Valor econômico, v.20, n.4967, 25/03/2020. Brasil, p. A6

 

Mandetta se queixa de 'travamento', mas alerta máximo será mantido

Fabio Murakawa

Rafael Bitencourt 

25/03/2020

 

 

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mantetta, disse ontem que o "travamento absoluto do país" é péssimo para o setor. Falando a jornalistas, ele defendeu uma discussão a respeito do "lockout" que vem sendo promovido por governadores e prefeitos para conter o alastramento do coronavírus.

Porém, o Valor apurou que entre técnicos do ministério predomina a avaliação de que é preciso manter o alerta máximo para a pandemia, dando continuidade às medidas de isolamento social que inclui a adoção de home office por empresas, pelo menos até chegar ao pico da pandemia, previsto para meados de abril.

"Esse travamento absoluto do país para a saúde é péssimo", disse Mandetta ao deixar o Palácio do Planalto, onde havia acompanhado o presidente Jair Bolsonaro em teleconferências com governadores do Sul e do Centro-Oeste. "Quando você para tudo é ruim para a saúde. Como faz para produzir o que precisa? Preciso ventilador, preciso de algodão, eu preciso de máscara, eu preciso de aeroporto aberto."

Mandetta comentou as medidas restritivas dizendo que "quando as pessoas tomam esse tipo de medida, têm que saber muito bem o que estão fazendo".

"Não é momento de apontar o dedo. É reconhecer rapidamente que algumas coisas funcionam rapidamente em determinado momento, como funcionam e como a gente pode adotar", disse.

Para Mandetta, "os governadores já estão vendo que em alguns casos aceleraram, passaram do ponto, não estavam com as normativas" de combate à doença.

Técnicos da Saúde dizem que não é possível prever qual será a situação do país para além dos próximos 20 dias. Enquanto isso, fica mantida a recomendação de evitar ao máximo a interação social entre as pessoas sem comprometer serviços essenciais.

A própria medida provisória (MP), editada por Bolsonaro no último domingo, sugere que a estratégia do governo para manter os trabalhadores dentro de casa e barrar a transmissão do vírus pode durar mais tempo. Um dos artigos da MP 927/20, revogado posteriormente, propunha a suspensão do contrato de trabalho, sem direito a salário, por até quatro meses.

No último fim de semana, Mandetta alertou que, em abril, o sistema de saúde brasileiro entrará em colapso. Isso porque os hospitais do país não darão conta de absorver a quantidade de pacientes infectados com a covid-19 em estado grave, que vão demandar leitos de tratamento intensivo (CTIs). Será a primeira fase de estresse enfrentada pelo sistema de saúde brasileiro com o coronavírus.

Até lá, a pasta espera já conseguir avaliar com clareza o comportamento da doença em diferentes faixas etárias da população brasileira. Então, parte da força de trabalho poderia reassumir o posto fora de casa, mas não há qualquer decisão tomada nesse sentido.

A tentativa da equipe do ministério de identificar o momento em que o país começará a liberar sua força de trabalho se soma ao esforço para conter as iniciativas de Estados e municípios de impor grande restrições às economia. Por enquanto, os técnicos acreditam que é preciso encontrar o equilíbrio entre as decisões para conter o avanço da pandemia e a manutenção do funcionamento de setores estratégicos.

Há a preocupação de que as restrições mais duras e prolongadas possam limitar o acesso da população a fontes de renda, em especial pelas famílias mais pobres. Eles entendem que, sem mensurar os efeitos de tais iniciativas, suas consequências poderão ser piores do que o dano causado pela doença em si.