Valor econômico, v.20, n.4968, 20/03/2020. Brasil, p. A12

 

Brasil não deverá entrar em depressão devido a pandemia, diz economista

Rodrigo Carro 

20/03/2020

 

 

O Brasil terá de encarar uma recessão aguda até o início de 2021, quando a economia nacional deve começar a se recuperar dos efeitos provocados pela pandemia atual, afirmou hoje o economista Thomas Trebat, da Universidade de Columbia, em seminário pela internet. Ainda assim, ele não acredita que país passe por uma depressão econômica.

Na análise de Trebat, a economia global vai levar de 15 a 18 meses para retornar à normalidade. "Acho que essa é uma crise muito pior do que a crise financeira de 2008. Talvez, só encontre eco na crise dos anos 20 e 30 nos Estados Unidos", comparou Trebat, diretor do Columbia Global Centers Rio de Janeiro. Com relação ao aspecto médico da crise, ele acredita que os números na Europa sinalizam perspectivas menos animadoras quando comparados aos resultados chineses.

"Não acho que 80% da população mundial vai ficar doente, mas não acho também que o prazo [para controle da covid-19] seja de dois, três meses, como o foi o caso de Wuhan [cidade chinesa onde começou a pandemia] ou da Coreia do Sul". A diferença estaria, segundo ele, na taxa de propagação da doença em países como Itália, Espanha e França, muito mais acelerada do que aquela registrada em Wuhan.

Ex-diretor executivo do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Columbia, Trebat sustenta que o cenário mais provável para o Brasil é de uma "grande recessão" nos primeiros dois trimestres deste ano, com queda "curta e acentuada" da atividade. "E talvez continuando esse quadro recessivo, eu digo recessivo e não depressivo, nos próximos seis meses, seguido por uma ligeira recuperação mais para o fim do ano e uma relativamente rápida reativação da produção a partir do primeiro trimestre de 2021", resumiu o economista.

No cenário internacional, a recuperação viria no médio prazo. "Espero que eu esteja errado, mas calculo que daqui a 15 a 18 meses, ou seja, entre meados ao fim do ano que vem, calculo isso como um prazo razoável, dentro de um horizonte de planejamento, para que a atividade econômica mundial retorne a níveis, digamos, mais ou menos normais", disse o economista.

Ele destaca que o impacto da pandemia sobre a economia se dá não apenas pelo lado da demanda, afetada pelo provável aumento do desemprego e pela diminuição da renda, mas também pelo lado da oferta de bens e serviços, uma vez que a produção está parando para tentar evitar o contágio dos trabalhadores pela doença.

"Essa é uma crise que começa de uma forma completamente diferente daquela de 2008, com um choque com a cadeia de insumos produtivos, a chamada supply chain, do lado da oferta. Nessas condições não adianta muito gastar, gastar e gastar recursos públicos sem foco. O choque inicial vem do lado da oferta, uma fato quase que inédito, não levado muito em conta nos nossos livros-textos", esclareceu o economista, para quem os governos precisarão ir além das medidas monetárias para enfrentar a crise numa segunda fase, de retração na demanda.

"Essas medidas monetárias, por mais benéficas que sejam, taxas de juro zero nos Estados Unidos, coisa que eu nunca esperei ver, são apenas um primeiro passo. No sentido de que os governos precisam entrar agora gastando e gastando muito", frisou Trebat.

O economista defendeu no seminário virtual que o Brasil adote ações de reforço do sistema de saúde para fazer frente às necessidades geradas pelo combate ao coronavírus no país. Ele destacou ainda a importância de o governo federal apoiar financeiramente Estados e municípios neste momento de crise.

Um terceiro ponto ressaltado pelo economista como essencial é a concessão à população mais pobre de benefícios - seja por meio do Seguro Desemprego ou do programa Bolsa Família - que garantam alguma renda a esta camada da população.