Título: Chávez indica sucessor
Autor: Walker, Gabriela
Fonte: Correio Braziliense, 10/12/2012, Mundo, p. 12

Ao anunciar que passará por nova cirurgia contra o câncer, o presidente admite pela primeira vez que a doença pode impedi-lo de governar e pede apoio ao vice, Nicolás Maduro

O presidente venezuelano, Hugo Chávez, abalou a população de seu país ao anunciar que precisa se ausentar novamente para continuar o tratamento contra o câncer, diagnosticado no começo de 2011. Em um pronunciamento televisionado, o líder socialista pediu para que seus eleitores apoiem o vice-presidente e ministro das Relações Exteriores, Nicolás Maduro, dando, pela primeira vez, sinais de que a doença pode impedi-lo de governar. “Caso algo me impeça de continuar à frente da Presidência, Nicolás Maduro deverá concluir o período, como manda a Constituição. E na minha firme e plena opinião, nesse cenário, que obrigará a convocação de eleições presidenciais, vocês devem escolhê-lo como presidente”, afirmou.

No discurso, Chávez confirmou que uma nova intervenção cirúrgica — a terceira — é urgente e “absolutamente imprescindível”, uma vez que exames mostraram a evolução de células cancerígenas no mesmo local onde já tratou um tumor maligno. Essa será a quarta vez que o mandatário se submeterá a uma operação para combater o câncer, cuja localização exata foi sempre mantida em segredo. Sabe-se apenas que o problema se manifestou na região pélvica. Chávez retornou a Caracas na última sexta-feira, após passar 10 dias em Havana, capital cubana, onde teria feito sessões de oxigenação hiperbárica, tratamento usado para aliviar transtornos causados pela radioterapia. A Assembleia Nacional venezuelana fez ontem uma sessão extraordinária e aprovou sua ida a Cuba.

Assim que Chávez terminou seu pronunciamento, na noite de sábado, o futuro da política venezuelana começou a ser debatido e dúvidas sobre a continuação da revolução bolivariana vieram à tona. “A curto prazo, eu diria que não se pode esperar nenhuma modificação importante. O chanceler Maduro é um homem de confiança de Chávez e, se ele for presidente, deve dar continuidade ao seu trabalho, mas com algum sinal de maior diálogo com a oposição”, avalia Tullo Vigevani, cientista político da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

A Constituição da Venezuela determina que, caso o presidente precise abrir mão de suas atividades, em caso de morte ou incapacidade comprovada, durante os dois últimos anos de mandato, cabe ao vice substituí-lo. Porém, se o presidente eleito não puder assumir o cargo — o novo mandato de Chávez começa em 10 de janeiro —, o vice assume temporariamente até que novas eleições democráticas, que devem ser realizadas em 30 dias, apontem um novo líder para o país.

De olho na nova oportunidade de tirar o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) do poder, a oposição afirmou estar pronta para disputar novas eleições. “A MUD será capaz de apresentar uma alternativa oportuna para todos os venezuelanos”, assegurou Ramón Guillermo Aveledo, secretário-geral da Mesa da Unidade Democrática (MUD), em entrevista à rede Globovisión. Rivais do líder socialista pedem mais transparência sobre a saúde de Chávez e suspeitam que ele estivesse ciente de sua fragilidade antes das eleições presidenciais de outubro deste ano. “Essa verdade por pedacinhos, por fascículos, ofusca e cria situações que não são desejáveis”, continuou Aveledo. Nas últimas eleições, o candidato Henrique Capriles conseguiu 44% dos votos, maior marca da oposição desde 1998, quando Chávez foi eleito pela primeira vez.

O carinho do povo Centenas de pessoas foram às ruas demonstrar apoio ao líder venezuelano em diversas cidades do país. Na Praça Bolívar, em Caracas, simpatizantes se reuniram para rezar e pedir forças para o presidente. Em Cuba, um pequeno grupo de venezuelanos fez uma marcha pela cidade de Havana, até a embaixada do país. “Chávez certamente tem uma grande liderança carismática, não só em relação ao povo, mas ele também tem uma capacidade de liderança em relação a setores importantes do aparelho do Estado como as Forças Armadas”, aponta Tullo Vigevani.

Na noite de ontem, as Forças Armadas declararam lealdade plena ao presidente por meio de um comunicado lido pelo ministro do Poder Popular para a Defesa, Diego Mollero Bellavia. “Estamos seguros de que sairá vitorioso desta luta, impregnado do amor de seu povo”, dizia o texto. De Barcelona, o presidente Evo Morales enviou uma mensagem ao colega. “Em nome do povo boliviano, queremos expressar nossa solidariedade, admiração, respeito e carinho ao irmão presidente”. As Forças Armadas Colombianas (Farc) também manifestaram votos pela recuperação e agradeceram a “contribuição para construção da paz na Colômbia”.

Linha do tempo / Veja os principais fatos da luta de Hugo Chávez contra o câncer: 2011

» 30 de junho — Em discurso à Venezuela, lido em Cuba, onde estava internado, Chávez admite ter sido operado, 20 dias antes, para retirar um câncer

» 4 de julho — O presidente surpreende a todos e regressa ao seu país na véspera do Dia da Independência

» 17 de julho — Volta a Cuba para dar início à quimioterapia

» 28 de julho — Chávez comemora seu aniversário de 57 anos e promete conquistar a reeleição em 2012 » 10 de agosto — Pesquisas registram o aumento de sua popularidade

» 14 de setembro — A autoridade eleitoral marca as eleições presidenciais para 7 de outubro de 2012. Chávez diz que concorrerá à reeleição

» 22 de setembro — O presidente termina o quarto e último ciclo de quimioterapia

» 20 de outubro — Após exames em Cuba, Chávez se declara livre do câncer e seus médicos dizem que ele está completamente curado

» 28 de outubro — Chávez volta às ruas para liderar a campanha pela reeleição » 20 de dezembro — Participa da cúpula do bloco econômico Mercosul no Uruguai, sua primeira viagem política desde o diagnóstico

2012

» 12 de fevereiro — O governador do estado de Miranda, Henrique Capriles, passa a ser candidato único da oposição para desafiar Chávez nas eleições de outubro

» 21 de fevereiro — Chávez anuncia que será operado novamente por uma lesão na mesma região em que teve câncer. É operado em Cuba uma semana depois

» 4 de março — O presidente diz que terá de se submeter a radioterapia » 16 de março — Chávez volta à Venezuela após a cirurgia

» 25 de março — Ele viaja mais uma vez à Havana para dar início à radioterapia

» 5 de abril — O presidente chora durante uma missa por sua saúde e pede a Deus: “Não me leve ainda”

» 14 de abril — Volta a Havana para ciclos de radioterapia e não comparece à Cúpula das Américas

» 2 de maio — Em uma decisão surpreendente, o governante estabelece um conselho assessor, num momento de debate nacional sobre a possível sucessão devido às suas frequentes ausências » 7 de maio — Chávez interrompe vários dias de silêncio e assegura que governa plenamente a Venezuela apesar do tratamento para o câncer que recebe em Cuba

» 9 de junho — Anuncia que saiu “absolutamente bem” dos exames médicos que realizou após um tratamento de radioterapia

» 9 de julho — Garante que está completamente livre do câncer. Quatro dias depois, volta às ruas em campanha

» 7 de outubro — Conquista a reeleição e o direito de governar até 2019 » 27 de novembro — A Assembleia Nacional autoriza a viagem de Chávez a Cuba para receber terapia hiperbárica, um tratamento complementar comum em pacientes que receberam radioterapia

» 7 de dezembro — Chávez retorna à Venezuela, acompanhado por seu vice-presidente, Nicolás Maduro, e duas de suas filhas

» 8 de dezembro — O presidente anuncia que voltará a Cuba para ser submetido a uma nova cirurgia devido ao retorno do câncer e designa Maduro como seu eventual sucessor se não for capaz de voltar ao poder