Correio braziliense, n. 20780 , 14/04/2020. Cidades, p.17

 

Tensão na linha de frente

Alexandre de Paula

Jéssica Eufrásio

14/04/2020

 

 

CORONAVÍRUS » Dados da Secretaria de Saúde do DF indicam que 10 profissionais da área tiveram diagnóstico confirmado de Covid-19. Além deles, há 700 servidores afastados. Pasta afirma que possui equipamentos de segurança suficientes e destaca medidas de proteção

Na linha de frente no combate ao novo coronavírus, profissionais da saúde se expõem diariamente ao risco de contrair a Covid-19. De acordo com a Secretaria de Saúde do Distrito Federal, 10 servidores da área tiveram diagnóstico confirmado para a doença. Além deles, cerca de 700 profissionais estão afastados do trabalho por terem tido contato com pacientes e pessoas com suspeita de infecção ou por apresentarem sintomas de gripe.

A pasta informou que toma diversas medidas para garantir a segurança dos servidores, seguindo protocolos de segurança e oferecendo quantidade suficiente de equipamentos de proteção individual (EPIs). “Não há falta de EPIs. A distribuição foi modificada para que, neste momento, não haja desperdício nas unidades (de saúde), para que o uso deles seja o mais consciente possível e para que não faltem a nenhum profissional”, afirmou o órgão em nota oficial.

Expostos aos riscos da Covid-19, os servidores daSaúde que buscarem auxílio psicológico para lidar com a rotina exaustiva e a pressão do cenário atua podem receber apoio em diversos serviços da pasta. “As equipes devem ser capazes de identificar casos em que os sintomas de depressão ou ansiedade apresentem impacto mais intenso no funcionamento geral da pessoa. Esses casos precisam de intervenções precoces e específicas, por profissionais médicos e psicólogos, com atuação em rede, conforme os fluxos e normativas de atendimento da rede”, frisou a secretaria.

Ontem, o DF chegou a 641 casos confirmados de infecção pelo novo coronavírus. Desse total, 299 pessoas se recuperaram. Ainda assim, desde o primeiro registro — confirmado em 5 de março —, a capital federal soma 15 mortes. O balanço divulgado pela Secretaria de Saúde às 18h16 mostrou que havia 54 pacientes internados em hospitais. Dezoito estão em estado grave.

A primeira pessoa a testar positivo para a doença no DF, uma advogada de 52 anos, continua internada na unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Regional da Asa Norte (Hran). O marido dela, um advogado de 45 anos, foi liberado ontem do cumprimento de isolamento domiciliar obrigatório. Ele também havia sido diagnosticado com a Covid-19 e, por determinação da Justiça, teve de permanecer em casa por ao menos 14 dias ou até que apresentasse novo exame descartando a presença do coronavírus no organismo. Após teste e contraprova negativos, o réu foi dispensado da quarentena judicial, mas deverá seguir as recomendações do Executivo local, as mesmas que valem para toda a população do DF.

Com ao menos 20 policiais penais e 23 detentos infectados pelo novo coronavírus, o Complexo Penitenciário da Papuda também enfrenta situação delicada. Ontem, pela segunda vez, familiares dos presos se reuniram em frente à Vara de Execuções Penais (VEP) do DF para cobrar medidas de precaução contra o avanço da Covid-19 nas unidades prisionais. Além disso, eles pediram a liberação dos detentos que têm direito à progressão para o regime semiaberto, e a permissão da entrada de dinheiro, itens de higiene pessoal e frutas nas penitenciárias.

Desinfecção

O Centro de Detenção Provisória (CDP) da Papuda foi higienizado ontem por agentes da Diretoria de Vigilância Ambiental em Saúde (Dival). A próxima unidade a passar por limpeza será o Centro de Internamento de Reeducação (CIR). Hoje, militares do Exército Brasileiro fazem a desinfecção do Aeroporto Internacional de Brasília e das estações de metrô, onde os trabalhos começaram à 0h30.

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Liberação no comércio

14/04/2020

 

 

Na noite de quinta-feira, o governador Ibaneis Rocha (MDB) publicou decreto que autoriza o funcionamento de estabelecimentos do setor de móveis e eletrodomésticos. Ontem, lojas do segmento abriram as portas para receber clientes, retomando o atendimento e as vendas. Segundo o Governo do Distrito Federal (GDF), a decisão levou em conta análises sobre a disseminação do novo coronavírus no DF e deve reaquecer o setor. Shoppings, apesar de abrigarem muitos comércios do tipo, permanecem fechados.

Em Taguatinga, região que concentra diversos estabelecimentos do ramo, o movimento, ontem, era tímido. A circulação mais intensa ocorria em ruas próximas a agências bancárias, também liberadas para atendimento ao público pelo Executivo local. Morador do Recanto das Emas, o militar Felix Nascimento, 21 anos, e a noiva dele, a manicure Beatriz Santos, 21, foram a Taguatinga comprar móveis para a nova casa, onde vão morar depois de se casarem.

Ele conta que aguardava a abertura das lojas havia algum tempo e que apoia a flexibilização das medidas de contenção. “Muita gente depende disso tanto para comprar quanto para trabalhar. Muita gente vem perdendo o emprego. Acho importante abrir aos poucos. Vai ser importante para a economia”, defende Felix.

Riscos

O GDF estuda a liberação das atividades em outras áreas do comércio, no entanto não há definição de qual setor será contemplado em novos decretos nem da data para abertura. A avaliação, segundo o Palácio do Buriti, terá base no cenário da capital federal. Entre as variáveis estudadas estão o horário de funcionamento e a quantidade de pessoas impactadas. Presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Distrito Federal (Fecomércio-DF), Francisco Maia adianta que o setor produtivo encaminhará, dentro dos próximos cinco dias, um estudo com planejamento de reabertura do comércio. O assunto foi debatido ontem em reunião com o secretário de Economia, André Clemente.

“O setor produtivo propôs, e o governo topou receber esse plano. Entrar em uma guerra é fácil, mas sair dela é muito difícil. Vamos apresentar um modelo de como devem ser abertas (as lojas), considerando todas as questões de segurança, e tratar de setores que podem voltar a funcionar, desde que seguidas algumas normas”, detalha Francisco. “O que existe hoje é a indefinição, ninguém sabe como será o próximo mês. E nenhuma empresa aguenta mais 30 dias de portas fechadas”, acrescenta.

Para o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL-DF), José Carlos Magalhães Pinto, a decisão do Buriti foi bem planejada, pois os funcionários do segmento têm trabalhado em ambientes sem aglomeração e com equipes menores. “(Móveis e eletrodomésticos) são setores que correspondem a um ou dois por cento da força trabalhadora, e não vão ter grande influência na expansão do vírus. Mas o que cobramos de todos é o cuidado, tanto (por parte) dos empresários quanto dos funcionários”, argumenta José Carlos.

Professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), Carlos Alberto Ramos considera a flexibilização das normas para estabelecimentos uma “questão de lobby”. Para o pesquisador, a escolha pelo ramo de eletrodomésticos e móveis não faz sentido e não tem “racionalidade econômica”. “Isso pode ter um custo econômico impressionante se você tiver a propagação da doença”, pondera. “Quando a curva de contágio está caindo, você pode começar a discutir a abertura de setores, mas nunca quando os casos ainda estão aumentando”, explica.

Favorável às medidas de auxílio financeiro para pessoas em situação de vulnerabilidade, trabalhadores informais, além da abertura de crédito para que empresas possam pagar as folhas de funcionários, Carlos Alberto não apoia a medida atual e acredita que ela pode abrir espaço para representantes de outros segmentos comerciais não essenciais pleitearem a mesma ressalva. “Seria possível cometer esse erro há quatro, cinco meses, mas não depois de vermos pelo que passaram Inglaterra, Estados Unidos, França. Não é um erro que pode levar a algo menor, é um erro que pode levar a uma catástrofe”, alerta.