Correio braziliense, n. 20790 , 24/04/2020. Brasil, p.5

 

País bate recorde com mais de 400 mortes

Maria Eduarda Cardim

Bruna Lima

24/04/2020

 

 

O Brasil bateu novo recorde de morte pelo novo coronavírus e não há previsão para que os números comecem a diminuir. Em 24 horas, mais 407 pessoas entraram para o balanço de óbitos pela doença no país, chegando a 3.313. O incremento foi de 14%, maior índice desde a troca de ministros da Saúde. O novo chefe da pasta, Nelson Teich, não soube precisar o motivo da drástica variação, mas levantou a hipótese do aumento representar um esforço para zerar a fila de amostras que aguardam diagnósticos. Segundo o Ministério da Saúde, 112 dos 407 óbitos anunciados ontem ocorreram nos últimos três dias; o restante, antes desse período. Outros 1.269 óbitos aguardam investigação laboratorial.

“Tivemos um aumento nos óbitos que foi acima do que vinha acontecendo anteriormente. A gente não sabe se isso representa um esforço de fechar o diagnóstico ou se vai representar uma tendência de aumento”, comentou Teich. No entanto, para ter mais respaldo, o ministro disse que seria necessário acompanhar a evolução dos números nos próximos balanços. “Se for uma linha de aumento, os números dos próximos dias vão aumentar cada vez mais e a gente vai saber que isso não é um esforço pontual, mas uma tendência”, explicou.

Mais cedo, o governo de São Paulo, onde foram registradas 211 das 407 novas mortes, afirmou que o aumento se devia à confirmação de casos que aguardavam a análise. O estado continua liderando as estatísticas, somando 1.345 óbitos e 16.740 casos confirmados da doença, distribuídos em 256 municípios. O número de internações na unidade federativa também disparou. São 7 mil pacientes, entre suspeitos e confirmados, nos hospitais paulistas – 2.807 internados em UTI e 4.196 em enfermaria. A taxa de ocupação dos leitos para atendimentos Covid em UTI no estado está em 55,3%. Na Grande São Paulo, a taxa está em 74%.

Outros quatro estados têm mais que 200 fatalidades cada. São eles: Rio de Janeiro (530), Pernambuco (312), Ceará (266) e Amazonas (234). Já o Tocantins, último a registrar óbitos pela doença, confirmou, ontem, a segunda morte.

De acordo com levantamentos do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Icict/Fiocruz), as mortes provocadas por Covid-19 no Brasil têm dobrado, em média, num intervalo de cinco dias. Nos Estados Unidos e no Equador, países com elevada disseminação da doença, o intervalo para essa duplicação, ao avaliar um período similar da propagação, seria de seis dias. Na Itália e na Espanha, oito.

Para se chegar a esse resultado, os pesquisadores analisaram o crescimento diário dos casos de coronavírus nas últimas três semanas. Apesar de destacarem uma situação preocupante, principalmente em regiões do Norte e Nordeste, observaram uma aparente tendência à desaceleração do crescimento de casos em algumas unidades federativas. Esse decréscimo, segundo a análise, tem relação com as medidas de isolamento social, “dado que a comparação com outros países torna evidente comportamento similar em várias partes do mundo”.

Quarentena

O ministro da Saúde, Nelson Teich, abordou novamente o distanciamento social ao ser questionado se era a favor da medida não farmacológica. “A gente defende o que é melhor para sociedade. Se o melhor para sociedade for o isolamento, é o que vai ser. Se eu puder flexibilizar, dando autonomia para as pessoas e uma vida melhor, e isso não for influenciar na doença, é o que eu vou fazer”, respondeu. No dia anterior, durante a primeira coletiva ao lado dos outros ministros, Teich defendeu a construção de uma diretriz para que estados e cidades possam retornar do isolamento.

O Ministério da Saúde divulgou, também, o número de pacientes recuperados da Covid-19. De acordo com a pasta, 26.573 dos 49.492 pacientes diagnosticados estão curados. Isso representa 54% das pessoas que tiveram um diagnóstico comprovado. Outras 19.606 continuam em acompanhamento.

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Retomada das atividades

Maíra Nunes

Fernanda Strickland*

Jailson R. Sena*

Marisa Wanzeller*

24/04/2020

 

 

Shoppings, lojas de departamentos, restaurantes, barbearias... Há cronograma de reabertura do comércio em vários estados. Em outros, a economia já voltou a girar. Confira quem flexibilizou as regras de isolamento e o que isso pode acarretar para a economia

Enquanto alguns estados brasileiros engrossam o isolamento social para contenção do novo coronavírus, outros flexibilizam a quarentena e anunciam a retomada das atividades com intuito de aquecer a economia. O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, reuniu-se, ontem, com os secretários de Saúde, Edmar Santos, e de Desenvolvimento Econômico, Energia e Relações Internacionais, Lucas Tristão, para discutir um plano de reabertura progressiva da economia no estado. No entanto, no dia em que o país registrou o recorde de mortes pela Covid-19, o mandatário fluminense afirmou que a atividade econômica só vai ser retomada após a inauguração dos hospitais de campanha e os índices da Saúde melhorarem. Já no Distrito Federal, alguns setores já funcionam e outros estão com data marcada para retornarem em maio, segundo o governador Ibaneis Rocha.

Segundo o governo do Rio, o Plano Estadual de Reabertura Planejada da economia será baseado em três eixos: definição prévia do ritmo de abertura; orientações de comportamento; e protocolos de operação para administradores, empresários e trabalhadores. Será feito um mapeamento de risco das atividades e das regiões do estado. “No estado do Rio de Janeiro, a curva de contaminação ainda é alta, apesar de estar sob controle. E é exatamente por estar sob controle que nós estamos muito preocupados com qualquer reabertura da atividade econômica”, comentou o governador.

Santa Catarina é um dos estados que retoma as atividades comerciais. Clientes voltaram a frequentar o shopping center Neumarkt, em Blumenau, que após mais de um mês fechado por causa dos decretos de isolamento, provocou aglomeração de pessoas na reabertura esta semana. A Justiça do estado estabeleceu, ontem, multa de R$ 500 mil por dia caso a administração do centro de compras não siga as normas de distanciamento social estabelecidas em portaria do Governo do estado para reabertura do setor. A decisão foi resultado de uma ação civil pública movida pela Defensoria Pública de Santa Catarina, após a ampla divulgação de vídeos que mostra aglomeração de pessoas na abertura do centro comercial, assim como apresentação de show musical.

Segundo o despacho do juiz Frederico Andrade Siegel, a abertura do shopping está condicionada à comprovação de distância de 1,5 metro entre as pessoas, de que a lotação do local não esteja acima de 50% da capacidade e da proibição de shows. O estabelecimento alegou cumprir “rigorosamente todas as orientações”.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema, afirmou que a retomada das atividades empresariais em território mineiro, que vem sendo planejada por seu governo, levará em consideração questões como a geração de renda e a intensidade de uso de mão de obra ou de circulação de pessoas nas instalações. Ele evitou dar um prazo para a esperada completa retomada das atividades no estado, mas sinalizou que as atividades que empregam a maioria das pessoas e que geram a maior parte da riqueza do estado devem ser retomadas mais rapidamente.

Efeitos negativos

Para Joelson Sampaio, coordenador do curso de economia da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, os efeitos na economia, mesmo com a retomada, serão negativos nos próximos meses. “Isso terá um efeito não só na oferta como na demanda, em médio e curto prazo. No caso da demanda, ela pode ser menor, o que trará um efeito negativo na parte financeira da empresa”, destacou.

Com a conectividade gerada neste tempo de pandemia, delivery e home office devem permanecer na rotina das pessoas, o que pode afetar outros setores que antes eram habituais. “Tudo isso pode afetar a economia e a forma como as pessoas circulam. Por exemplo, reuniões em diferentes locais que precisam pegar um avião, tendem a optar, daqui em diante, pela tecnologia. Isso pode causar um impacto no setor aéreo”, observou o coordenador.

Economista da PUC Rio, Luiz Roberto Cunha disse que, apesar de a quarentena ser uma medida “dramática”, do ponto de vista econômico, ela só poderia ser flexibilizada se o país tivesse capacidade para realizar testes em massa para identificar os infectados assintomáticos. “Eu acho que o Brasil não tem estrutura e nem condições para fazer uma saída (do isolamento social) organizada. Então, a saída vai ser desorganizada mesmo”, pontuou.

O empresário e presidente da Associação de Empresas do Mercado Imobiliário do Distrito Federal (Ademi), Eduardo Aroeira, destaca que a reabertura do comércio vai impulsionar as vendas no segmento da construção civil, de escritórios imobiliários e de arquitetura. “Os desafios, porém, serão os que temos desde março. Temos que ter um cuidado muito grande com a saúde dos funcionários e dos clientes.”

*Estagiários sob a supervisão de Andreia Castro