O Estado de São Paulo, n.46182, 27/03/2020. Política, p.A12

 

Moraes veta item de MP que restringe Lei de Acesso

Pepita Ortega

Fausto Macedo

Paulo Roberto Netto

27/03/2020

 

 

Dispositivo suspendia os prazos para que a administração pública atendesse a pedidos de informações durante pandemia da covid-19

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, suspendeu ontem item da medida provisória que impõe restrições à Lei de Acesso à Informação durante a pandemia do coronavírus. O trecho derrubava o prazo para que a administração pública atendesse a solicitações feitas via Lei de Acesso, que determina o máximo de 30 dias para respostas a demandas de qualquer cidadão. Para Moraes, o artigo “pretende transformar a exceção – o sigilo de informações – em regra, afastando a plena incidência dos princípios da publicidade e da transparência”.

A decisão do ministro do Supremo atendeu a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que alegou “cerceamento aos direitos constitucionais à informação”. Rede e PSB também questionaram o texto na Corte. Houve ainda reação de entidades de jornalismo, como a Associação Nacional de Jornais (ANJ), e de transparência à MP do presidente Jair Bolsonaro, que foi publicada na segunda-feira à noite em edição extra do Diário Oficial da União.

Além da suspensão do prazo de resposta, o trecho vetado por Moraes previa a necessidade de reiterar o pedido após o fim do estado de calamidade decretado por causa do coronavírus e indicava que recursos apresentados contra negativas às solicitações seriam rejeitados.

“A publicidade específica de determinada informação somente poderá ser excepcionada quando o interesse público assim determinar. Portanto, salvo situações excepcionais, a administração pública tem o dever de absoluta transparência na condução dos negócios públicos”, afirmou o ministro. Ainda segundo Moraes, o item inverte “a finalidade da proteção constitucional ao livre acesso de informações a toda sociedade”.

Pela MP, estariam livres de cumprir os prazos para respostas todos os órgãos que tiverem seus servidores submetidos a regime de quarentena, teletrabalho ou que dependam de acesso presencial para poder responder ao pedido de informação. De acordo com o texto, todo pedido negado sob a justificativa de que o funcionário está em isolamento em função da pandemia ou em home office não teria possibilidade de recurso.

Moraes diz ainda na decisão que “a participação política dos cidadãos em uma democracia representativa somente se fortalece em um ambiente de total visibilidade e possibilidade de exposição crítica das diversas opiniões sobre as políticas públicas adotadas pelos governantes”.

“A Constituição consagrou expressamente o princípio da publicidade como um dos vetores imprescindíveis à administração pública, conferindo-lhe absoluta prioridade na gestão administrativa. À consagração constitucional de publicidade e transparência corresponde a obrigatoriedade do Estado em fornecer as informações solicitadas, sob pena de responsabilização política, civil e criminal, salvo nas hipóteses constitucionais de sigilo”, escreveu o ministro do Supremo.

A justificativa do governo para adotar a medida é concentrar esforços no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Ao Estado, o ministro da Contralodoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, afirmou que a intenção da medida provisória é “resguardar” os servidores e que vai divulgar voluntariamente todos os gastos emergenciais do governo.

“Quando você pede informação para um hospital lá na ponta, não tem equipe da Lei de Acesso à Informação para responder. É o pessoal que está atendendo. Então criamos essa suspensão para que possam ser respondidos assim que acabar esse período de emergência”, disse o ministro.

A suspensão valeria até o fim do estado de calamidade pública, decretado no último dia 20, com prazo para vigorar até o fim do ano.

Transparência’

“A publicidade específica de determinada informação somente poderá ser excepcionada quando o interesse público assim determinar. Portanto, salvo situações excepcionais, a administração pública tem o dever de absoluta transparência na condução dos negócios públicos.”

Alexandre de Moraes
MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL