Regional da Asa Norte (Hran) e está em estado gravíssimo.
 
Apesar de o Lago Sul estar em segundo lugar no ranking, a região administrativa é proporcionalmente a primeira colocada. A incidência da doença é de 112,14 por 100 mil habitantes. Em seguida, vem o Sudoeste que, com 17 pacientes diagnosticados, registra incidência de 30,76 por 100 mil habitantes. Em terceiro lugar, fica o Plano Piloto, que o valor da incidência por 100 mil habitantes é de 20,41.
 
Em algumas regiões administrativas, ainda não há presença do coronavírus. Recanto das Emas, Varjão do Torto, Candangolândia, Riacho Fundo II, Estrutural, Setor de Armazenagem e Abastecimento Norte (SAAN), Fercal, Santa Maria, Itapoã e Brazlândia não têm casos confirmados da doença. Além disso, Samambaia, Núcleo Bandeirante, Riacho Fundo I, Sobradinho II, Paranoá, São Sebastião e Ceilândia têm apenas um caso cada de coronavírus.
 
Infectados
Dados divulgados ontem pela Secretaria de Saúde mostram que dos 203 casos confirmados de coronavírus no Distrito Federal, 12 estão em internação hospitalar, sendo seis graves e seis críticos. Os demais são consideradas infecções leves ou estão em investigação, mas não exigem que o paciente fique em unidades de saúde. Conforme informações do gabinete de crise do GDF há 206 pessoas com a Covid-19 no DF, sendo  121 homens e 85 mulheres.
 
O levantamento da pasta também considerou a faixa etária dos infectados. A maior incidência da doença acontece em pessoas entre 31 e 40 anos, totalizando 58 casos. Em seguida, com 55 diagnósticos, vem o grupo de 41 a 50 anos. A taxa de infecção é menor em crianças e adolescentes entre 11 e 20 anos, que representam sete notificações da Covid-19.

Quarentena
Especialistas alertam: com a transmissão comunitária, a velocidade de contágio é muito maior. Luciano Lourenço, clínico médico e coordenador do pronto-socorro do Hospital Santa Lúcia explica que o fator de infecção do coronavírus é de 2,5, o que quer dizer que, em média, cada paciente com a doença pode transmiti-la a mais 2,5 pessoas. “O H1N1, por exemplo, responsável pela pandemia de 2009 conhecida como gripe suína tem esse índice em 1,5”, comenta Luciano.
 
Agora, mais do que antes, o isolamento se mostra importante. “Tudo o que está sendo recomendado é para evitar a disseminação de um número muito grande de pessoas infectadas em um curto intervalo de tempo. Aqui no Brasil, nós temos a oportunidade de aprender com os erros e acertos de outros países”, ressalta. “A China, inclusive já está publicando estudos para orientar o mundo inteiro”, destaca. Ele lembra que a taxa geral de letalidade está subindo. Antes esperada em 2,5%, hoje está entre 3,5% e 4%. Para idosos, pode chegar a 15%.
 
Na análise do médico, o fato de, no DF, grande parte dos infectados residir em regiões como Plano Piloto e Lago sul, está diretamente associada ao poder aquisitivo dos moradores. “A maioria desses casos chega importado por pessoas que tiveram viagens recentes a regiões endêmicas. Mas, sem dúvida, o vírus vai se alastrar e quem trabalha para esses pacientes e moram em outras cidades vão levar a doença. Esse é o motivo do isolamento: evitar que a contaminação aconteça em velocidade desproporcional”, alerta Luciano.
 
Para o especialista em doenças infecciosas e médico do Hospital de Base e das Forças Armadas (HFA), Hemerson Luz, a transmissão comunitária era esperada pelos profissionais da saúde. “Essa variação de números não significa que a situação esteja fora de controle. Em algum momento, o tipo de transmissão mudaria. Por isso, é importante manter os cuidados de higiene, principalmente no transporte público e com objetos compartilhados”, frisa.
 
De acordo com o estudioso, a quantidade de casos confirmados no DF está abaixo das curvas matemáticas esperadas pelos especialistas. “Geralmente, o que acontece é um crescimento exponencial. O estimado era de que a cada três dias o número de casos dobrasse. Então, estamos dentro do previsto”, analisa. Hemerson ainda reforçou que a discussão sobre os cuidados pessoais são necessárias para impedir que os números aumentem.
 
Sobre a maior incidência de infecção em homens, o infectologista acredita que seja algo relacionado ao comportamento. “A dengue, por exemplo, atinge mais mulheres. O Aedes aegypti é domiciliar e, como, geralmente, há mais mulheres dentro de casa durante o dia, elas ficam mais expostas. No caso do coronavírus, pode haver falta de cuidado por parte do homem”, avalia. Hemerson esclarece que a taxa de infecção é maior na faixa etária dos 31 aos 50 anos porque é um público que está em atividade comercial e social. “A ideia do isolamento é exatamente pegar essas pessoas mais ativas e bloqueá-las”, completa.

Insumos e contratações
Tendo em vista o aumento de casos do coronavírus, o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do Distrito Federal (IGES-DF) divulgou a abertura de seleções para contratações de profissionais de saúde. Médicos do trabalho, infectologistas, imunologistas, pneumologistas, psiquiatras, clínicos gerais, psicólogos e fisioterapeutas serão convocados para trabalhar durante seis meses.
 
De acordo com o informe do instituto, a seleção “será feita com base em análise curricular e servirá para atender as demandas de urgência e emergência da população na rede de saúde pública no combate ao novo coronavírus”. Os salários variam entre R$ 3.783,93, para psicólogos, e R$ 14.330,40, para médicos intensivistas.
 
A Secretaria de Saúde também divulgou que abriu dispensa de licitação para compra emergencial de equipamentos de proteção individual (EPIs). A medida publicada em edição extra do Diário Oficial do Distrito Federal (DODF), na noite de quarta-feira, tem como objetivo facilitar o combate à disseminação da Covid-19 no DF. A pasta pretende adquirir macacões para pulverização, sapatilhas, luvas, avental, capotes e máscaras para o abastecimento pelos próximos seis meses.

Aniversário adiado
O GDF confirmou, na noite de ontem, a suspensão das festividades programadas para o 60° aniversário de Brasília, em virtude da pandemia do coronavírus. A decisão foi tomada diante da previsão de pico da doença no período e da impossibilidade de planejamento dos eventos. A festa ainda não tem nova data definida.