O Estado de São Paulo, n.46200, 14/04/2020. Metrópole, p.A13

 

Testes diagnósticos reais?

Sérgio Cimerman

14/04/2020

 

 

Em meio à pandemia da covid19 iniciamos agora a corrida desesperada e frenética pelos testes diagnósticos. A população, de modo errôneo e por falta de informação, também quer saber – muitas vezes por curiosidade – se já foi exposta ao coronavírus ou não.

Creio ser importante primeiro abordar a definição do que é um teste diagnóstico. Trata-se de uma ferramenta utilizada para se verificar a ocorrência ou não de determinada doença, quando se avalia a sensibilidade e especificidade do nosso invisível ser.

O diagnóstico de certeza dá-se na experiência mundial com o exame do RT-PCR, técnica esta já utilizada desde a década de 1980, consistindo em detectar uma determinada sequência genética do vírus e replicar, valendo-se de um processo enzimático chamada enzima polimerase. Ele demora algo entre 24 e 48 horas, contando todo processo de logística, sendo coletado por swab nasal e de orofaringe, sendo este uma coleta feita com cotonete nas narinas e na faringe posterior. Estamos neste momento voltando a receber insumos que estavam esgotados em todas as partes e, por isso, há uma infinidade de exames parados, como por exemplo no Estado de São Paulo.

O RT-PCR realiza o diagnostico agudo (padrão ouro) da enfermidade com coleta entre o segundo e sétimo dia de sintomas com alta positividade. Após esse período, decai muito a sensibilidade e o diagnóstico pode ficar prejudicado com um falso negativo. Neste momento os testes sorológicos podem apresentar certa importância com a dosagem da imunoglobulina M (IgM), que pode ter seu ápice entre o sétimo e décimo dia, auxiliando em diagnóstico mais tardio. Em profissionais da área da saúde com suspeita de covid-19 para racionalizar o RT-PCR , que estejam apresentando sete dias de sintomas e pelo menos 72 horas assintomáticos, esta pode ser uma boa opção diagnóstica para reintegrar mais precocemente ao fronte de ataque em nossos hospitais.

Para termos uma ideia do momento que vivemos, testes foram aprovados pela Anvisa, em numero de 17, segundo dados de boletim divulgado em abril pela Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde (SCTIE). Esses testes não foram validados e conduta semelhante ocorreu nos Estados Unidos pelo Food and Drug Administration (FDA). A referência sobre sua eficácia é apenas a bula das próprias empresas fabricantes. De certa maneira é aceitável este canal emergencial de kits da covid-19 por causa da pandemia e pela urgência de apressarmos o diagnóstico para termos à disposição dados seguros e respeitados por nossas autoridades. Mas também podemos incorrer em muitos resultados falso negativos que podem mais prejudicar do que realmente auxiliar. Os testes apresentam excelente especificidade para covid19, porém, na vida real a sensibilidade fica muito aquém dos 85-90% espalhados pela bula dos kits. A vantagem possa se dar e, aqui com aplicabilidade das pessoas suspeitas de covid-19 que apresentaram sintomas leves após 15 a 20 dias fazerem o teste para verificarem a exposição ao vírus (imunoglobulina IgG), e consequentemente a imunidade, que até o presente momento não podemos inferir se será duradoura ou não. A indagação que temos e sem resposta seria entre os assintomáticos quando coletar. Não temos como falar um período preciso e, deste modo, seria um gasto desnecessário.

Assim, mesmo sem sabermos a resposta, a população mais abastada de nossa sociedade tem esgotado os exames na maioria dos laboratórios e hospitais privados na cidade de São Paulo. Estes centros de diagnósticos estão informando no laudo a questão de falso negativo de modo correto e assim não incorrem em informações inverídicas, devendo sempre a análise ser feita entre o médico solicitante e o paciente.

A vantagem destes testes é que nove deles são aprovados e são rápidos, não levando mais de 10 a 20 minutos e já deixam o paciente menos apreensivo ao saber o resultado. Estes testes são chamados de imunocromotográficos, que até podem ser realizados em locais não muito habituais. A Sociedade de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial, em nota técnica, comenta sobre a regulamentação da RDC número 302, de 13 de outubro de 2005, que exames devem ser feitos em ambiente especializado. Eu concordo, pois, o paciente precisa ter segurança e confiabilidade no laudo que será assinado por um profissional habilitado para tal.

Muito estamos a apreender com a covid-19 e cada dia nos chega uma informação nova; espero que possamos chegar a viver o melhor dos mundos com ampla testagem e com resultados confiáveis e sem gerar pânico. (#XOCOVID-19).

EX-PRESIDENTE DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE INFECTOLOGIA