Correio braziliense, n. 20765 , 30/03/2020. Cidades, p.15

 

Primeira morte é confirmada no DF

Sarah Peres

Thais Umbelino

30/03/2020

 

 

A primeira morte pelo novo coronavírus no Distrito Federal foi confirmada ontem. A vítima, Viviane Rocha de Luiz, de 61 anos, morreu na segunda-feira passada, mas não houve divulgação do caso. Isso ocorreu porque o primeiro exame atestou negativo para a doença. O segundo teve resultado inconclusivo. Por isso, o material genético foi encaminhado para análise na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, e deu positivo para a infecção por Sars-Cov-2, no sábado passado.

A assessora técnica e responsável pela Câmara Técnica de Vigilância Sanitária do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) foi cremada na terça-feira, em Formosa (GO). Os casos de contaminados na capital federal chegaram a 298, segundo boletim divulgado ontem pela Secretaria de Saúde.

Segundo o irmão da vítima, Douglas Alessandro Rocha de Luiz, 56, a assistente técnica apresentou os primeiros sintomas no dia 15 de março. O familiar acredita que ela foi contaminada após manter contato com uma amiga que veio da Europa e testou positivo para a doença. Elas teriam se encontrado na primeira semana de março. Viviane realizou o primeiro teste para coronavírus em 20 de março, e o resultado deu falso negativo. Apesar disso, ela continuou apresentando sintomas da doença e procurou um hospital particular. Em seguidam foi ao Hospital Regional da Asa Norte (Hran).

“Ela foi medicada neste hospital particular e, ali, a informaram que deveria procurar o Hran. Quando foi atendida na rede pública, tinha apresentado uma leve melhora. Por isso, a liberaram. No entanto, minha irmã continuou piorando. Por isso, vim de ônibus para Brasília no sábado, para acompanhá-la”, relatou o morador de São Carlos (SP).

Inicialmente, a Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) informou que Viviane teria dado entrada no Hospital Regional da Asa Norte (Hran) em 20 de março. Por conta de o primeiro teste para coronavírus dar negativo, não ficou isolada no 7º andar. Contudo, na nota divulgada pela pasta, ontem, é informado que a assessora técnica só foi atendida na unidade em 22 de março.

“Ela ter ido ao hospital novamente foi uma surpresa, porque no domingo (22), ela tinha apresentado um quadro mais estável. Chegou até a conversar por videochamada com uma prima nossa. Então, quando eu soube, fiquei muito preocupado com a situação dela”, relatou Douglas. Viviane deu entrada no Hran com febre, desconforto respiratório e diarreia. Ali, passou pelo segundo exame para Covid-19, que deu inconclusivo.

Além dos sintomas, ela também tinha comorbidades, como obesidade mórbida, hipertensão arterial sem tratamento e era ex-fumante. O quadro de saúde de Viviane piorou e, após uma parada cardiorrespiratória, ela faleceu às 11h40. “Não tive contato com ela durante o período de infecção, nem mesmo no hospital. Eu retornei ao hospital na segunda-feira, mas não me deram qualquer informações sobre o quadro de saúde dela. Quando retornei para a casa de um amigo, recebi uma ligação do Hran. Pediram que eu retornasse com os documentos da Viviane. Só então soube que ela tinha falecido” contou o irmão da vítima.

A SES-DF soltou uma nota confirmando a causa do óbito: “Ontem (sábado), por volta da meia noite, foi confirmado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz-RJ) o resultado positivo da contraprova para o novo Coronavírus (Sars-Cov-2). Portanto, trata-se da primeira vítima oficial da Covid-19 no Distrito Federal.”

O Correio questionou a pasta sobre os pacientes que poderiam ter mantido contato com Viviane quando ela teria sido internada em 20 de março. A secretaria limitou-se a informar que “todos aqueles que tiveram contato direto com a vítima estão sendo monitorados pela autoridade sanitária do Distrito Federal.”

Tristeza

Viviane era de São Carlos, município paulista, mas morava sozinha em Brasília, no Sudoeste. A assessora técnica do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) se mudou para a capital  havia 15 anos, quando passou no concurso público. Por morar longe da família, ela ia com certa frequência para o interior paulista — viajou até a região em dezembro de 2019 e fevereiro passado.

As boas recordações vão ficar marcadas no coração de Vanessa Quatrochi Trad, prima de Viviane. “A Vivi era como uma irmã, parceira de toda minha vida, a quem amava, respeitava e admirava", diz a familiar. Ela acompanhou Viviane desde quando foi internada, mas não quis dar mais informações. “Chegamos a nos falar por ligação de vídeo e WhatsApp. Foi tudo muito rápido”, contou a prima. Ontem, o dia foi marcado pela saudade e dor. “Estava assistindo à missa de sétimo dia dela e me deu muita tristeza. Ela vai deixar saudades”, lamentou Vanessa.

Segundo o irmão da paulista, Douglas Alessandro, Viviane era uma profissional dedicada, irmã carinhosa e preocupada com todos. “Nos falávamos todos os dias por telefone. Apesar de gostar da capital, quando ela aposentasse, voltaria para a cidade natal, para ficarmos próximos novamente”, disse Douglas. “Está muito difícil e complicada toda essa situação. Por isso, respeite seu próximo. Fique em casa. Se cuide e cuide dos seus e dos outros”, aconselhou o imão da vítima.

 A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e o Grupo Temático de Vigilância Sanitária (GTVisa) também se pronunciaram quanto à morte da profissional da saúde. “É com grande pesar que recebemos e comunicamos a notícia do falecimento da companheira, Viviane Rocha de Luiz. (...) Viviane participou dos movimentos que contribuíram para a construção do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, e a partir do ano de 1999 foi uma presença e um apoio fundamental para os avanços e superação de desafios do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e na Comissão Intergestores Tripartite-CIT”, detalhou o texto.

“Nestes tempos de dificuldade para o Brasil e o mundo, lastimamos que seja uma das primeiras companheiras levadas pela pandemia. Viverá sempre em nossos corações e em nossa lembrança, pela alegria, companheirismo e crença num sistema de saúde inclusivo e equitativo. A ela, nossa gratidão. A seus entes queridos, nossa solidariedade nessa dor”, concluiu o texto emitido pelas entidades. 

Aumento dos casos

O número de infectados pelo novo coronavírus na capital federal continua crescendo. Boletim divulgado na noite de ontem pela Secretaria de Saúde indica que 298 pessoas estão com a doença. Destes, 31 estão internados, sendo que 13 estão em estado crítico e 18 estão com quadro de saúde grave. Os casos de recuperação também tiveram aumento, agora são 134.

De acordo com os dados apresentados, a maior parte dos acometidos pela doença está com infecções leves, ou seja, 195 estão nesta condição e em isolamento domiciliar. O levantamento informado pela secretaria aponta que 39 das pessoas com coronavírus correm um risco alto, por terem 60 anos ou mais (Veja Os Infectados).