O globo, n. 31661, 13/04/2020. Especial Coronavírus, p. 4

 

País ‘não sabe se escuta o ministro ou o presidente’

Ana Letícia Leão

13/04/2020

 

 

Ao Fantástico, Mandetta cobra ‘fala unificada’ e critica ‘dubiedade’ para orientar a população sobre medidas contra o vírus

O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou, em entrevista exclusiva ao Fantástico, da TV Globo, que espera unidade no combate ao coronavírus. Na semana em que chegou alimpar as gavetas e quase deixar o cargo por divergências como presidente Jair Bolsonaro, o ministro disse que a divisão de estratégias no combate ao vírus gera “dubiedade”.

— Não há ninguém contra nem a favor de nada. O nosso inimigo é o coronavírus—afirmou Mandetta

.—O presidente olha pelo lado da economia. O Ministério da Saúde entende a economia, entende acultura e a educação, mas chama pelo lado de equilíbrio de proteção à vida. Eu espero que essa validação dos diferentes modelos de enfrentamento possa ser comum e termos uma fala única, unificada. Porque isso leva para o brasileiro uma dubiedade: ele (o brasileiro) não sabe se escuta o ministro ou o presidente. No domingo, dia em que o Brasil chegou à marca de 1.223 mortes por coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro disse, em videoconferência com líderes religiosos, que o vírus está “indo embora”:

— Temos dois problemas pela frente, lá atrás eu dizia: o vírus e o desemprego. Quarenta dias depois, parece que está começando a ir embora a questão do vírus, mas está chegando e batendo forte o desemprego. Devemos lutar contra essas duas coisas.

A declaração foi feita horas antes da entrevista de Mandetta,n as emana em queBol sonar o estimulou o desrespeito às medidas de isolamento, circulando em Brasília por farmácia, padaria e cumprimentando apoiadores nas ruas.

Mandetta passou o domingo no Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás e residência do governador, Ronaldo Caiado, que rompeu politicamente com Bolsonaro por divergências sobre como enfrentar acrise. O ministro avaliou que o pico da doença deve ser em maio e junho: —Agente imagina que maio e junho serão os 60 dias mais duros para as cidades.

Perguntado sobre o que seriam “dias mais duros”, o ministrou respondeu:

— Dias em que nós seremos... “olha, vocês não fizeram o que tinham de fazer, por isso está entrando em colapso”. Sempre vão haver os engenheiros de obra pronta. Depois que você faz o possível e o impossível para enfrentar ,“ah, não deveria ter sido assim”.

O ministro atribuiu o afrouxamento do isolamento em parte a fake news como a que diz iaque apandem iaera“uma invenção de países para ter vantagem econômica”, e citou pessoas que veem “um complô mundial contra elas”.

Mandetta confirmou a subnotificação de casos no país e ressaltou a importância do isolamento social.

—Se não fizermos nada, se a gente falar vamos todos trabalhar, deixar só quem tem mais de 60 ano sem casa, como o país vai lidar com isso ?— disse. — O problema é que não tem teste suficiente para o planeta.

Mandetta fez críticas a filas em padarias e mercados:

— As pessoas entrando em padaria, entrando em supermercado, com filas uma atrás da outra, encostadas, isso claramente é um equívoco.