O globo, n. 31642, 25/03/20. Opinião, p. 2

 

Bolsonaro minimiza epidemia e põe Brasil em risco

25/03/2020

 

 

O estilo errático do presidente provoca idas e vindas em ações que precisam ser urgentes, devido ao tamanho de uma crise que já paralisa a economia. É exemplar a edição da MP dos contratos de trabalho, que desconhecia a existência dos empregados, devidamente revogada. Sequer deveria ter sido assinada. Ida e vinda desnecessárias.

Outro temerário costume do presidente—ode fazer política pelo enfrentamento, política de combate—é muito prejudicial à população e a ele mesmo. Espera-seque tenha ouvido o barulho dos pane laços, replay do socorridos em 2016 na fase de agravamento da crise cujo desfecho foi a aprovação do impeachment de Dilma pelo Congresso. Inclusive o de ontem à noite, enquanto, em rede nacional, voltava a defender a delirante tese de que a Covid -19 só é perigosa para idosos, sendo inofensiva para o resto da população.

Mas não basta ter conhecimento das manifestações. É necessário também entendê-las como sintoma da rejeição majoritária na população a um presidente que chegou anegara existência da pandemia, considerando-a uma “g ripezinha ”— ter moque voltou a usar ontem —, em desrespeito aos já infecta dose a toda a população, temerosa diante do noticiário do que acontecia no mundo. Inclusive aos mortos pela doença,cujo número começa a aumentar. O me doera eé justificável. A taxa de crescimento dos casos no Brasil acelera, repetindo o padrão mundial que levou a situações críticas, por exemplo, na Itália, país desenvolvido. E odo noda maior economia do mundo, os Estados Unidos, que começam a ser considerados anova China na pandemia mundial. Símbolo da gravidade a que pode chegara situ ação é o fato de Nova York ser uma das cidades mais atingidas.

O modelo de presidente de Bolsonaro, Trump, caiu na mesma esparrela e teve de bater em retirada desorganizada, como costuma fazer, preocupado com os estragos da demora em agir em seu projeto de reeleição. Mas ensaia voltar à posição anterior.

O pronunciamento de Bolsonaro indica que ele deixou de ouvir o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. O ministro tem conduzido com eficiência um programa de enfrentamento da epidemia, o que lhe tem rendido índices de aprovação e apoio acima da baixa popularidade de Bolsonaro. Isso pode ser fatal para o ministro, num ambiente politicamente tóxico.

Não importa o bem-estar dos brasileiros, a maior parte deles de baixa renda, com uma parcela significativa residindo em favelas ou comunidades, vulneráveis ao coronavírus, dependentes da ação de um governo cujo presidente insiste em minimizar acrise, porque foi convencido de que pior do que a doença é a recessão causada pela quarentena e pelo isolamento social. Prefere culpara imprensa profissional.

É ames ma pressão que está sendo feita sobre Trump, a despeito dos alertas de autoridades médicas americanas, como aqui. Esquecem que o dano causado aos países será maiores e alongará,caso as medidas de prevenção não sejam tomadas.