O Estado de São Paulo, n.46201, 15/04/2020. Economia, p.B3

 

Governo oferece mais R$ 77,4 bi a Estados

Adriana Fernandes

15/04/2020

 

 

Medida tenta barrar avanço de projeto no Congresso, considerado ‘cheque em branco’

Desequilíbrio. Colnago (de máscara, à esq) diz que 80% dos recursos vão para 10 Estados

Para barrar o avanço do projeto emergencial de socorro aos Estados e municípios, a equipe econômica apresentou uma proposta alternativa com uma oferta de mais R$ 77,4 bilhões de recursos adicionais para governadores e prefeitos enfrentarem a covid-19. Parte dos recursos – R$ 40 bilhões – poderá ser transferidos diretamente por meio de uma Medida Provisória.

A MP tem vigência imediata mas precisa ser aprovada pelo Congresso para não perder a validade. Em entrevista no Palácio do Planalto, o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, acenou com uma proposta alternativa que junto ao que já foi oferecido em março soma R$ 127,3 bilhões. Na proposta, o governo federal suspende o pagamento de dívida com a União no valor de R$ 22,6 bilhões e de dívida com bancos federais no total de R$ 14,8 bilhões.

A equipe econômica marcou posição e avisou que, do jeito que o texto foi aprovado pelos deputados, o projeto representa um “cheque em branco” que o governo não vai assinar.

O impasse maior gira em torno da compensação das perdas do ICMS e do ISS por seis meses, prevista no projeto do relator Pedro Paulo (DEM-RJ). O projeto não traz um valor fixo, o que o governo não aceita. O temor é que governadores e prefeito concedam subsídios, suspensão de pagamento de dívidas e redução de impostos, que depois terão que ser compensados pelo governo federal, qualquer que seja o valor. O projeto abre brecha para isso, de acordo com análise dos técnicos.

A proposta do governo, por outro lado, muda a regra de distribuição dos recursos, que passaria a ser per capita. Ou seja, pela quantidade de habitantes. Já o projeto da Câmara distribuiu os recursos com a mesma regra que vale para os fundos de participação dos Estados (FPE) e municípios (FPM). O assessor especial de Relações Institucionais do Ministério da Economia, Esteves Colnago, afirmou que 80% dos recursos dos projeto da Câmara vão para apenas 10 Estados. Para o governo, a divisão per capita, como está na proposta do governo, evita distorções.

A equipe econômica apresentou números que mostram, num cenário mais grave, a necessidade transferência de até R$ 285 bilhões aos Estados e municípios O valor corresponde a uma perda de 100% da arrecadação dos dois tributos em relação à base de 2019. Uma perda de 50%, obrigará uma repasse de R$ 142,7 bilhões.

Seguradora universal. O procurador-geral da Fazenda Nacional, José Levi, disse que a proposta aprovada pela Câmara pode se transformar em uma “espécie de seguradora universal”.

“Não se pode pretender fazer agora uma nova Lei Kandir. E pior: uma lei Kandir invertida”, disse Levi, em referência à lei que estabeleceu em 1996 isenção fiscal para produtos de exportação.

Os números divulgados abriram uma nova crise com o Congresso e os aliados do presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ). “Mais uma vez a conta do governo é errada e desonesta”, disse o relator. Para ele, a conta esconde o que está por trás da MP, que é discriminar Estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste que estão com mais casos do novo coronavírus e mais problemas por causa do isolamento social.

Em defesa do projeto já aprovado, o secretário de Fazenda do Estado de São Paulo, Henrique Meirelles, entrou na briga e reagiu à crítica do governo federal de que a proposta foi feita para desgastar o presidente Jair Bolsonaro numa aliança entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o governador João Doria (PSDB). “Isso é bobagem! O que poderia afundar o governo Bolsonaro é uma mortandade, e os Estados não terem recursos para combater o coronavírus”, disse Meirelles.

Segundo Meirelles, nenhum governador é enlouquecido de manter a cidade fechada por mais tempo, em quarentena, só para receber mais uma prestação de compensação pela perda da queda do ICMS. Ele disse que vai defender que o Senado altere o texto para que, durante os seis meses da compensação, os Estados e municípios não possam conceder suspensão de pagamento de tributos, subsídio e redução de impostos. Essa é uma grande preocupação do governo.

Na mão

R$ 40 bi

dos recursos oferecidos pelo governo federal poderão ser transferidos diretamente por meio de uma medida provisória