Título: Negros ainda em desvantagem
Autor: Amorim, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 21/11/2012, Cidades, p. 31
Com baixos salários e menor escolaridade, a maioria afro-brasileira vive fora do Plano Piloto e das cidades com melhor infraestrutura
Embora os avanços sejam incontestáveis, os negros seguem em desvantagem no mercado de trabalho do Distrito Federal. Em geral, ganham menos e trabalham em atividades que exigem grau de qualificação menor. Dados dessa população divulgados ontem pela Companhia de Planejamento do DF (Codeplan), no Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra, mostram ainda que os negros apresentam nível de escolaridade inferior ao dos não negros e são maioria nas localidades mais pobres.
O perfil dos afrodescendentes envolve informações sobre local de moradia, escolaridade, tipo de ocupação e rendimento extraídas da Pesquisa Distrital por Amostra deDomicílios (Pdad) realizada em todas as regiões administrativas. "O resultado deixa claro que a cor da pele ainda é um elemento determinante. Não se trata somente de uma estratificação social", comentou o presidente da Codeplan, Júlio Miragaya, para quem o cenário traçado confirma estereótipos e, por isso, preocupa.
Nos lagos Sul e Norte, áreas de renda mais alta, 81% da população não são negros. Em cidades mais periféricas, no entanto, a proporção de negros supera os 70%, como na Estrutural (76%), no Paranoá (72,8%), no Varjão (72%), no Itapoã (71,4%) e em São Sebastião (71,1%). "O negro tem local de moradia muito bem delimitado no DF", observou, durante a apresentação dos números, a gerente de Estudos e Pesquisas Socioeconômicas da Codeplan, Iraci Peixoto.
Em relação à escolaridade, os negros ficam para trás, com diferenças bastante significativas. Entre os que têm nível superior completo no DF — incluindo cursos de especialização, mestrado e doutorado —, por exemplo, 67,1% são não negros. Quando são analisados os dados de analfabetos ou os dos que têm grau mínimo de instrução, a maioria é negra: 63,6%. Além disso, oito em cada 10 crianças entre 6 e 14 anos fora da escola são negras.
Nascida e criada na Estrutural, onde mora até hoje, Beatriz de Jesus, 19 anos, está atrasada nos estudos. Precisou trancar a matrícula durante a gravidez do filho, de quase 2 anos. A jovem, que sonha cursar enfermagem e medicina, deve concluir o ensino médio somente no fim de 2013. Por enquanto, desde que deixou de trabalhar como operadora de caixa em um supermercado se divide entre os cuidados com o filho, durante o dia, e o colégio, à noite.
O negro não encontra dificuldade em entrar no mercado de trabalho, segundo a pesquisa,mas a menor instrução o faz, na maioria dos casos, exercer atividades de baixa qualificação e salários menores, o que alarga o fosso racial. "Historicamente, o branco ascende muito mais rápido nas empresas. Isso é uma realidade", afirmou a coordenadora de Educação em Diversidade da Secretaria de Educação do DF, Ana José Marques, em evento no Museu da República, na tarde de ontem.
Nos canteiros de obra e nas indústrias, os trabalhadores negros predominam, 69,4% e 60,3%, respectivamente. Entre os empregados da administração pública, porém, setor de maiores rendimentos e estabilidade, os brancos são 57,4%. "Concluímos o que o Brasil inteiro já sabe: a maior parte dos negros está na base da pirâmide social", disse o economista Júlio Miragaya, antes de se lembrar que esse cenário não se restringe ao DF.
Baiano de Salvador, Adriano Nascimento da Rocha, 31 anos, chegou à capital do país em 2004. Morou, inicialmente, no Itapoã. Hoje, vive e trabalha com reciclagem na vizinha Paranoá, onde sete em cada 10 habitantes são negros. "Gosto que me chamem de neguinho, de negão... Tenho orgulho da minha cor, foi Deus quem me fez assim", comenta Rocha, que estudou até a 6ª série do ensino fundamental e sempre foi autônomo.
Codeplan vai atuar no Entorno O governador Agnelo Queiroz assinou ontem um acordo com o governo de Goiás que estende para 10 cidades do Entorno as pesquisas por Amostra de Domicílios (Pdad) e de Emprego e Desemprego (PED). Estão contemplados os municípios de Planaltina de Goiás, Formosa, Águas Lindas, Padre Bernardo, Santo Antônio do Descoberto, Alexânia, Novo Gama, Valparaíso, Cidade Ocidental e Luziânia. Todas as prefeituras contarão com uma equipe da Codeplan para fazer estudos de planejamento em urbanismo. A assinatura do convênio ocorreu na Universidade dos Correios, no encerramento do Seminário Perspectivas para o Desenvolvimento da Área Metropolitana de Brasília.