Valor econômico, v.20, n.4983, 17/04/2020. Brasil, p. A3

 

INSS tem fila de mais de 1,6 milhão de pedidos de benefício

Edna Simão 

17/04/2020

 

 

Um total de 1,629 milhão de pedidos de benefícios está na fila do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) aguardando análise, sendo que 1,072 milhão deles têm mais de 45 dias de atraso, segundo o balanço do órgão no dia 7 de abril. Em entrevista ao Valor, o presidente do INSS, Leonardo Rolim, reforça que espera zerar, no máximo até outubro, a fila dos que esperam mais de 45 dias por uma resposta do órgão.

Ele diz que a situação já foi bem pior. Em meados de 2019, o estoque de pedidos aguardando análise ultrapassou a casa dos 2 milhões, sendo que 1,3 milhão esperava por mais de 45 dias uma definição do INSS. A quantidade de requerimentos na fila de análise ainda é alto, mas Rolim acredita que daqui para frente, mesmo com as dificuldades impostas pela pandemia do coronavírus, a tendência é de que uma queda expressiva desses números. A tentativa de zerar a fila dos pedidos feitos com mais de 45 dias deve impulsionar as despesas previdenciárias neste ano.

Isso deve acontecer, na avaliação do presidente do INSS, ainda neste mês porque foi iniciada a concessão de benefícios de aposentadorias feitos após a promulgação da reforma da Previdência Social, em novembro do ano passado, e a contratação de temporários para análise dos processos. "O sistema ficou pronto no fim de semana", diz o presidente do INSS.

Rolim explica que, do estoque de 1,629 milhão de requerimentos existentes na fila hoje, 550 mil dependem apenas de envio de informação adicional da pessoa que solicitou o pedido para que o benefício seja liberado.

Nessas situações, o requerente precisa entregar as informações ao INSS no prazo de 30 dias. Como as informações devem ser entregues pela internet, esse prazo não deverá ser alterado por causa da pandemia. Apresentando esse dado, ele quis ressaltar que 1,124 milhão de requerimentos da fila dependem de análise do INSS.

Além disso, conforme Rolim, deve sair na próxima semana edital para contratação de temporários do INSS para reforçar a análise dos benefícios. A seleção para cargo de atendimento ficará para quando passar a pandemia do coronavírus. O plano inicial era contratar 8.220 servidores aposentados e militares da reserva, a um custo de R$ 160 milhões, para ajudar a reduzir a fila de processos pendentes de análise no órgão. Seriam contratados também servidores aposentados do INSS e médicos peritos, para serem remunerados conforme a produção, sem limite de vagas.

Com a pandemia do coronavírus, as agências do INSS têm trabalhado em regime de plantão apenas para tirar dúvidas e os serviços presenciais estão sendo tocados de forma virtual.

Os servidores estão em regime de teletrabalho e direcionando a atuação para análise dos pedidos de benefícios.

Neste momento de crise, o desafio é ter agilidade para liberar os pagamentos para ajudar a população neste período de crise. Até porque, pelo menos até o mês de março, a quantidade de pedidos por benefícios se manteve na média de cerca de 600 mil dos últimos três meses. "O sistema com ajustes começou a funcionar no último fim de semana. Vai haver um avanço nas liberações de benefícios pós-reforma devido a isso", disse Rolim.

Nesse aspecto, para acelerar as concessões, o governo anunciou recentemente a antecipação de R$ 600 para as pessoas que solicitaram o auxílio-doença. Nesse caso, não seria exigida a perícia do INSS, e sim a apresentação, por meio do site Meu INSS (meu.inss.gov.br), de um atestado médico. Mas, para que esse benefício seja permanente, ou seja, vá além dos três meses, será preciso que o beneficiado faça sua perícia. Até porque muitas pessoas podem ter um valor maior que esse para receber.

Somente do dia 10 a 14 de abril, 100 mil atestados foram entregues ao INSS para viabilizar a liberação do auxílio-doença. A partir disso, o INSS deve verificar apenas se os atestados estão em conformidade. "Abre o risco de fraude, mas essa foi a forma encontrada para não prejudicar as pessoas neste momento. Colocamos um robô que para verificar indícios de fraudes", diz ele.

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Teto de gasto deve ruir em 2022, indica LDO

Fabio Graner

17/04/2020

 

 

Colocado como principal âncora fiscal para 2021, o teto de gastos começará a ser fortemente testado a partir do ano que vem e pode ruir entre 2022 e 2023. É o que indicam as projeções do governo apresentadas no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

Os números mostram que as despesas discricionárias, aquelas que o governo pode dispor livremente, ficarão em R$ 103,1 bilhões em 2021, o valor mais baixo da série do Tesouro, que no ano passado ficou em R$ 131 bilhões. Para 2022, esses gastos irão para R$ 85,5 bilhões, chegando a R$ 68,9 bilhões em 2023, já com o novo governo. Mesmo incluindo-se uma reserva de R$ 19 bilhões para emendas parlamentares, que por ora estão como despesas obrigatórias, o quadro é de forte aperto.

Na primeira metade de 2019, quando a situação apontava despesa discricionária abaixo de R$ 100 bilhões, houve problemas de manutenção de serviços em algumas áreas. Analistas, inclusive dentro do governo, apontam que é possível conviver com valores na faixa indicada para 2021, ainda que com dificuldade. Mas quando já se aponta para algo entre R$ 60 bilhões e R$ 80 bilhões a situação é vista como insustentável.

"Sem nenhuma tentativa de conter as despesas obrigatórias, as discricionárias não aguentam chegar a R$ 60/70 bilhões", diz uma fonte do governo, apontando que sem medidas o "teto vai morrer" entre 2022 e 2023. Não são todas reformas que causam impacto no lado da despesa, mas algumas podem abrir espaço no Orçamento, como a administrativa e a PEC Emergencial, que permite redução de salários de servidores públicos.

O diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), Daniel Couri, disse ao Valor que o governo tem condições de manejar o teto de gastos em 2021 ainda, mas já deve ter sérias dificuldades. "Tem possibilidade de despesa obrigatória crescer mais do que o previsto, por causa do BPC, da possível continuidade da renda básica. No ano que vem já tem risco", comentou. "Para 2022 e 2023 o governo está na prática dizendo, com as regras atuais, que não tem jeito sem uma reforma grande para o restante dos gastos de forma que torne possível cumprir o teto", disse.

Segundo ele, há limitações para cortes de despesas e o que tem de possibilidade no radar pode não ser suficiente para compensar o aumento crescente nas obrigatórias. Ele cita como possíveis alvos de mudanças o abono salarial, a reforma administrativa e o BPC.

O ex-secretário de Política Econômica do ministério da Economia e pesquisador do Ibre, Manoel Pires, também não vê grande margem de manobra para o teto, mesmo com reformas. "O problema é que todo mundo sabe que teto não é factível, o governo está apostando em uma âncora que precisará ser revista", afirmou.

Ele lembrou que as despesas discricionárias da ordem de R$ 100 bilhões nunca foram tão baixas e podem ser ainda menores, dado o possível crescimento de gastos obrigatórios como seguro-desemprego e auxílio-doença.

Para o consultor de Orçamento do Senado Vinícius Amaral, o teto desde sua criação é insustentável, mas em algum momento a tensão em torno do risco de paralisia da máquina vai se tornar " insuportável". "Isso levará a uma mudança no teto ou à substituição por outra âncora fiscal. Por ser uma regra tão rígida, é difícil lidar com o teto. Em 2021, as despesas discricionárias já nascem com número pressionado por causa da elevação dos gastos decorrentes do coronavírus".

Além dos problemas do teto que está evidenciando, a LDO de 2021 já nasce sob alguma polêmica devido à nova regra para a meta de resultado primário. Há dúvidas se, ao tratá-la como mera conta, sem um objetivo que exija esforço de cumprimento, o governo não estaria descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

"Não vejo que a LDO tenha mandato para fazer definição de meta da forma como foi proposto. Não foi estabelecida uma meta, mas sim uma forma de acompanhamento do resultado primário", disse Amaral. "Ainda que em termos de arcabouço fiscal a regra estivesse redundante com o teto de gastos, a forma jurídica de dispor isso na LDO não parece adequada. A LRF deu competência de definir a meta, e não de esvaziar o sentido e o propósito de ter meta", afirmou.

O consultor apontou que certamente isso será foco de discussão no Congresso e pode ser a oportunidade, inclusive, de se buscar uma conciliação das regras fiscais existentes: teto de gastos, meta de primário e "regra de ouro".

Daniel Couri, da IFI, também mostra dúvidas sobre o desenho. Para ele, na prática a LDO traz uma interpretação da LRF e da Constituição, sem que seus dispositivos tenham sido alterados. "Se a receita cair, não vai contingenciar. O governo está reinterpretando e mudando a regra. Na prática ele está abandonando a meta de primário. Ela flutua sem uma banda", disse. "A LRF é clara: tem que ter meta. É uma nova interpretação."

Ele reconhece que tecnicamente a medida pode se justificar pela alta incerteza econômica, mas o governo teria outros instrumentos, como a calamidade pública. "Precisa ver se não vai gerar questionamento jurídico. O artigo 9º da LRF diz que, se a receita verificada não comportar cumprimento da meta, tem que fazer contingenciamento. Pode ter questionamento por aí. Uma meta muito fluida claramente não era intenção da LRF", disse.

Manoel Pires, por sua vez, lembra que em 2014, o governo permitiu abater todas desonerações da meta, transformando o objetivo em uma banda bastante ampla. "Mesmo nessa situação tinha piso. Agora não tem piso, é zero. Para ir em situação extrema, que não vai acontecer, se o governo quiser pode desonerar o país inteiro", disse. "Mensagem de que não vai ter meta é ruim."

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Ajuda emergencial pode ir além de R$ 98 bi, diz Onyx

Lu Aiko Otta

Matheus Schuch

17/04/2020

 

 

O governo poderá elevar para além dos atuais R$ 98 bilhões o volume de recursos destinados ao pagamento do auxílio emergencial, disse ontem o ministro da Cidadania, Onyx Lorenzoni.

"Vamos atender a todos os brasileiros que estiverem elegíveis nas regras aprovadas pelo Congresso", afirmou. "O presidente Bolsonaro não vai deixar ninguém para trás." O comando é seguido também pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, acrescentou.

O total de despesas poderá ser elevado, por exemplo, se o Congresso aprovar o Projeto de Lei 873, que amplia o acesso de informais à ajuda emergencial e eleva a conta em R$ 10 bilhões, segundo cálculos da área econômica.

"Este é o maior movimento de política social que se tem notícia", afirmou o presidente da Caixa, Pedro Guimarães. Ontem, o banco bateu um recorde, ao creditar pagamentos a 4,1 milhões de brasileiros. Hoje, haverá nova marca: 7,5 milhões de pessoas. Nesta semana, perto de 22 milhões de pessoas receberão o auxílio.

De acordo com balanço parcial divulgado ontem, pelo menos 45,2 milhões de pessoas foram considerados elegíveis e poderão ter acesso ao benefício emergencial de R$ 600. O total estimado de pagamentos chega a R$ 22 bilhões.

No entanto, o número de pessoas socorridas pode ser maior, uma vez que muitos candidatos não conseguiram se cadastrar.

A Receita Federal regularizou pelo menos 12 milhões de registros no Cadastro da Pessoa Física (CPF) que tinham pendências com a Justiça Eleitoral. Com essa nova informação, os pedidos pendentes serão reprocessados, informou o presidente da Dataprev, Gustavo Canuto.

Nos últimos dias, formaram-se filas em frente aos escritórios da Receita, com pessoas tentando regularizar o CPF. Houve aglomeração também nas agências da Caixa. Guimarães admitiu que os sistemas estão lentos, devido à grande procura.

O aplicativo para cadastramento será atualizado para corrigir erros, informou Onyx. Por exemplo: será dada opção para pessoas órfãs não preencherem o nome da mãe. Atualmente, o dado é obrigatório.

O ministro, porém, criticou a decisão da Justiça que mandou liberar o pagamento mesmo para CPFs em condição irregular. "Vai virar uma usina de fraudes."

Segundo o secretário-executivo do Ministério da Cidadania, Antônio Barreto, o CPF regular é um filtro importante e que a medida está no limite das condições técnicas de segurança e agilidade.

Os dados mostram que, do dia 7 ao dia 10 de abril, 23 milhões de microempresários, autônomos e informais se inscreveram para receber o auxílio.

Porém, aplicados os filtros da lei que impedem, por exemplo, o acúmulo com outro benefício do governo ou o pagamento a pessoas que tiveram renda superior a R$ 28 mil em 2018, entre outros, foram detectados 16,4 milhões de candidatos elegíveis à ajuda. Desses, 9 milhões tiveram o benefício homologado e estão recebendo.

Os demais estão com seus pedidos em análise. Onyx explicou que, nesse grupo, estão por exemplo pedidos feitos por mulheres que se dizem chefes de família, mas não informaram o nome dos filhos. "Como ela fez, receberá R$ 600", disse. "Mas, se ela tem filhos, pode receber R$ 1.200."

Segundo Barreto, os 9 milhões de benefícios liberados nessa primeira etapa são aqueles requerentes que são famílias unipessoais e os que apresentaram o CPF uma única vez.

Para as pessoas inscritas no Cadastro Único (CadÚnico), beneficiárias ou não do Bolsa Família, o processo é mais simples. Os que foram considerados aptos já tiveram o auxílio autorizado e os pagamentos estão sendo processados.

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Para Mansueto, não há risco de descontrole da dívida 

Lu Aiko Otta

17/04/2020

 

 

O secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, disse que é difícil prever o desempenho da economia este ano. O PIB brasileiro pode cair 3%, 4%, 5% "ou até mais", disse. Tudo vai depender da duração do isolamento social.

Ele disse ficar assustado com projeções que apontam para uma queda de 8% na economia, devido a um período mais prolongado de isolamento. Não explicitou se a projeção se aplica ao Brasil ou à economia global. Os especialistas na área de saúde, mais do que economistas, são as fontes mais adequadas para essa avaliação, disse o secretário.

"Todo mundo tem de aceitar [a queda na economia], porque estamos em meio a uma crise muito séria", afirmou em entrevista à GloboNews. "O que temos de debater é como vamos sair desta crise."

Ele insistiu na agenda de reformas econômicas.

Ele disse que não há risco de descontrole do endividamento. "Não corremos esse risco", disse. "Neste ano, o ajuste não é prioritário." O foco, afirmou, é dar recursos para a saúde e proteger pessoas de baixa renda. "Vamos sair com buraco maior, e nós, como sociedade, temos de debater como a dívida será paga."

A PEC do Orçamento de Guerra, que o Senado aprovou em primeiro turno, dá condições para o aumento temporário das despesas, para enfrentar a pandemia da covid-19. "Não permite aumentar o gasto permanente", ressaltou.

O secretário negou que haja conflito com o Congresso em relação à ajuda a Estados e municípios. Há, sim, visões diferentes de como fazer. O governo, porém, não tem dúvidas que precisará ajudar governadores e prefeitos.

Ele apontou algumas diferenças. Por exemplo, o projeto da Câmara garante o seguro receita por seis meses, mas o governo prefere fazer por três meses e depois, se for o caso, reforçar. Além disso, defende que haja um mecanismo para direcionar mais recursos para locais mais afetados pela doença.

Quanto às privatizações, avaliou que a sociedade já travava um debate mais racional com relação à venda de estatais. "Todo país tem banco público, mas não precisamos de três, quatro, cinco", disse. Não se trata, segundo Mansueto, de ter preconceito com o fato de a instituição ser pública ou privada, e sim se ela presta um bom serviço.