O Estado de São Paulo, n.46188, 02/04/2020. Política, p.A6

 

Bolsonaro publica vídeo falso, apaga e pede desculpas

Jussara Soares

André Borges

Camila Turtelli

Paloma Cotes

02/04/2020

 

 

Gravação em que homem citava desabastecimento em Ceasa de Minas e criticava governadores foi desmentida por Tereza Cristina

Um dia após adotar discurso mais ameno em relação à pandemia do coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro publicou um vídeo falso, em que um homem apontava risco de desabastecimento no Brasil e criticava a postura de governadores. O conteúdo da gravação foi desmentido pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, por autoridades de Minas Gerais e por moradores de Contagem, onde a filmagem foi feita. Políticos reagiram, pedindo mais cautela ao presidente em suas publicações na internet. Por fim, Bolsonaro apagou o post e se desculpou.

“Quero me desculpar, não houve uma devida checagem do evento. Acontece”, disse o presidente em entrevista ao apresentador José Luiz Datena, da TV Band.

No vídeo, o homem mostrava a falta de produtos na Ceasa de Contagem e dizia que “a culpa é dos governadores”, que, segundo ele, querem “ganhar nome e projeção política a custa do sofrimento da população”. Acompanhado da gravação, compartilhada no Twitter, Facebook e Instagram, Bolsonaro escreveu: “Não é um desentendimento entre o presidente e alguns governadores e alguns prefeitos. São fatos e realidades que devem ser mostradas. Depois da destruição não interessa mostrar culpados”.

“Quem não tem dinheiro passa fome. Mas quem tem dinheiro, mas não tem o que comprar, também passa fome. E não vamos esquecer não, a culpa disso aqui é dos governadores, viu?”, afirma o protagonista do vídeo, mostrando imagens de um galpão quase vazio. “O presidente da República tá brigando incessantemente para que haja uma paralisação responsável. Não paralisar todos os setores, quem não é do grupo de risco voltar a trabalhar, ok?”

Limpeza. Logo após a postagem de Bolsonaro, usuários apontaram ser mentira que a Ceasa estava vazia e divulgaram vídeos que mostravam o local movimentado. A Secretaria de Agricultura de Minas informou que a gravação foi feita no momento em que o local passava por limpeza e, por isso, estava esvaziado. “A informação é inverídica. Não é permitida no momento da limpeza a permanência das caixas com os alimentos.” Em nota, a CeasaMinas disse que “não há qualquer desabastecimento em seus entrepostos em razão do coronavírus”.

Tereza Cristina compartilhou no WhatsApp vídeos e fotos que mostravam que a situação estava normal na Ceasa. Os destinatários foram integrantes da Frente Parlamentar da Agropecuária. Uma deputada do PSL pediu ajuda à ministra para convencer Bolsonaro a apagar o post. “Já pedi para Eduardo e Flávio (filhos do presidente), mas a senhora pode ajudar também.” Ao Estado, após a polêmica, a ministra afirmou que não há nenhuma hipótese de desabastecimento no Brasil.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que o presidente deve ter mais cuidado com o que publica. “Essas informações desencontradas podem gerar preocupação na sociedade.”

Governador de São Paulo, João Doria (PSDB) afirmou que ficou “feliz” ao vê-lo mais moderado na TV. “Mas amanheci preocupado, vendo o mesmo presidente fazer uma postagem agredindo os governadores. Em qual presidente devemos confiar?” / JUSSARA SOARES, ANDRÉ BORGES, CAMILA TURTELLI e PALOMA COTES

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“Quero me desculpar, não houve uma devida checagem do evento. Acontece.” 

Jair Bolsonaro
PRESIDENTE DA REPÚBLICA, APÓS APAGAR UM VÍDEO FALSO SOBRE DESABASTECIMENTO NA CEASA DE CONTAGEM, EM MINAS