O globo, n. 31663, 15/04/2020. Economia, p. 19

 

FMI vê economia global na pior crise desde a Grande Depressão

Paola de Orte

Pedro Capetti

15/04/2020

 

 

PIB mundial deve ter retração de 3% este ano. Brasil sofrerá queda de 5,3%, com desemprego ultrapassando os 14%

 A economia global deve sofrer este ano sua pior recessão desde a Grande Depressão, nos anos 1930. Essa éa avaliação do Fundo Monetário Internacional (FMI), que divulgou ontem o Panorama Econômico Mundial. O relatório, que tem por título O Grande Isolamento, prevê uma retração de 3% na economia global este ano, contra crescimento de 3,3% na projeção anterior, de janeiro, como consequência da pandemia do novo coronavírus. Para o Brasil, a estimativa é de retração de 5,3%.

— É muito provável que, neste ano, a economia global experimente a sua pior recessão desde a Grande Depressão,ultrapassando aquela observada durante acrise financeira de uma década atrás— afirmou a economista-chefe do FMI, Gita Gopinath, na apresentação do relatório.

A quedana atividade econômica atingirá tanto os países em desenvolvimento quanto as nações ricas, ressaltou o Fundo. O bloco das economias avançadas deve sofrer uma retração de 6,1%, e o das emergentes, de 1%. A Itália, fortemente atingida pela pandemia, deve ter queda de 9,1%.

Entre os emergentes, China e Índia devem manter seu crescimento, ainda que bem inferior ao previsto em janeiro, com 1,2% e 1,9%, respectivamente. As projeções anteriores giravam em torno de 6%. Já a economia da África do Sul deve encolher 5,8%.

Para Carlos Langoni, diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas (FGV), o cenário traçado pelo FMI é inédito ao prever retração tanto nas economias emergentes como nas mais avançadas:

— Tínhamos uma assimetria nas crises, as avançadas caíam, as emergentes suportavam a queda. Agora não. Entre os emergentes, o que segura o PIB são China e Índia, mas 1% de crescimento para a China é recessão profunda.

A América Latina terá retração de 5,2%. A maior queda será da Venezuela, com 15%, enquanto o México verá sua economia encolher 6,6%.

‘CHOQUES MÚLTIPLOS’

A contração de 5,3% prevista para o Brasil está no patamar estimado pelo Banco Mundial no último domingo, de 5%. Já o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse na semana passada que já trabalha com queda de 4% do PIB se a pandemia se prolongar após julho.

Para 2021, o Fundo vê o Brasil crescendo 2,9% — abaixo dos 3,4% da América Latina.

Com relação ao Produto Interno Bruto (PIB) estimativa é de queda de 5,9% em 2020, com crescimento de 2,2% no ano que vem.

— O Brasil foi atingido por choques múltiplos. Ele foi atingido pelo colapso nos preços das .Foi atingido por um crescimento global mais lento. E claro, a epidemia — disse Gita, ressaltando a necessidade de não abandonara agenda de reformas. — Elas são importantes em uma perspectiva de médio prazo, mas, neste momento, claro, aprioridade, co moem todos os países, é lidar coma pandemia.

O FMI também fez projeções para o desemprego. A previsão é que, no Brasil, a taxa fique em 14,7% este ano, recuando a 13,5% em 2021. O indicador encerrou o ano passado em 11,9%.

Cosme Donato, economista da LCA Consultores, projeta um desemprego de 13% em dezembro, voltando ao patamar anterior à pandemia somente em meados de 2021. Para ele, o maior problema é a queda na renda do trabalho:

—Não sabemos por quanto tempo a demanda vai ficar baixa. Você não contrata, espera um horizonte bem delineado. É uma tempestade perfeita no mercado de trabalho.

Para o professor do Instituto de Economia da UFRJ Luiz Carlos Prado, as projeções do Fundo para o desempenho da economia global no ano que vem são otimistas:

— Eles (FMI) estão projetando uma recuperação em “V”, mas isso não está claro. Não está claro se as pessoas vão voltara consumir da mesma forma, depende de uma série de fatores. É possível que a projeção seja moderadamente otimista.

O FMI tomou por base um cenário em que a pandemia acaba no segundo semestre. Mas também fez projeções para a hipótese de se levar mais tempo para controlara doença, comum a segunda onda em 2021. O PIB global, então, cairia até 8% no ano que vem.

Na apresentação do relatório, Gita afirmou que medidas como quarentena e distanciamento social são cruciais para diminuir a propagação do vírus e evitar uma queda ainda maior da atividade econômica. E defendeu que os governos adotem ações fiscais, monetárias e financeiras para dar apoio a famílias e empresas.

Segundo Prado, o Brasil tem gastado pouco para mitigar os efeitos da crise. Levantamento do pesquisador Manoel Pires, do Ibre/FGV, aponta que as medidas já anunciadas equivalem a 7,8% do PIB.

—Nessas horas não faz sentido estar preocupado com equilíbrio orçamentário, o necessário é diminuir o tamanho do buraco. Dependendo da política econômica que fizer, o Brasil pagará mais caro para recuperar (a economia) —disse Prado.

O FMI disse ainda que o comércio global vai encolher 11% este ano devido à pandemia. Ontem a China informou que suas exportações caíram 6,6% em março, abaixo dos 14% esperados por analistas. Com isso, o Ibovespa teve alta de 1,37%.

Já o dólar comercial encerrou com valorização de 0,16%, a R$ 5,188, refletindo as projeções do FMI. (Colaboraram Gabriel Martins e João Sorima Neto)